Eriberto Leão vive escritor com bloqueio criativo que transa com fãs e plagia anão
Em 'Maior que o Mundo', ator deixa lado sério de lado para mergulhar em comédia peculiar
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Um homem desce a rua Augusta (região central de São Paulo) falando sozinho. Ele filosofa sobre a vida, registrando a própria voz em um gravador analógico, enquanto passa na frente de botecos e inferninhos e cruza com figuras características da região.
A cena, que poderia ser o registro de uma visita à região numa noite qualquer, abre o filme "Maior que o Mundo", que chega aos cinemas na próxima quinta-feira (18). Na trama, o escritor Kbeto é um frequentador assíduo da região.
Pode-se dizer que não seria difícil encontrar alguém com seu perfil por ali. Kbeto foi sucesso de público e de crítica com seu livro de estreia. Agora, divide seu tempo entre sexo casual, drogas (lícitas e ilícitas) e muitas tentativas frustradas de superar o bloqueio criativo que o impede de fazer um segundo livro.
"Eu me identifico muito com esse universo", afirma Eriberto Leão, intérprete do personagem, acrescentando que morou perto dali na juventude. "Foi um lugar onde eu aprendi sobre rock, onde assisti aos primeiros shows, e onde fui influenciado pela literatura e pela contracultura. Então, foi uma grande homenagem que eu pude fazer a esse universo ao qual eu devo tanto."
Tanto é assim que ele não precisou ir longe na busca de referências para compor o personagem. "Eu acho que tirei um pouco de todas as pessoas que eu conheci e que fazem parte desse universo, desde pessoas reais a pessoas da literatura mesmo", afirma. "Eu penso que ele tem uma semelhança com muitos escritores que já li."
"Você consegue imaginar como é o Bukowski na vida real, não é? A gente tem aquela imagem de referência dele", explica. Além do autor famoso por personagens marginais, ele também cita nomes da geração beatnik, como Jack Kerouac.
Apesar da familiaridade, Eriberto diz que não chegou aos extremos de seu personagem. "Se eu morasse em São Paulo, eu não frequentaria mais a Augusta da forma que ele frequenta, né?", comenta ele, que fixou residência no Rio há 20 anos.
"Ao mesmo tempo que eu sou um artista muito influenciado pela contracultura, também sou influenciado por outro filósofos", diz. "Um deles disse que a moderação é o tesouro do sábio, então eu frequentei muito, tive muitas noites rock'n'roll, mas eu sempre ia até um certo ponto, entendeu? Porque os meus ídolos foram além do ponto e eu e eu aprendi com eles."
Na trama, após uma noite de bebedeira, Kbeto encontra um caderno com as anotações do diário de um anão. Sem outras ideias para seu segundo livro, ele acaba plagiando os escritos e faz ainda mais sucesso que no primeiro livro. Porém, o dono da história aparece para cobrá-lo.
"Eu acho que é uma comédia muito diferente de todas as comédias brasileiras, que são incríveis também, mas ela é singular, é peculiar", avalia. "Quando eu li o roteiro, eu falei: 'Caramba, é um filme que eu gostaria de assistir'. Acho que está faltando esse tipo de comédia."
Mais conhecido pelos personagens dramáticos, como o Leônidas que vive na novela "Além da Ilusão" (Globo), ele conta que esperava a oportunidade de mostrar esse seu outro lado. "Sempre desejei fazer um personagem assim porque eu sou um cara que gosta de estudar, de ler, que leva muito as coisas com seriedade", diz. "É um personagem que não sou eu de maneira nenhuma."
Porém, tem um lado menos conhecido do público que ele acredita ser mais próximo de Kbeto. "Eu não vou falar que sou engraçado, mas acho que tenho alguma influência nos meus filhos, que gostam tanto de serem divertidos —eles têm umas sacações. Então é algo que está dentro de mim e que eu pude talvez pela primeira vez colocar em cena."
O personagem não chega a ter um par romântico, já que parece mais interessado em transar com fãs de seu livro, como a desajustada Audra (Gabi Lopes). Em uma cena da produção, os dois fazem sexo a três com a melhor amiga dele, Mina (Luana Piovani).
"Uma das formas de ele extravasar a energia criativa que ele não consegue direcionar para o papel, para escrita, é vivenciando a sua energia sexual o máximo possível", explica Eriberto. "A energia sexual é energia criativa. Isso a alquimia medieval já falava."
"De alguma forma, foi a maneira que ele encontrou", continua. "Na minha opinião, isso pode até ter atrapalhado ele. Ele pode ter feito esse bloqueio [criativo] continuar porque não conseguia focar. É claro que pode acontecer o inverso, como aconteceu no primeiro livro dele e com vários escritores contraculturais."
Ele cita ainda um de seus ídolos, Jim Morrison, vocalista da banda The Doors, que morreu aos 27 anos. "Ele também abraçou o excesso, mas tem um determinado momento que você tem que recuar", avalia. "O Jim Morrison tem um momento que rompe com os Doors e vai para Paris. Ele tinha 27 anos. O Kbeto continua assim com 50 anos. Então é um lugar que nem Jim Morrison estaria."
Por falar no cantor, que Eriberto já o interpretou no teatro na peça "Jim", diz que seu próximo projeto é voltar a encarná-lo nos palcos. Como o espetáculo vai completar 10 anos em 2023, ele diz que não se vê interpretando o roqueiro em vida, mas planeja uma nova produção em que imagina como ele estaria aos 50 anos, se não tivesse morrido.
"O Jim não faz mais sentido para mim porque não tenho mais 40 anos, eu tenho 50, não dá mais para fazer daquela forma", avalia. "[Agora] vai ser mais musical do que teatro. Queremos algo que funcione tanto para teatro quanto para show. A gente imagina que Jim Morrison não morreu. Quem é esse cara hoje? Até os conceitos musicais vão mudar, não serão mais os shows dionisíacos, vai ser outra coisa. Mas aí é surpresa."