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Cinema e Séries
Descrição de chapéu The New York Times

Taron Egerton diz que seus piores filmes foram só pelo dinheiro: 'Ignorei meus instintos'

Em 'Black Bird', ator vive presidiário diante de uma escolha inusitada

Taron Egerton posa para foto em Londres Ana Cuba/The New York Times

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Sarah Bahr
The New York Times

Taron Egerton incorporou um deus pop quando interpretou Elton John na cinebiografia "Rocketman", e recebeu críticas muito elogiosas –e um Globo de Ouro– por seu retrato de como um tímido pianista prodígio se transformou em superastro internacional.

Mas em seu mais recente papel, o de um traficante de drogas condenado, em "Black Bird", série dramática da Apple TV+, ele não tinha óculos extravagantes ou boás de penas para deixar de lado ao final de cada dia de gravação. Em "Black Bird", baseado em uma história real ele tinha de deixar de lado algo de muito mais pesado: as confissões de Larry Hall, um homem condenado pela morte de uma garota e suspeito de ter sequestrado, estuprado e matado muitas outras.

"Por melhor que tenha sido a experiência, em termos criativos, havia dias em que eu voltava para casa com o sentimento de que não queria mais ouvir falar de nenhuma daquelas coisas", disse Egerton, cujo personagem tem como tarefa extrair confissões do colega de cela, em uma recente conversa por vídeo, da cozinha de seu apartamento em Londres.

Egerton, 32, que emprestou seu suave timbre de tenor a personagens extravagantes (como Elton John) e hirsutos (como o gorila das montanhas Johnny, no musical de animação "Sing - Quem Canta Seus Males Espanta"), com certeza poderia escolher o papel musical que quisesse, depois de "Rocketman". E sua beleza muito bem esculpida e penetrantes olhos verdes parecem pedir por uma capa e um uniforme justíssimo.

Mas ele decidiu que seu próximo papel importante diante das câmeras seria alguma coisa que demonstrasse ao mundo que ele era capaz de algo mais do que musicais.

"Eu queria fazer alguma coisa realmente diferente de ‘Rocketman’", disse Egerton. "As pessoas sempre tendem a pensar em você com base no último papel que fez. Ninguém quer assumir o risco de dar um papel a um ator sem tê-lo visto interpretar algo parecido primeiro".

Ele encontrou o que procurava no thriller psicológico "Black Bird", uma minissérie em seis episódios que o escritor e roteirista Dennis Lehane ("Sobre Meninos e Lobos") adaptou de "In With the Devil", um livro sobre a vida em uma penitenciária, escrito por James Keene e Hillel Levin.

A série estreou em 8 de julho e o personagem central é Jimmy Keene (Egerton), que recebe a oportunidade de ver sua sentença de 10 anos de prisão comutada caso ele consiga convencer Hall (Paul Water Hauser) a lhe contar onde enterrou o corpo de pelo menos uma menina desaparecida, e talvez uma dúzia de outras vítimas.

"Um papel como de Jimmy –ou, na verdade, como o de Elton– é com certeza o tipo de papel que desejo fazer em minha carreira", disse o ator. "Isso não significa que tudo que desejo fazer precise ser sombrio e escuro –ainda que isso com certeza me atraia—, e sim que dispor de um texto como aquele realmente estimula a criatividade, e faz com que você deseje oferecer absolutamente o seu melhor desempenho".

Egerton nem sempre foi tão entusiástico quanto a atuar. Ele nasceu em uma família britânica de classe trabalhadora. Seu pai operava uma pousada em Liverpool e sua mãe trabalhava como assistente social. Os dois se divorciaram quando ele tinha dois anos, e Egerton se mudou com a mãe para o País de Gales.

Aos 12 anos, a família se mudou para uma nova cidade em Gales, Aberystwyth, e a mudança o levou a se sentir desesperadamente sozinho. "Quando nos mudamos, perdi todos os amigos que tinha quando criança", ele disse. "Eu era um cara bem confiante e marrento, mas isso era para mascarar a insegurança que sentia". Egerton só começou a atuar aos 15 anos. "Talvez fosse mais um esforço de ser sociável e tentar fazer amigos do que exatamente um interesse por atuar", ele disse.

Mas Egerton persistiu. Depois de se formar na Real Academia de Arte Dramática, em 2012, ele conquistou alguns papéis pequenos, trabalhando em uma produção teatral de "The Last of the Haussmans" no National Theater de Londres e em "Lewis" e "The Smoke", duas séries televisivas britânicas.

Em seguida surgiu a sua grande oportunidade. O diretor Matthew Vaughn ("Kick Ass- Quebrando Tudo" e "X Men: Primeira Classe") o escalou como o batedor de carteiras transformado em espião Eggsy, em "Kingsman - Serviço Secreto", uma comédia de ação britânica. Era um dos papéis principais do filme, no qual ele contracenou com Colin Firth, apesar de Egerton àquela altura ter experiência nenhuma em cinema.

"Ele veio e fez um teste perfeito para o papel", disse Vaughn por telefone. "Ele era Eggsy. Gostei ver aquele lado dele no papel, porque interpretar Eggsy também tinha a ver com se tornar parte de um mundo que você jamais tinha visto, e crescer."

Depois do sucesso do primeiro "Kingsman", que faturou mais de US$ 414 milhões (cerca de R$ 2,1 bilhões no câmbio atual) em todo o mundo, Egerton conquistou papéis em "Voando Alto", no musical de animação "Sing - Quem Canta Seus Males Espanta", da Disney, e em "Kingsman: O Círculo Dourado", a continuação de seu primeiro grande trabalho.

