Vício em celular pode ser comparado ao vício em drogas; especialistas dão dicas para desapegar
Leia relatos de quem não larga o celular nem um minuto
No mundo em que vivemos, a todo instante queremos estar conectados ao celular, seja para trabalhar ou para atualizar redes sociais, brincar com algum jogo. Porém, de acordo com especialistas, cada vez mais o brasileiro está refém desse aparelho, e o vício em celular pode até mesmo ser comparado ao vício em drogas.
De acordo com Mario Louzã, médico psiquiatra formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), é possível aliar os comportamentos de quem utiliza um entorpecente a quem não deixa o aparelho de lado. “O principio de qualquer dependência é muito parecido, seja químico ou comportamental. Você tem desejo intenso de buscar aquilo. O segundo aspecto é a síndrome de abstinência. Quando fica sem usar você tem reações de ansiedade, irritabilidade. E o terceiro ponto é a tolerância. O uso contínuo faz a pessoa querer aumentar a dose para ter o mesmo efeito”, explica.
A Pesquisa Global Mobile Consumer Survey, de 2018, da consultoria Deloitte, mostra que o celular é o meio mais popular de acesso à internet (95%), bem à frente do computador (64%). Também revela que mais de 60% de mais de 2.000 entrevistados no Brasil já utilizam o smartphone para fins profissionais fora do horário normal de trabalho. Já a distração com o aparelho durante o trabalho ocorre com alguma ou muita frequência para 43% dos respondentes. E 30% deles responderam que não conseguem dormir no horário pretendido ou se distraem com o smartphone ao concluir uma tarefa.
Para Wilton Neto, palestrante e mentor da área de desenvolvimento humano, o distanciamento social é outro sintoma das pessoas muito apegadas ao aparelho. “É ruim o isolamento e o olhar do mundo lá fora através do aparelho. Pior ainda é quando a comunicação daquela pessoa se resume ao celular, mesmo que ela e mais outra estejam no mesmo ambiente. Isso é perigoso, pois há um rompimento de relações”, analisa.
De acordo com Neto, um exemplo desse isolamento ele pôde conferir de perto. “Conheço uma pessoa próxima com esse perfil. Uma mãe descobriu que a filha de 16 anos sofria bullying no colégio e procurou refúgio na internet, onde poderia conversar e conhecer pessoas sem ser julgada. Mas isso fez com que ela se deparasse com um homem maior de idade tentando convencer a moça a fugir com ele”, relata
"PARECE COMPULSÃO"
Completamente viciada em celular, a modelo e empresária Renata Spallicci, 37, não larga o telefone, até porque ela precisa trabalhar com ele. Por isso, resolve 80% das pendências do dia a dia pelo aplicativo de conversas WhatsApp. A comunicação virtual, portanto, é mais do que fundamental, mas às vezes pode passar do limite. “Sim, sou uma viciada no celular, nem sei quantas horas por dia passo mexendo nele. É o tempo inteiro com ele na mão. Sempre olhando, hiperconectada, email, mídias sociais. Durmo com ele na mesa de cabeceira e, se acordo para fazer xixi ou beber água, já vejo as últimas mensagens e atualizações”, conta.
De acordo com a empresária, as únicas vezes em que ela conseguiu se desligar foram quando literalmente não havia como mexer. “Meu celular, uma vez, foi atropelado, mas sobreviveu. Em outra, uma onda quase o levou. Na terceira ele caiu e apagou. Foi nesse dia que fiquei incomunicável.”
Assim como Renata, o apresentador e filho do cantor Netinho, Vini de Paula, 26, não consegue se ver livre do vício. “A pessoa que é viciada em qualquer coisa nunca se considera viciada, mas eu sei que sou viciado em celular. Costumo usar o telefone de 5 a 6 horas por dia”, revela.
O rapaz gosta tanto de mexer no aparelho que já chegou atrasado em aula de inglês, deixou comida queimar no fogão enquanto se entretinha e até dormiu com ele na mão. “Com certeza já pensei em me desligar um pouco. Mas realmente é muito difícil, afinal, quase tudo gira em torno desse aparelhinho.”
O trabalho também é o motivo pelo qual o youtuber e turismólogo Tiago Lopes, 35, não abre mão do dispositivo. Ele já até superou a depressão e a síndrome do pânico com o auxílio da internet. “Eu fico vidrado no aparelho quando eu posto vídeo novo, aí pode me deixar de lado porque é o momento mais legal do trabalho, a troca de ideias com quem me assiste. Quando estou interessado em algum assunto, fico horas naquilo. E também tenho urgência em responder emails e mensagens. Parece uma compulsão em ficar conectado”, revela
TRATAMENTO
Porém, há uma forma de maneirar no uso e até de melhorar o vício. Para o dr. Mario Louzã, médico psiquiatra, é preciso, primeiro, admitir que há um problema. “O tratamento é psicológico, com análise. O uso correto é aquele em que você faria de acordo com uma necessidade real, não a necessidade fútil. O uso bom é quando percebe que não está invadindo outras atividades”, explica.
“Se dormir com o aparelho for imprescindível, é preciso tomar alguns cuidados: coloque-o distante de você, no mínimo um metro. Nunca conectado à internet. Se precisar usá-lo, faça isso uma hora antes de ir dormir”, opina a dra. Cintia Rios, que atua no campo da medicina funcional.
A cantora de funk MC Sara, 19, conta que já está nesse processo de desapego. Ela consegue deixar o celular de lado para fazer outras coisas. “Quando ele está para descarregar eu não uso mais. Já esqueci o celular três dias em casa e achei que iria ficar louca, mas foi bem tranquilo. Às vezes, eu afastava algumas pessoas de mim”, finaliza.
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