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Alessandro Nivola

Alessandro Nivola Rafael Martinez/The New York Times

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Kathryn Shattuck
The New York Times

Alguma coisa pulsava na cabeça de Alessandro Nivola, 49, com intensidade cada vez maior. Era o final de 2018, e ele estava fazendo audições para o papel de Dickie Moltisanti em "The Many Saints of Newark”, prequela sobre as origens da história de “Família Soprano”, e sentiu que “tinha quase certeza de que estava no caminho certo”, disse o ator. Mas não tinha certeza sobre aonde esse caminho o levaria.

Em seguida, depois de um almoço com David Chase, criador da série, e com Alan Taylor, o diretor do filme, o roteiro completo chegou, e a importância do papel se tornou absolutamente clara. O texto revelou que Dickie era o protagonista, e Chase havia sido informado de que podia escalar quem ele quisesse para o papel. E o rumor que corria era que Chase queria Nivola, que em seus 25 anos de carreira jamais tinha sido o ator principal de um projeto dessa magnitude.

Foi quando apareceu aquela pulsação. “Era um caminho que eu tinha percorrido muitas vezes”, disse Nivola, “e tive mais decepções do que posso contar nos dedos de 10 mãos”.

Por isso, quando um mês passou sem que surgisse uma proposta formal para que ele fizesse o filme – e o ruído em sua cabeça tinha se tornado impossível de ignorar—, ele decidiu que acabaria com o próprio sofrimento. Instruiu seus agentes a ”telefonar para eles e dizer que, se não decidirem hoje, estou fora”.

Quatro horas mais tarde, em um banheiro do hotel Chateau Marmont, durante uma passagem rápida por Los Angeles, ele descobriu que faria o papel de Dickie. Nivola se trancou em um dos reservados e chorou, soluçando com uma mistura de alívio e alegria, por 10 minutos. “Chega uma hora em que você tem de fincar o pé, sabe?”, ele tinha dito ao seu pessoal.

Mas na verdade eles não haviam telefonado para os realizadores do filme. A notícia tinha surgido naquele dia por pura coincidência. Quem ouve Nivola, contar sua história pode pensar que ele sempre teve azar. Mas em uma manhã tranquila de setembro no Mulberry Street Bar, no bairro nova-iorquino de Little Italy, a impressão que ele passava era a de um homem que jamais teve tamanha sorte.

Elegante em um terno quente demais para a estação, usado para uma sessão de fotos (o estilista dele tinha levado as roupas do ator embora), ele irradiava o carisma bem apessoado de Dickie, mas sem mostrar muito de seu lado ameaçador. James Gandolfini, o Tony Soprano da série original, olhava feio do pôster acima de nós, mas era Nivola que parecia ser de fato um chefão da máfia.

“The Many Saints of Newark” foi posicionado como a história de origem de Tony, com Michael Gandolfini escalado para interpretar a versão adolescente do papel mais emblemático de seu pai. Mas o filme pertence a Dickie, um mafioso explosivo e promíscuo que consegue, apesar de desejar o contrário, transformar um garoto basicamente decente em um atormentado chefão do crime. (Em “Família Soprano”, Tony transforma Dickie, assassinado muito antes do começo da história da série, em um mito.)

Chase sempre quis fazer um filme de gângster respeitável. “Mas não temos mais Jimmy Gandolfini”, ele disse, “e ainda assim queríamos alguém que, à sua própria maneira, pudesse ser tão criminalmente inteligente e carismático”.

Dickie é mais elegante e mais bonitão, e tem mais estilo do que Tony, “mas ele carrega exatamente o mesmo conjunto de tons”, disse Taylor, “uma combinação de introspecção e de completa cegueira, raiva e arrependimento”.

O caminho que levou Nivola à família Soprano na verdade começou com o promotor público escroto que ele interpretou em “Trapaça”, um papel que impressionou Chase e o levou a tentar descobrir “quem era aquele cara, e o que ele já fez? Preciso guardar o nome dele”. “E guardei o nome dele”, disse Chase. “Quando o papel apareceu, ele me parecia o cara perfeito para fazê-lo”.

Nivola cumpria os requisitos todos: americano de origem italiana, com uma história de imigração em seu passado –o avô dele era um escultor da Sardenha que se assentou na área boêmia de Manhattan durante a Segunda Guerra Mundial, e seu pai se formou na Universidade Harvard e se tornou pesquisador na Brookings Institution– e uma compreensão inata do idioma.

“Se estamos falando de usar o italiano, palavrões ou qualquer outra coisa”, disse Chase, “ele tem o vocabulário e conhece o tom”.

Nascido em Boston e formado na Universidade Yale, depois de estudar quando criança na área rural de Vermont e de fazer o segundo grau na Phillips Exeter Academy em New Hampshire, Nivola além disso é um homem bonito.

“Não foi uma direção que tenhamos tomado em ‘Família Soprano’, mas senti que eu não podia culpar o cara por ser bonito”, disse Chase. “Ele é realmente bom ator, e eu sabia que conseguiria ser sinistro em grau suficiente”.

