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O resort nudista que se tornou novo foco de Covid-19 na França

Cap d'Agde tem visto alguns dos maiores aumentos de infecção

A área meridional de Hérault, e Cap d'Agde em particular, tem visto alguns dos maiores aumentos de infecção. A região do maior resort naturista da Europa tem foco no hedonismo - BBC News
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Chris Bockman
Cap d'Agde, França
BBC News Brasil

Para muitos dos naturistas europeus, e as dezenas de milhares de swingers entre eles, Cap d'Agde, na França, se tornou um destino tradicional de verão, mas um surto de coronavírus na região trouxe uma atenção incômoda sobre seu estilo de vida alternativo.

Um dos países mais afetados pelo coronavírus na Europa, a França havia colocado em prática um dos confinamentos mais rigorosos da região, mas voltou a ver o número de infecções subir depois do relaxamento da quarentena.

Após a chegada do verão no hemisfério norte, cenas de praias lotadas (comparáveis às imagens do Rio de janeiro com praias cheias) vêm provocando polêmica.

A França chegou a registrar um pico de 7.000 novos casos confirmados em um dia no fim de agosto. Esse foi o maior aumento diário desde março. Até o começo de setembro, a França registrava um total de mais de 320 mil casos e mais de 30 mil mortes.

Apesar do aumento exponencial de casos, os números de hospitalizações e mortes diárias permaneceram relativamente estáveis, segundo o governo, já que os jovens menos vulneráveis ​​à doença são a maioria dos novos infectados.

A área meridional de Hérault, e Cap d'Agde em particular, tem visto alguns dos maiores aumentos de infecção. A região do maior resort naturista da Europa tem foco no hedonismo.

Mas agora as autoridades de saúde, que montaram uma operação de teste móvel, descobriram que 30% dos 800 naturistas testados tiveram resultado positivo.

'Todos nós sabemos porque estamos aqui'

Conhecida como a "vila naturista", o resort é uma comunidade isolada com cerca de uma dúzia de clubes de swing e saunas, bem como discotecas eróticas que têm refúgios para casais.

É claro que nem todos os naturistas são swingers (que trocam de parceiros sexuais) e alguns visitantes preferem o vasto local de acampamento mais silencioso em frente à vila principal.

Mas em Cap d'Agde não há distanciamento social. "Todos estão em contato próximo o dia todo e, é claro, nus", disse um casal que pratica swing à BBC.

"Todos nós sabemos por que estamos aqui. Existem muitos outros acampamentos de naturistas familiares mais tradicionais em outros lugares ao longo da costa, sem os clubes de sexo."

No auge do verão, a vila atrai cerca de 45 mil pessoas por dia, e a maioria fica lá por uma semana. Também há quem visite o local por um final de semana e ou faça viagem de um dia. Mas isso era antes da Covid-19.

Como o surto começou

No final de agosto, dois funcionários de um hotel luxuoso na vila testaram positivo para Covid-19. O dono do hotel admitiu que uma festa obscena havia acontecido na cobertura e que as regras de distanciamento social haviam desaparecido.

"Fomos atingidos duplamente", explicou David Masella, o gerente da "aldeia naturista". "Quarenta por cento de nossos visitantes são estrangeiros, a maioria vem da Holanda e da Alemanha, seguidos por italianos e britânicos."

"Com o vírus, muitos dos turistas estrangeiros regulares simplesmente ficaram longe este ano. E então, é claro, fomos atingidos pelo vírus, mas talvez isso fosse inevitável."

"Com 10.000 vagas de camping e 15.000 vagas de hotel no próprio vilarejo, a densidade populacional aqui é sete vezes maior do que na cidade vizinha de Montpellier."

Como as autoridades locais responderam

Autoridades de saúde francesas dizem que a taxa de resultados positivos do centro de testes móvel que montaram em Cap d'Agde é quatro vezes maior do que na área ao redor.

A equipe médica enfatizou que nenhum dos casos exigiu tratamento hospitalar urgente. Como no resto de Agde, o uso de máscara dentro da vila é obrigatório. No entanto, as máscaras e o distanciamento social não combinam muito com o swing.

Jérôme e Nadège, um casal de 40 e poucos anos, se conheceram em um clube de swing em Bordeaux há alguns anos e foram morar juntos em Agde.

"A vila foi transformada da noite para o dia de um local mágico para um local trágico", disse Nadège. "Claro que todos nós temos corrido riscos, mas o bloqueio foi tão difícil e longo que foi importante para o nosso bem-estar relaxar as medidas."

'É o público mais jovem que assumiu mais riscos'

Allen e sua esposa estavam sentados à minha frente, ambos nus, exceto pelas viseiras transparentes cobrindo seus rostos. Eles estão na casa dos 60 anos e acreditam que é injusto isolar a vila.

"Na nossa idade, é claro, somos mais cautelosos sobre onde vamos e com quantas pessoas temos contato próximo", disse Allen. "É a multidão mais jovem que correu mais riscos, mas não é só aqui. Há surtos em todo o país, onde quer que os jovens se reúnam."

No momento em que o surto surgiu, as autoridades locais ordenaram o fechamento temporário de muitos dos clubes e bares da vila onde acontecia muita interação física.

Um deles era o resort Waiki Beach. "Acabei de afastar 22 funcionários. A temporada acabou", disse o diretor Karim Issartel. "Com certeza nosso clube é conhecido por suas festas na piscina lotadas, e as autoridades disseram que isso não pode continuar."

Outro famoso ponto turístico local para a comunidade swinger é a boate Le Glamour. Associado a festas com nudez e espuma com até mil pessoas, foi condenado a fechar em março. Cartazes sugestivos em toda a cidade de Agde incentivam os clientes a serem pacientes, com a promessa de que o Le Glamour será reaberto.

'Ninguém está com vontade de se divertir'

Philippe Barreau tem uma lojas de roupas eróticas na vila há 30 anos e, como chefe da forte associação de 120 empresas daqui, ele tem visto resultados muito ruins.

"Somos extremamente importantes para a economia local: 300 dos 800 funcionários que trabalham aqui foram afastados. Perdi 80% do meu negócio e não sou o único."

"No momento, há apenas 5 mil pessoas hospedadas aqui. Nesta época do ano, deveriam ser 25 mil. Ninguém está com vontade de se divertir."

Mas os swingers que encontrei admitiram que o coronavírus não havia interrompido completamente a atividade sexual não monogâmica. Vários me disseram que se tornaram ainda mais exibicionistas.

Na praia, muitas das mulheres usavam joias no corpo, enquanto os homens desfilavam com os pelos do corpo raspados. Muitos daqueles com cinquenta e poucos anos e início dos sessenta claramente se orgulhavam de sua aparência, e havia casais mais jovens também.

À noite, a maioria veste roupa para ir aos bares e restaurantes ao ar livre ao longo da praia ou à marina privada da vila. Por enquanto, as autoridades estão pedindo aos turistas que planejam visitar a vila para ficarem longe.

Aqueles que vão embora no final das férias estão sendo incentivados a fazer o teste para não espalharem o vírus ao voltarem para casa.

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