Tony Goes
Descrição de chapéu Copa do Mundo 2022

Copa do Qatar tem excesso de 'canções oficiais', e nenhuma delas emplacou

Só um dos clipes apela para a sensualidade, que o país árabe reprime

O cantor Jung Kook (de preto) se apresenta na abertura da Copa do Qatar - Karim Jaafar-20.nov.2022/AFP

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São Paulo

Até hoje, toda vez que eu penso na Copa do Mundo de 2010, uma música começa a tocar automaticamente na minha cabeça: "Waka Waka (This Time for Africa)", o hino oficial daquele torneio, imortalizado por Shakira e pela banda sul-africana Freshlyground.

O sucesso foi tão grande que Shakira virou uma espécie de cantora semioficial da Fifa. A colombiana ainda gravou "La La La" com Carlinhos Brown para a Copa de 2014, e foi convidada para se apresentar na cerimônia de abertura da Copa do Qatar. Como outros artistas, recusou, horrorizada com o tratamento que o país árabe dispensa a mulheres, gays e trabalhadores imigrantes.

O carisma de Shakira faz falta neste ano. Um grande hit, também. A Fifa lançou até o momento pelo menos seis canções "oficiais" da Copa de 2022, sem dar a nenhuma delas o status de hino. Nenhuma pegou.

A primeira delas, "Haya Haya (Better Together)", saiu em abril passado. Cantada pelos americanos Davido e Trinidad Cardona e pela qatari Aisha, é um reggaeton bem mais ou menos. No clipe, estão todos vestidos dos pés à cabeça –ninguém mais que Aisha, que quase não se mexe em sua contagiante desanimação.

Em agosto surgiu mais um reggaeton, "Ahrbo", defendido pelo porto-riquenho Ozuna e pelo francês GIMS. O vídeo é um pouco mais ousado: mostra um grupo de garotas dançando, ainda que de calças compridas e camisas largas –mas assanhadas o suficiente para eriçar as monarquias chauvinistas da Península Arábica.

A ousadia avança uma casinha com "Light the Sky", lançada em outubro e produzida por RedOne, responsável pelos primeiros sucessos de Lady Gaga. A canção, que mistura refrões de torcidas com batidas eletrônicas, é interpretada por quatro estrelas populares no Oriente Médio: a iraquiana Rahma Riad, a iemenita Balqees, a marroquina Manal e a canadense Nora Fatehi, que é atriz de Bollywood. Braços e ombros aparecem no clipe, mas não há nenhum umbigo à vista.

Em outubro, a Fifa lançou o "tema oficial" da Copa, que não tem nome nem letra –é uma faixa instrumental, com elementos árabes no arranjo. Para tocar nas vinhetas de abertura dos jogos.

No sábado passado (19), foi liberada a mais divertida e original de todas: "Tukoh Taka", o "hino oficial" da Fan Fest, que abriu em Doha naquele mesmo dia. É, de longe, a que tem mais potencial para ser lembrada daqui a alguns anos. O elenco é peso-pesado: o colombiano Maluma, a trinitária-tobaguense Nicki Minaj e a libanesa Myriam Fares, que arrasa na dança do ventre. De novo, não se veem umbigos, mas a sensualidade das cantoras pode causar um infarto no emir do Qatar.

Curiosamente, nenhuma delas foi tocada na cerimônia de abertura no domingo (20). A honra coube a uma música inédita até então: "Dreamers", com o sul-coreano Jung Kook, da banda BTS, e o qatari Fahad al-Kubaisi. O clipe oficial, lançado na terça-feira (22), já acumula mais de 12 milhões de visualizações no YouTube, sugerindo que finalmente a Fifa tem um hit nas mãos.

Um pouco tarde, talvez? A Copa já está a todo vapor, e talvez não dê mais tempo para uma canção penetrar no nosso inconsciente coletivo.

O curioso é que nem mesmo o Brasil, que tem na música e no futebol suas duas grandes paixões, conseguiu produzir um hit para o Mundial de 2022. Fenômenos como "A Taça do Mundo É Nossa", "Pra Frente Brasil" e "Voa, Canarinho, Voa" são coisa de um passado cada vez mais distante.

Talvez seja culpa da polarização política, da guerra na Ucrânia ou do regime do Qatar, que reprime até mesmo a bandeira de Pernambuco. Mas não deixa de ser sintomático que a Copa mais esquisita de todos os tempos não tenha um hino para chamar de seu.

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