Para assumir as cores de “Família Soprano”, Nivola retratou um Jekyll e Hyde, um personagem que anseia ser lembrado por fazer algo de nobre mas que termina arrastado às profundezas por uma violência impulsiva que horroriza até a ele mesmo.

A interpretação dele “foi absolutamente perfeita, cada aspecto dela”, a começar das cenas de audição, disse Taylor, que se viu forçado a resistir à tentação de pedir que Nivola recriasse aquela perfeição no momento da rodagem.

Nivola vem trabalhando com esse nível de qualidade desde seu primeiro sucesso no cinema, como Pollux Troy, o irmão esquisitinho do terrorista Nicholas Cage em “A Outra Face”, de 1997. Mas depois daquilo, era como se ele estivesse vivendo na clandestinidade.

“O que sempre me atraiu foram papéis que permitiam que eu me escondesse, encontrasse um refúgio sob outra personalidade ou comportamento, que me parecessem servir como um bom disfarce”, ele disse. “Essa foi sempre a sorte e a maldição de minha carreira, até agora”.

Nivola se transformou de personagem a personagem, sem um traço de união aparente –o vocalista britânico que se torna amante da produtora de música muito mais velha em “Laurel Canyon – Rua das Tentações”, o judeu ortodoxo envolvido em um triângulo amoroso em “Desobediência”, o sensei lunático de “A Arte da Autodefesa”.

Mas ao longo do caminho, a decepção quanto a filmes que fracassaram ou nem foram lançados, e o incômodo com a obrigação de ter de provar repetidamente o seu talento –isso já não está claro?– terminaram lhe causando nervosismo e depressão paralisantes. Por fim, ele começou a se sentir tão desconfortável nas audições que fazia que desistiu de fazê-las.

“Meus amigos que faziam mais sucesso eram sempre incansavelmente positivos”, disse Nivola, mencionando sua mulher, a atriz e diretora Emily Mortimer, e o colega Ethan Hawke. “Tento ser mais parecido com eles, mas minha natureza não é essa”.

E aí apareceram David Russell, e “Trapaça”. Depois de uma humilhante pausa de sete anos em que ele parou de fazer audições mas também deixou de conseguir papéis muito desejados, Nivola decidiu que competiria pelo trabalho.

O ator tinha começado a reavaliar as pessoas com quem desejava trabalhar, e passou a preferir colaborar com grandes diretores, em lugar de procurar grandes papéis. Mas o estilo idiossincrático de Russell –que escreve o roteiro mas no meio da filmagem grita novas linhas de diálogo para que os atores as incluam na cena– fez com que Nivola sentisse ter perdido de vez o controle, o que ele descobriu ser uma oportunidade.

“Foi um grande ponto de inflexão para mim, porque entreguei completamente as rédeas a ele”, disse o ator. “E, daquele momento em diante, eu quis dar a cada diretor com que trabalho o mesmo poder”.

O que quer que tivesse levado Nivola a hesitar ou pensar demais em trabalhos anteriores, Russell viu substituído por uma “inventividade entusiástica”, afirmou o diretor em um email. “Acho que ele é capaz de quase qualquer coisa. É um cara destemido. Pega o que escrevi e toma posse. Confiamos um no outro, o que permite riscos e muita diversão”.

“Trapaça” também foi o primeiro filme que Nivola fez com Robert De Niro, a quem ele vê como mentor. “Bem, ele talvez não se descreva assim, mas insisto nessa definição”, afirmou o ator, rindo.

Foi a ver a maneira como De Niro se movimenta em cena que afetou Nivola mais do que qualquer outra experiência. (Eles trabalharam juntos em “O Mago das Mentiras”, com De Niro no papel de Bernie Madoff e Nivola interpretando seu filho, Mark.) Nivola começou a aprender seu diálogo o mais cedo possível, para poder se desvencilhar das palavras. Passou a repetir frases no meio das cenas, como se estivesse retomando o diálogo, até esquecer que estava atuando.

“É quase como se ele fosse um músico e não alguém dizendo um texto”, disse Taylor –mesmo que isso faça com que a equipe tenha de correr com a câmera quando ele repentinamente recomeça uma cena. O diretor acrescentou que “muitas vezes, o que surge da terceira versão dele para uma cena é aquilo que ele procurava, e realmente funciona, funciona mesmo”.

Em setembro, um dia depois da estreia de “The Many Saints of Newark” no Beacon Theater, Nivola, fiel aos seus hábitos, parecia entusiasmado mas cauteloso. Críticos do IndieWire, CNN e outros veículos destacaram seu desempenho, com expressões como “ absolutamente brilhante” e “ fascinante”.

“Essas foram as melhores críticas que já tive por um trabalho, até agora”, ele escreveu em um email, acrescentando que “estou tentando não dar importância demais a elas”.

Na entrevista em Mulberry Street, Nivola havia dado a entender que seu momento de brilho não tinha surgido repentinamente —não mesmo. “Para ser honesto, no período que me conduziu a essa oportunidade, minha sensação intangível era que algo desse tipo estava fervilhando”, ele disse, hesitantemente.

Mas, diferentemente de Dickie, ele não parece disposto a apostar em seu futuro. “Jamais vou pensar nesse filme como sucesso até que isso fique comprovado”, ele acrescentou.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo ​Migliacci. ​

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