Tony Goes

Sem nada para fazer, extrema direita inventa boicote a marca de chocolate

Vai dar tão certo quanto a campanha de Malafaia contra a Disney

Felipe Neto fez campanha para Bis, que sofre boicote de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro - Divulgação

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Há uma guerra sangrenta em curso no Oriente Médio. Terroristas degolaram bebês no berço. No sul da Faixa de Gaza, brasileiros esperam há dias pela abertura da fronteira com o Egito, para conseguirem voltar ao Brasil.

Enquanto isto, uma seca sem precedentes assola a Amazônia. O rio Solimões, que ao se juntar ao rio Negro passa a ser chamado de Amazonas, virou um deserto em alguns trechos. Comunidades ribeirinhas e animais correm risco de vida.

Estas são apenas duas das crises que assolam o Brasil e o mundo neste momento. A guerra na Ucrânia segue firme, golpes de estado acontecem na África, as mudanças climáticas causam desastres no Rio Grande do Sul e em muitos pontos do planeta. E qual foi o problema que a extrema direita brasileira resolveu transformar em cruzada santa? O apoio publicitário do influenciador Felipe Neto ao chocolate Bis.

Nas redes sociais, a hashtag #BisNuncaMais acumula milhares de compartilhamentos. Vídeos de crianças recusando, e até destruindo embalagens do chocolate, viralizaram. Até o folgazão do ex-presidente Bolsonaro entrou na onda, fazendo propaganda gratuita para o Kit Kat, concorrente do Bis.

Tudo isso é de um ridículo indescritível, mas a extrema direita jamais encontrou um vexame pelo qual preferisse não passar. Das dancinhas de robô nas eleições de 2018 ao "patriota" agarrado a um caminhão, os caras se esmeram em inventar situações vergonhosas para si mesmos.

Felipe Neto está longe de ser uma unanimidade nacional, mas não só é um dos influenciadores mais importantes do Brasil, como tem uma penetração entre o público jovem que nenhum direitista radical tem. De crítico feroz de Lula alguns atrás, Felipe apoiou a eleição de seu antigo desafeto em 2022. Prestou atenção aos fatos, e mudou de ideia –algo que não existe no vocabulário limitado dos minions, que jamais o perdoarão por ter ajudado a derrotar Bolsonaro nas urnas.

Bis é uma das marcas mais conhecidas e tradicionais do Brasil. Gerações inteiras cresceram consumindo o confeito. Em lojas de produtos brasileiros no exterior, ele é uma das estrelas, ao lado do requeijão, da paçoca e do pão de queijo.

Achar que um boicote promovido na internet vai abalar a Mondelez, a gigante multinacional que comprou a Lacta (e, por conseguinte, também o Bis), é mais um delírio de grandeza de uma galera muito vocal e agressiva, mas que não teve o poder de impor sua vontade nem quando depredou as sedes dos Três Poderes em Brasília.

O cancelamento do Bis pelos bolsonaristas remete à campanha que Silas Malafaia tentou promover contra a Disney em 2017, por causa de um beijo entre dois rapazes numa série animada produzida pela empresa.

Alguém se lembra disso? Muito provavelmente, não, porque não deu em nada. O apoio da Disney à comunidade LGBTQIA+ incomoda os reacionários e os teocráticos há muito tempo, mas seus protestos jamais abalaram essa política interna da companhia.

O mesmo destino parece aguardar o boicote ao Bis. A marca vem ganhando espaço gratuito na mídia há dias, o que é sempre bom. Pode até ficar mais presente na cabeça do consumidor, como aconteceu com a linha de cosméticos à base de caju da L’Occitane au Brésil, aquela da propaganda com o estapafúrdio caju invertido.

Mas a extrema direita não pensa neste efeito colateral. Só quer fazer barulho e fingir um poder que nunca teve. Soluções para problemas concretos? Jamais tiveram. Preferem negar a existência deles ("não há racismo no Brasil", "gays só fazem mimimi") ou sugerir cloroquina. Vivem numa bolha em que o prefeito de Sorocaba é o grande responsável pelo resgate de quase mil brasileiros de Israel. Então, que esperneiem à vontade. O resto do mundo tem mais o que fazer.