Fim da escala 6x1 para o brasileiro transar mais e melhor
Atual situação do trabalho adoece as pessoas e destrói a libido
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A vida não é utilitária. Não precisamos estar aqui apenas para nascer, crescer, trabalhar, produzir, reproduzir, morrer. Se engana quem pensa que sempre foi assim e que nossos ancestrais tribais viviam um cotidiano de pobreza e desespero. Uma olhadinha na história da antropologia mostra que, na maioria das culturas, havia tempo para o lúdico, o sagrado, o profano, a natureza, a comunidade, o sono.
Sim, eles não tinham anestesia, analgésicos, stents cardíacos e colchões de mola. Mas será que o avanço tecnológico e o conforto precisam vir em detrimento do descanso, do convívio social, da saúde mental e até mesmo do prazer e do tesão? A resposta é não.
Uma pessoa que trabalhe seis dias por semana para folgar um não passa apenas as 44 horas contratuais em função de trabalho (o que já seria muito). Inclua-se aí o tempo de deslocamento até a empresa, que em cidades grandes pode alcançar duas horas, e mais um intervalo de almoço mastigado com pressa.
Se for mulher, ainda há de se contar o tempo em que ela cozinha, lava, passa e faxina quando chega em casa ou nos fins de semana. Essa não é uma história sobre "pobres metafóricos" e sim sobre parte considerável da população brasileira.
Não é de se admirar que esposas vivam alegando dor de cabeça para não transar —é uma rotina adoecedora. Não me impressiona que tantos homens confidenciem falta de interesse em sexo e vontade de passar o pouco tempo que lhes resta em atividades que os distraiam, sejam os jogos eletrônicos ou até a pornografia, um prazer efêmero que não exige muito esforço físico ou emocional.
Claro que o jovem que decidiu adotar a máxima "trabalhe enquanto eles dormem" na startup "disruptiva" tem disfunção erétil aos 26 anos por causa do burnout e não transa sem tadalafila.
Também é compreensível que boa parte do sexo praticado nessas condições de vida seja rápido e sem graça, principalmente para quem tem clitóris e precisa de mais estímulo. Em uma sociedade movida a status e reconhecimentos mensuráveis, relações sexuais viraram mais uma meta para cumprir em certos contextos.
Quantas vezes você foi num date de aplicativo mesmo sem estar tão a fim e transou com uma pessoa com quem nem rolou química apenas para marcar a tarefa trepar no check list e aumentar a contagem de fodas? De certa forma, sexo vira também trabalho ao assumir uma dimensão utilitária.
Para se sustentar enquanto modelo econômico o capitalismo fez algumas promessas. Entre elas a de que o avanço tecnológico geraria mais conforto e aliviaria a carga de esforço que precisamos fazer para viver, gerando aumento da qualidade de vida. Contudo, a tecnologia se espalhou por quase todas as áreas do nosso dia a dia e não estamos nos sentindo melhor.
Pelo contrário, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 15% dos adultos em idade ativa têm algum tipo de transtorno mental, sendo ansiedade e depressão os mais comuns. A própria Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta que cargas horárias pesadas e ambientes de trabalho tóxico contribuem para esse cenário.
É um problema global e coletivo, que insistimos em tratar apenas com diagnósticos e antidepressivos individuais. Claro que um bando de gente ansiosa e deprimida, usando medicamentos que podem afetar a libido e causar anorgasmia como efeito colateral fica com o tesão lá no pé, né?
E aí não tem viagra, sugador de clitóris, curso de empoderamento, massagem tântrica que resolva. O caminho é coletivo. E parte desse caminho passa, necessariamente, por trabalhar menos e ter mais tempo para diversão, celebração, flerte, beijo na boca, dedada, língua no grelo e revolução.
A repressão e insatisfação sexual, a histeria, a neurose e o burnout não são o estado natural do ser humano. São estruturas que a sociedade patriarcal, pós-iluminista, capitalista e de culto ao trabalho e ao dinheiro erigiu e mantém. Escala 4x3 já, para devolver o tesão ao brasileiro.
E se, depois de ler isso, tudo que você tem a dizer é "na União Soviética é pior", reflita mais um pouco, porque isso não significa que é bom.