Vilão em 'Novo Mundo', Roberto Cordovani chorou em cena de chicoteamento de escrava
Ator comemora reprise na Europa, e diz que ainda é reconhecido nas ruas por papel
Como o vilão Sebastião Quirino em "Novo Mundo", Roberto Cordovani acredita que é preciso existir "o mal" para a criação de reflexões dentro de uma narrativa. E na atuação, isso demanda ainda mais: o ator revela que passou por muitas cenas difíceis quando gravou, em 2017, a novela que atualmente é reprisada na faixa das 18h da Globo.
"Sebastião Quirino é uma personagem que, como Dom Pedro I, existiu. Foi o grande escravagista da época", define Cordovani. Para ele, uma das cenas mais marcantes em sua experiência de gravação é a em que Sebastião leva a escrava Idalina (Dhu Moraes) para ser chicoteada em praça pública, seguida do filho bastardo.
"Foi comovedor. Nós nos abraçávamos chorando. Eu sou um ator de teatro, mas foi fazendo 'Novo Mundo' que eu perdi a voz de tanto que eu gritava", diz, lembrando que foram necessárias 11 horas para gravar a cena, com uma caracterização detalhada de ferimentos físicos. Outra cena que demandou mais tempo é a em que ele coloca fogo em sua própria casa –foram 12 horas com a presença do corpo de bombeiros, mesmo que o ator tenha acertado a gravação de primeira.
Cordovani também comemora a repercussão da reprise de "Novo Mundo", uma vez que tem recebido bons feedbacks pelas redes sociais, e diz que até hoje é parado na rua por pessoas que se lembram de seu personagem. "A minha família que mora na Europa me ligou falando que a novela também vai ser reprisada lá. Vai entrar no horário da tarde", diz.
Fazendo um balanço da novela, o ator conta que aprendeu muito sobre o perfil dos brasileiros nas gravações. "A novela começou pelos portugueses chegando e explorando o Brasil como se fosse o quintal da sua casa. Lamentavelmente hoje em dia ainda vemos brasileiros assim [...] É curioso que agora, com a onda do coronavírus, estamos todos iguais. Vamos parar com essas diferenças, achando que 'A' é melhor que 'B'".
Confira a entrevista completa com Roberto Cordovani:
O que você achou de Novo Mundo ter sido escolhida para ser reexibida neste momento? Como você recebeu a notícia da volta da novela?
Adorei saber da possibilidade do grande público rever essa novela. Principalmente em circunstâncias como estão todos. Em suas casas, confinados. Eu acho que, inclusive, vai ter um chamamento mais maciço. Além de ter sido um grande êxito na faixa das 18h.
Foi um trabalho feito com muito esmero, uma equipe fantástica, embasamento e textos bem solidificados, contando uma parte da história desse Brasil tão turbulento. É importante rever da onde vem tantas coisas; a influência de outros povos na construção dessa identidade que é o brasileiro.
Qual a importância desse personagem na sua carreira?
Sebastião Quirino é uma personagem que, como Dom Pedro I, existiu. Foi o grande escravagista da época. Foi o homem que deu à família real a Quinta da Boa Vista em troca de não pagar impostos e de poder traficar escravizados. Ele acabou sendo o grande vilão, o grande corrupto. É muito interessante ver de onde vem tanta corrupção. Vem de povos que abdicaram dessa terra, sem respeitar valores, direitos, religião de um povo que aqui já habitava, que são os índios. A partir daí começa essa grande confusão de terras. Como toda história precisa ter o mal para, a partir daí, fazer uma reflexão.
Qual cena gostaria de rever?
A cena que mais me deu indignação é quando Sebastião leva a escravizada Idalina (Dhu Moraes) para ser chicoteada em praça pública e logo depois põe o filho bastardo para ser chicoteado. Foi uma cena dificílima, que envolveu muita gente do elenco que estava ali comigo. Foi uma cena que demoramos, entre interna e externa, 11 horas. O pessoal da caracterização tinha que fazer as marcas nas costas do ator Renan Monteiro a cada chicotada que eu dava no personagem Mathias. Foi comovedor. Nós nos abraçávamos chorando. Eu sou um ator de teatro, mas foi fazendo 'Novo Mundo' que eu perdi a voz de tanto que eu gritava. Foi um papel que abriu chagas no momento da gravação, mas o ator é isso. É um trabalho de entrega.
Qual a cena mais difícil?
As cenas difíceis do Sebastião eram várias. Eu passei a novela comendo muito. Sempre observei que nas novelas da Globo as pessoas que estão à mesa não comem ou perdem a vontade de comer, ou discutem na hora da comida. Eu quis mudar um pouco isso. Meu personagem não tinha papas na língua, não tinha nenhuma cordialidade. Então, pra mim, eu tinha feitos muito difíceis e políticos. E fazer isso comendo com as mãos me exigia muita atenção. Eu fazia questão de já começar a comer antes de começar as gravações para o público ver que a mesa já está utilizada. O pão está partido, migalhas, minha mão já suja de frango. Isso ajudava muito na concepção. Isso se tornar orgânico é muito difícil, mas foi muito bom.
Que momento das gravações você lembra com mais carinho?
Todos. A cena em que Sebastião põe fogo em uma casa também foi muito difícil. Acho que foram 12 horas com corpo de bombeiros, equipe de efeito especiais. Foi muito difícil gravar tudo aquilo, mas acertei de primeira. Foi muito difícil, estávamos todos muito tensos. Era no final da novela, mas foi muito prazeroso, sempre teve muita união. Em 'Novo Mundo', a equipe era de uma união enorme.
O que você tem ouvido dos amigos e do público desde que foi anunciada a volta da novela? Como está a repercussão?
A repercussão está sendo ótima. A minha família que mora na Europa me ligou falando que a novela também vai ser reprisada lá. Vai entrar no horário da tarde. A repercussão está sendo ótima, todo mundo adora, tenho recebido muitas mensagens no Instagram, no Facebook. Até hoje eu sou parado na rua porque as pessoas lembram do vilão com um certo carinho. Agradeço o feedback que todos acabam dando ao longo da novela.
Tem alguma característica ou algo que você aprendeu com o personagem, que ficou para a sua vida?
O que eu aprendi foi entender o perfil de muitos brasileiros sobre mentira, empurrar as coisas com a barriga, a catequização da corrupção. A novela começou pelos portugueses chegando e explorando o Brasil como se fosse o quintal da sua casa. Lamentavelmente hoje em dia ainda vemos brasileiros assim. Eu aprendi muito a respeitar as diferenças cada vez mais. É claro que a minha personagem não respeitava, mas fez com que eu, Roberto, respeitasse as diversidades, etnias, enfim... tudo. Nós somos antes de tudo seres humanos. É curioso que agora, com a onda do coronavírus, estamos todos iguais. Vamos parar com essas diferenças, achando que A é melhor que B. E também a lei do retorno. Aqui se faz, aqui se paga. E às vezes paga-se muito rápido pelo mal que causamos.
Quem você conheceu na novela e mantém a amizade até hoje?
Eu e Agatha Moreira criamos uma amizade bem querida [na novela]. Ela já leu diversos espetáculos que escrevi.
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