'Eu quero o prédio do sucateira na chón!'
Rainha da Sucata era o que faltava para fazer a festa dos noveleiros no Globoplay
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
Nos últimos anos, os noveleiros se faziam a mesma pergunta nas redes: por onde anda "Rainha da Sucata" (1990), que ainda não entrou no Globoplay? A plataforma lançou "Guerra dos Sexos" (1983), "Vale Tudo" (1988), "Tieta" (1989) e "Que Rei Sou Eu?" (1989), mas nada de a sucateira aparecer. A espera acabou nesta semana, e os fãs já podem rever inteirinha a primeira novela das oito de Silvio de Abreu.
A novela reúne um elenco que a Globo nunca mais vai ver na vida: Regina Duarte em seu auge, Glória Menezes, Tony Ramos, Claudia Raia, Antonio Fagundes, Renata Sorrah, Aracy Balabanian, Raul Cortez, Paulo Gracindo e por aí vai.
Só para se ter uma ideia do poder da emissora, as participações especiais do primeiro capítulo são "apenas" Fernanda Montenegro, Lima Duarte, Marília Pêra e Stênio Garcia. Só a carreira desses quatro já vale mais que o elenco inteiro de "Mania de Você".
Eu tinha 12 anos e morava em Santos. Às vezes, vínhamos de carro para São Paulo. Sempre que entrávamos na avenida Paulista e passávamos em frente ao prédio da Caixa Econômica, quase em frente ao Conjunto Nacional, meu pai, ao volante, dizia: "Sabia que foi desse prédio que a Laurinha se jogou?".
Era uma brincadeira repetida que sempre me fazia rir. E como esquecer da Glória Menezes, de vestido branco esvoaçante, se jogando do alto de um prédio depois de arrancar um brinco da orelha da sucateira?
Dá muita saudade ver que, nos anos 1990, um diretor como Jorge Fernando se permitia mil loucuras. Hoje, o flashback do primeiro capítulo, que mostra o baile de formatura de Maria do Carmo (Regina Duarte) e Edu (Tony Ramos), em que ela toma um banho de lama num bullying estudantil armado por ele, seria feito com atores jovens.
Mas não: o diretor coloca Regina e Tony com um cabelo ridículo fazendo os seus personagens aos QUINZE anos. É quase uma brincadeira de teatro, que hoje tomaria muita paulada no X no dia da estreia.
Uma gueixa muito louca
Maria do Carmo foi um dos grandes personagens de Regina na Globo, da época em que ela era uma grande atriz —se pudesse, eu teria reservado esse banho de lama para quando ela virou ministra da Cultura do Bolsonaro.
Suas roupas exóticas beiravam a anarquia —num dia ela estava com um chapéu triangular de gueixa japonesa, no outro com um vestido de laçarote imenso no ombro que quase fazia a Regina ser engolida no meio dele.
Sem falar naquela mesa de trabalho incrível, com a parte da frente de um Chevrolet 1958. Poder, luxo, riqueza e cafonice, tudo junto ao mesmo tempo.
Era parte do clima de chanchada da novela, para retratar essa empresária emergente e cafona que bota no bolso os ricos decadentes da família Figueroa: Edu, a vilã Laurinha e o mimado Betinho (Paulo Gracindo), aquele que sempre falava "coisas de Laurinha!".
Novela é uma grande corrida de cavalos, em que até o autor aposta em alguns personagens para brilhar, mas outros sempre podem surpreender. A rivalidade entre a emergente Maria do Carmo e a falida Laurinha era o grande motor de "Rainha da Sucata", mas eis que de repente uma vizinha escandalosa roubou a cena.
Dona Armênia (Aracy Balabanian) amava "seu três filhinhas", morria de ciúme dos três e cresceu tanto na novela que quase botou "a prédio dessa sucateira na chón!". Fez tanto sucesso que Silvio de Abreu trouxe ela de volta em sua novela seguinte, "Deus nos Acuda" (1992).
E olha que a novela pegou uma concorrência que a Globo não esperava. Menos de uma semana antes, a Manchete estreava "Pantanal", a novela mais bem sucedida de toda a sua história. Para tombar a rival, a Globo esticava a história da sucateira para que Juma Marruá entrasse cada vez mais tarde.
E foi ali, em 1990, que a Globo extinguiu um amor dos noveleiros: as cenas do próximo capítulo. A estratégia era começar logo o programa seguinte para que o público não migrasse para "Pantanal". No final, ambas se deram bem, e todo mundo se apaixonou pelas duas.
O verdadeiro dilema era aceitar algum convite para sair de casa; valia mais a pena ver a volta por cima da sucateira e a paixão da mulher-onça pelo moço da cidade grande.