Mas depois veio um período de dificuldade, primeiro com o papel título de "Robin Hood - A Origem" na adaptação dirigida em 2018 por Otto Bathurst, e depois como o antagonista em "Billionaire Boys Club" (2018), um drama sobre crime. Os dois filmes fracassaram nas bilheterias e receberam péssimas críticas.

"Ignorei meus instintos, naqueles dois trabalhos, porque me ofereceram muito dinheiro para fazê-los", disse Egerton. "E isso é sempre fatal. Não se pode escolher papéis por isso".

"Mas sinto que preciso ser menos ríspido comigo mesmo", ele prosseguiu. "Eu era um garoto de 25 anos, criado por uma mãe descasada e que nunca teve muito dinheiro. Eu queria ganhar dinheiro, não só para mim, mas para as pessoas que são importantes para mim. E por mais que eu tenha ficado insatisfeito com o resultado daqueles dois filmes, compreendo claramente porque os fiz, em retrospecto."

As coisas voltaram aos eixos com "Rocketman", um papel para o qual ele aprendeu a tocar piano e a cantar muitas das canções da trilha ao vivo.

"A voz dele como cantor é incrível", disse Dexter Fletcher, o diretor de "Rocketman". "Mas além disso ele era um ator disposto a ir ao limite, e não tinha medo de parecer tolo. Ele não sentia a necessidade de ser sempre um cara bonitão, desprovido de emoções e altamente cool."

Vaughn, que foi um dos produtores de "Rocketman", disse acreditar que o papel tenha ajudado a provar que Egerton é "capaz de interpretar literalmente qualquer personagem".

"Ele faz parte de um clube muito, muito raro", acrescentou Vaughn. "Hugh Jackman é o único outro cara que consegue genuinamente ser um astro de ação e um astro de musicais."

Foi essa versatilidade que atraiu a atenção de Lehane, que desenvolveu, roteirizou e trabalhou como produtor executivo de "Black Bird", quando ele estava à procura de um protagonista.

"Eu tinha acabado de assistir a ‘Rocketman’", ele disse, e pensei "meu Deus, o alcance desse garoto é incrível".

Egerton precisava de mais do que alcance para gravar "Black Bird"; a série também é incrivelmente pesada. Lehane disse que desenvolver uma das cenas do episódio cinco o tinha levado a chorar –a primeira vez que isso aconteceu em sua carreira como roteirista. Hauser disse que foi tão afetado por seu papel como Hall que sua vida começou a sair do controle. Ele por fim teve de fazer uma desintoxicação.

"Ser Larry Hall 12 horas por dia me levava a querer chegar em casa e comer junk food, talvez um doce com maconha", ele disse em uma conversa recente por telefone. "Era como morar em uma casa mal-assombrada".

Mas Egerton, cujo personagem serve como interlocutor para Hall quando este faz suas perturbadoras confissões, conseguiu se manter quase sempre isolado desses problemas, disseram Hauser e Lehane, apesar da cansativa filmagem em Nova Orleans, que durou seis meses.

"É uma coisa muito difícil de fazer", disse Egerton, que teve de ganhar musculatura para interpretar Keene, um sujeito robusto, antigo jogador de futebol americano na escola. "Especialmente com os dias longos, e o trabalho noturno, às vezes se torna difícil desligar. Mas você precisa encontrar um jeito".

Egerton, que trabalhou pela primeira vez como produtor executivo em "Black Bird", disse que o resultado o deixou muito orgulhoso, especialmente as cenas que fez com Ray Liotta ("Os Bons Companheiros", "Campo dos Sonhos"), que interpretou o pai de Keene. Liotta morreu em maio, e o papel parece ter sido seu último trabalho para a televisão.

"Eu amei aquele relacionamento", disse Egerton sobre os laços entre o personagem de Liotta e o seu. "Eram dois homens complicados, muito imperfeitos, muito cheios de falhas, mas existia amor verdadeiro entre eles".

"Ele tinha um lado aguçado, um lado durão", acrescentou o ator sobre Liotta, "mas também uma capacidade incrível de ser muito aberto, inocente e vulnerável".

Nos três anos transcorridos desde o lançamento de "Rocketman", Egerton fez muitos trabalhos de voz e também voltou aos palcos. Em março, ele estreou no West End, em uma remontagem de "Cock", comédia de Mike Bartlett na qual contracenava com Jonathan Bailey, astro de "Bridgerton".

Mas na noite de estreia ele desmaiou no palco na primeira apresentação e, depois de um retorno breve e bem-sucedido, recebeu um diagnóstico de Covid-19. Egerton acabou deixando o espetáculo, invocando "motivos pessoais", de acordo com os produtores.

"No final do ano passado, uma pessoa de minha família teve um câncer diagnosticado, e eu deixei o trabalho em um filme e voltei para casa para estar com essa pessoa", ele explicou. "Pensei que, com a peça, eu estava pronto para voltar ao trabalho, mas não estava. Tive de deixar o espetáculo, foi triste, e com certeza uma das decisões mais difíceis que já tive de tomar".

As coisas parecem estar de volta aos trilhos e, para o futuro, não faltam convites a Egerton para trabalhos como ator. Ele estrela como Henk Rogers, fundador da Tetris Co., em "Tetris", um filme para o serviço de streaming Apple TV+ que deve estrear este ano, e vai retomar a franquia "Kingsman".

Ele também espera suceder a Jackman no papel de Wolverine, e participou de algumas reuniões com executivos da Marvel Studios, entre os quais o presidente, Kevin Feige.

"Não acho que seja errado revelar isso", disse Egerton, rindo. "Eu fico empolgado mas também preocupado, porque o papel é tão associado a Hugh que imagino que seja muito difícil para alguém mais assumi-lo".

Ele fez uma pausa, e abriu um sorriso. "Mas, com sorte, se a oportunidade surgir, eles me darão uma oportunidade."

Tradução de Paulo Migliacci

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