Com Lula apático e Bolsonaro descontrolado, mulheres assumem o protagonismo do debate
Faltou 'media training' aos dois candidatos mais bem colocados nas pesquisas
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O primeiro debate entre os principais candidatos à presidência da República nas eleições 2022 prometia um confronto direto entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que lidera todas as pesquisas, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), que busca a reeleição. Os dois até se bicaram, mas as performances de ambos frustraram suas respectivas equipes. Quem acabou roubando os holofotes foram as candidatas Simone Tebet, do MDB, e Soraya Thronicke, da União Brasil.
Antes de prosseguir, cabe um esclarecimento. Esta coluna busca analisar a forma como os presidenciáveis se expressaram durante o debate, não o conteúdo do que disseram. Foi o que tentei fazer na semana passada, quando comentei as participações de Ciro Gomes (PDT) e de Lula no Jornal Nacional.
Mas, como dizia Marshall McLuhan, o meio é a mensagem, e às vezes é impossível separar o conteúdo da forma. Um exemplo claro dessa dificuldade foi fornecido por Bolsonaro, que reagiu com sua proverbial grossura a uma pergunta sobre vacinação feita pela jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura.
O presidente começou o debate carrancudo e agressivo, o mesmo combo que apresentou na bancada do JN. No segundo bloco, pareceu estar mais relaxado e chegou a rir de uma resposta de Lula. Mas entornou o caldo de vez ao dizer que Vera é "uma vergonha para o jornalismo brasileiro", e ainda atacou Simone Tebet, que tentou defender a repórter.
Bolsonaro se gaba de sua suposta autenticidade, e diz rejeitar qualquer tipo de "media training" –o treinamento, com profissionais especializados, que muitos políticos e celebridades fazem para lidar com jornalistas. No entanto, era óbvio que seus ataques a Lula foram previamente ensaiados, assim como as respostas que ele dava quando era acusado de alguma coisa.
Acontece que o candidato do PL, acostumado com o cercadinho e a adulação das emissoras camaradas, perdeu a capacidade de reagir ao contraditório. Já havia dado uma sobeja demonstração de descontrole emocional ao tentar arrancar o celular do influenciador Wilker Leão, que o chamou de "tchutchuca do Centrão". Neste domingo (28), perdeu novamente as estribeiras, e justamente com duas mulheres –duas integrantes do segmento da população em que ele mais precisa conquistar votos. Quase que deu para ouvir os gritos de desespero de seus marqueteiros.
A partir daí, misoginia se tornou o tema principal do debate, eclipsando até mesmo a fome e a inflação. E tanto Simone Tebet quanto Soraya Thronicke, que já vinham se mostrando assertivas e desenvoltas, aproveitaram a deixa para assumir de vez o protagonismo do encontro.
Tebet, que deu uma entrevista morna ao Jornal Nacional, recuperou a persona combativa com que despontou na CPI da Pandemia. E Thronicke, desconhecida pela maioria dos eleitores, marcou presença com frases de efeito. Pediu que reforçassem sua segurança, depois de ameaçar revelar segredos comprometedores (mas não revelou nenhum), e disse ser capaz de virar onça, como a Juma Marruá da novela "Pantanal".
Ciro Gomes foi o Ciro de sempre, dosando humor e indignação. Mas surpreendeu ao se mostrar muito mais agressivo com Lula, de quem foi ministro, do que com Bolsonaro.
Já Felipe D’Ávila (Novo), outro desconhecido pelas massas, insistiu demais na tecla da privatização, sem empolgar ninguém. E ainda gerou memes na internet, ao se declarar "um brasileiro como vocês", apesar de possuir um patrimônio de quase R$ 25 milhões, ou se referir à Lei Maria da Penha como "Maria da Paz".
E Lula? Depois de uma participação estelar no Jornal Nacional, reconhecida até mesmo por seus adversários, o petista rendeu muito menos do que seu entorno esperava. Com a energia baixa, Lula soou apático ao se defender das acusações de corrupção. Também deixou que os demais candidatos atacassem Bolsonaro, se poupando de um conflito mais estridente com o candidato do PL.
A sorte de Lula é que o presidente se saiu ainda pior. Mas isto não diminui o fato de que ambos terão que passar por mais sessões de "media training", e até mesmo repensar as estratégias que vêm usando até o momento.