Saída de Aguinaldo Silva mostra que, na Globo de hoje, ninguém pode errar
Autor deixa a emissora depois de um único fracasso: 'O Sétimo Guardião'
Às 16h30 desta quinta (2), um email lacônico chegou às redações dos jornais.
“Sem nova obra prevista, a Globo decidiu não renovar o contrato com o autor Aguinaldo Silva. Ao longo dos mais de 40 anos dessa parceria de sucesso, foram mais de 20 trabalhos em conjunto, entre os quais ‘Império’, que ganhou o Emmy Internacional de Melhor Novela em 2014.”
Mais nada. O autor de “Senhora do Destino”, a novela de maior audiência da emissora na primeira década deste século, não mereceu sequer o desejo de boa sorte em futuras empreitadas, comum em anúncios do gênero.
O desligamento de Aguinaldo Silva da Globo não chega a ser surpresa. No final de 2019, começaram a circular rumores de que a Globo não renovaria contrato com ele. A razão é simples: o relativo fracasso de “O Sétimo Guardião” (2018-2019), que ainda teve sua produção conturbada por inúmeros incidentes.
Os problemas começaram antes mesmo de a novela ir ao ar. Silvio Cerceau, um ex-aluno do workshop de roteiros que Aguinaldo administra fora da Globo, entrou com um processo na Justiça, alegando que personagens e situações da novela teriam sido desenvolvidos pela classe durante as aulas e exigindo ser reconhecido como coautor da obra. Outros sete alunos fizeram o mesmo.
Assustada, a Globo cancelou “O Sétimo Guardião”. O próprio Aguinaldo anunciou que já estava trabalhando em outra sinopse, com o título provisório de “Enquanto Seu Lobo Não Vem”.
Foi então que algo surpreendente aconteceu: a emissora fechou um acordo com toda a classe do malfadado workshop, e “O Sétimo Guardião” entrou em produção. Nenhum valor foi divulgado, mas os nomes de todos os alunos passaram a aparecer nos créditos da novela.
Este foi só o primeiro problema. Muitos outros aconteceriam ao longo dos meses seguintes, de denúncias de assédio contra Caio Blat ao escândalo da separação de José Loreto e Débora Nascimento, culminando com a morte do figurante Joseph Lima Santos. Parecia que uma maldição havia recaído sobre a novela, que trazia muitos elementos sobrenaturais em seu enredo.
O protagonista Bruno Gagliasso ainda ficou doente e se ausentou das gravações durante um bom tempo. Em novembro passado, descontente com os papéis de mocinho que interpretou nos últimos anos, o ator preferiu não renovar seu contrato com a Globo.
Mas, para a emissora, o pior de tudo foi mesmo a baixa repercussão de “O Sétimo Guardião”. A novela ficou entre as cinco menores audiências de sua faixa horária em todos os tempos, e seu assunto principal – a descoberta de uma fonte da juventude – não engajou o público.
Aguinaldo Silva tem uma folha corrida estelar, acumulando sucessos ao longo das décadas. Mesmo seus folhetins mais fracos, como “Duas Caras” ou “Porto dos Milagres”, foram muito bem no Ibope.
Mas, na Globo de hoje, ninguém pode errar. A empresa vem passando por uma profunda reformulação, enxugando custos e fazendo cortes de pessoal. O salário de Aguinaldo Silva, como autor de primeiríssima linha, estava entre os mais altos da casa. Sem um sucesso estrondoso que justificasse uma renovação, o autor foi dispensado.
Não há por que ter pena de Aguinaldo. Ele acumulou um patrimônio considerável, que inclui uma quinta em Portugal. Curiosamente, ainda não se manifestou no Twitter, onde não costuma poupar seus desafetos de farpas.
Mas sua saída acende um sinal alaranjado. Quem será o próximo? Gilberto Braga, cuja última novela, “Babilônia” (2015), foi um fracasso ainda maior do que “O Sétimo Guardião”? O fato é que, entre novatos e veteranos, ninguém mais está garantido na Globo.