HUMOR: Estatísticas e salsichas
Aí descobrimos que o Ipea, que tem a palavra "pesquisa" no seu nome por extenso, trocou as bolas: aqueles 65% dos brasileiros que acham que mulheres que mostram o corpo "merecem" ser atacadas são, na verdade, 26%. Continua grave, embora agora seja no mínimo difícil confiar nos números do instituto e o levantamento tenha uma série de problemas metodológicos (googlai e encontrareis: estou com preguiça de lincar textos).
Nesse caso específico, não havia como detectar a troca dos gráficos. Mas muitas vezes acontece o seguinte: o Instituto Números a Dar com Pau tira uma pesquisa do nariz e o ser humano jornalista, que como certas tribos só sabe contar "um, dois, três e muitos", vê a palavra ESTATÍSTICA em néon piscante, fica POPOTIZADO e publica -o máximo de checagem que ele faz é conferir se a soma dos percentuais dá mais ou menos 100%.
(Historinha real: economista divulga "levantamento" pelo qual o Brasil é um dos países com mais pobres em números absolutos. Se você virar esse dado de ponta-cabeça, o país também terá grande número absoluto de ricos/milionários, e isso acontece porque, dããã, no Brasil tem gente pra caramba. Essa estatística só serve pra algo se for usado o percentual de pobres -ou ricos- em relação à população total, ou à economicamente ativa. Mas aí o professor Falcatrua manda a pesquisa pro cara do "um, dois, três e muitos" e ele põe no jornal -porque, claro, a tarefa dele é separar o joio do trigo e publicar o joio, embaixo do título APONTA ESTUDO.)
Minha suspeita é que as estatísticas tenham entrado para o seleto grupo das leis, dos jornais e das salsichas: melhor não saber como foram feitas. Até imagino a chefia de certos institutos instruindo seus comandados. "Faz assim: pega o IDH dos países, faz ponderação usando a carga tributária, multiplica pelo índice de cremosidade da manteiga Aviação, divide pela soma do quadrado dos catetos, soma oito só porque eu acho oito um algarismo simpático e subtrai a comissão de 10%. Adiciona sal a gosto e deixa em fogo brando por meia hora. Pronto! Olha que número lindão pra você dizer tudo o que quiser com ele -e também o contrário."
Já que o espírito do tempo é esse e lutar contra ele é vão, por que não revolucionar a estatística de uma vez? Tenho uma proposta: assim como existe a "outsider art", que é arte feita por não artistas, deveria haver "outside statistics", produzida por mim, por você, pela sua tia-avó e por qualquer um que também seja deficiente em operações matemáticas básicas. Nela, a soma dos percentuais pode dar 84% ou 533,7%: a imprevisibilidade dá mais emoção ao processo todo, e chegar sempre a 100% é coisa de burguês coxinha.
Seguem abaixo resultados preliminares das minhas primeiras pesquisas sob os princípios da "outside statistics". Asseguro que todas empregam os mais rigorosos métodos de chutometria.
BATE FORTE O TAMBOR: 25% dos brasileiros querem TIC. Outros 25% querem TIC. Mais 25% querem TIC, e os 25% restantes também querem TIC. Há ainda 25% que preferem TÁ; 150% optam por todas as anteriores.
SERÁ: 10% acham que é só imaginação. 15% acreditam que nada vai acontecer. 45% pensam que é tudo isso em vão, e 38% creem que vamos conseguir vencer. 87%: Ô Ô Ô Ô Ô Ô.
DOMINGO: 50% acham que ela não vai, não vai, não vai. 50% acreditam que ela vai, vai, vai. E 50% optam por todas as anteriores (apenas Caetano Veloso assinalou a opção "ou não").
Me contrata, Ipea. Pode ser o início de uma longa amizade.
RUY GOIABA também já foi brasileiro, moreno como vocês. é estatístico amador (mas jura que não pretende se tornar nem engenheiro nem neurocirurgião amador) e goiaba profissional.
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