Tony Goes

Vilã de 'The Handmaid's Tale' evoca Michelle e Heloísa Bolsonaro

Quinta temporada da série estreia em 18 de setembro no Paramount+

Serena Waterford (Yvonne Strahovski) em cena da quarta temporada de "The Handmaid's Tale" - Sophie Giraud/Hulu

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São Paulo

O machismo só resiste porque existem mulheres machistas. Quem diz isso é minha amiga e colunista da Folha, Mariliz Pereira Jorge. Ela tem razão. Afinal, as mulheres são maioria no mundo inteiro, e já teriam extinguido o patriarcado se não fosse por algumas que desfrutam de posições confortáveis num sistema que oprime as demais.

Vemos isto claramente na atual campanha eleitoral. Não faltam mulheres que se declaram a favor da "família" –não de todas as famílias, é claro, mas só daquelas em que o homem tem a última palavra. E isto num país onde milhões de lares são chefiados por mulheres solteiras ou descasadas.

O fenômeno é mundial, e ganhou tração com a ascensão da extrema-direita em diversos países. Também é refletido na cultura pop, servindo de inspiração para inúmeros filmes e séries. Uma das mais notórias é "The Handmaid’s Tale - O Conto da Aia", cuja quinta temporada estreia no dia 18 de setembro na plataforma Paramount+.

Baseada num livro de Margaret Atwood, "The Handmaid’s Tale" estreou nos EUA em 2017, no início da presidência de Donald Trump. A história se passa num futuro próximo, na fictícia república de Gilead –um estado teocrático que ocupa grande parte do território do que foram os Estados Unidos.

As mulheres são criaturas de segunda classe em Gilead. Não só não têm direitos políticos como sequer podem ser alfabetizadas. Dividem-se entre várias castas. A mais alta é a das esposas dos comandantes, os líderes da nova nação. A mais baixa, a das aias: moças em idade fértil, cuja única missão é gerar filhos para os comandantes.

June Osborne, vivida por Elisabeth Moss, é uma aia. Seu marido conseguiu fugir para o Canadá, mas ela e a filha foram capturadas por Gilead e separadas. Designada a servir o comandante Fred Waterford, interpretado por Joseph Fiennes, ela logo desenvolve uma rivalidade com a mulher deste, Serena Joy, papel de Yvonne Strahovski.

Na quarta temporada, estão todos no Canadá. June finalmente conseguiu fugir de Gilead, e o casal Waterford, em visita ao país, foi detido por crimes contra a humanidade. Serena está grávida, depois de anos de infertilidade.

Fred é libertado em troca de 22 mulheres que querem deixar a teocracia, mas acaba sendo morto por uma turba furiosa de ex-aias liderada por June. Ela manda um dedo do comandante para Serena, para que esta saiba que foi June quem o matou.

Assisti aos três primeiros episódios da quinta temporada, que começa com Serena se inteirando da morte do marido. Ela então toma uma decisão surpreendente: quer levar o corpo dele para Gilead, para um funeral grandioso.

As autoridades canadenses concordam, e se surpreendem ainda mais quando Serena anuncia que quer ficar em Gilead. Ao invés de ter sua filha no Canadá, onde poderia criá-la com liberdade, ela prefere voltar à ditadura que lhe custou o dedo mínimo da mão esquerda.

Serena era uma escritora religiosa e antifeminista antes de Gilead, autora do livro "O Lugar da Mulher". Mesmo sendo a favor, ela não pode mais ler e escrever sob o novo regime. Quando se rebela, é punida com a amputação de um dedo.

Por que uma mulher que sofreu tanto continua apoiando seus algozes? Porque Serena Joy acha que, sendo a viúva de um comandante importante, gozará de um status privilegiado naquela sociedade fechada.

Só que ela está enganada. Ao voltar a Gilead, vê negado seu pedido de um funeral pomposo para o marido. Mas o comandante Lawrence, feito por Bradley Whitford, garante que o desejo de Serena seja atendido, e dá uma explicação singela de como conseguiu convencer seus pares: "eu não sou mulher".

A cegueira de Serena Joy ecoa a das mulheres machistas da vida real. A primeira-dama Michelle Bolsonaro parece satisfeita em ser reduzida a um adereço da campanha de reeleição do marido, contanto que seja chamada de "princesa". Sua nora Heloísa, mulher de Eduardo Bolsonaro, disse num evento do PL em Porto Alegre que "casamento é submissão" e que "nenhuma mulher é insubmissa, independente e livre".

É por esta e por outras que "The Handmaid’s Tale" continua tão atual.