Noivos de 95 anos decidem se casar nos EUA: 'Deixei de ser solitário'
Casal se conheceu em 2019 e oficializou a relação em 2021
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Joy Morrow-Nulton mantém um diário, mas não precisou consultá-lo para se lembrar da data de seu primeiro almoço com John Shults Jr., no interior do estado de Nova York. “Foi em 14 de maio de 2019, no restaurante A Slice of Italy”, disse Morrow-Nulton, 95. Ela não se lembra dos detalhes específicos da conversa, porque estava entediada. Mas dois anos depois, ela está contente por ter fingido interesse, e persistido.
“Espero chegar aos 100 anos, para termos cinco anos juntos”, disse Morrow-Nulton pouco depois de sua cerimônia de casamento com Shults, em Ulster, Nova York, no dia 22 de maio. “É uma delícia conviver com ele”. O filho dela, John Morrow, 69, sabia bem disso antes de se tornar o casamenteiro que aproximou a mãe de seu novo parceiro.
Morrow-Nulton e Shults nasceram em maio de 1926. Quando Morrow os apresentou, eles sabiam que suas idades eram próximas, mas não que suas vidas os haviam colocado a bordo do mesmo barco: os dois enviuvaram duas vezes, depois de mais de 60 anos de casamento.
E os dois viviam sozinhos em suas casas, a dela em Tillson, Nova York, e a dele na vizinha Hurley. Os dois também tinham o hábito de atormentar Morrow, que conhece Shults desde 1976, por mais tempo em sua companhia. “John tem muita influência, e sempre gostou de visitas dos amigos”, disse Morrow.
A amizade entre eles surgiu depois que Morrow comprou equipamentos para abrir sua empresa, a Safeco Alarm Systems, de Shults, empresário cujos negócios na região de Ulster incluem a Canfield Supply, que fornece material elétrico e de encanamento.
Shults se aposentou em 2000. Mas anos depois, “ele ainda me ligava e me convidava para almoçar”, disse Morrow. “Começamos a nos encontrar toda terça-feira”. Ele conta que sua mãe, também, insistia em que ele a visitasse mais vezes. “Você sabe como são as mães”.
Morrow convidou a mãe para acompanhá-los em um almoço no A Slice of Italy, em Kingston, quando Shults mencionou que ele estava fazendo 93 anos. “Meu filho disse a John que eu também estava fazendo 93 anos”, disse Morrow-Nulton. “E por isso eles decidiram me convidar para o almoço”.
Ela não achava que ficaria entediada. Mas “eles só falavam sobre negócios”, ela disse. “John estava conversando só com meu filho, do outro lado da mesa”. “Ela era uma graça, isso eu posso dizer”, afirmou Shults. “E esperta, e tinha um senso de humor delicioso. E sorriu para mim”. A despeito de toda a conversa sobre negócios, ela também gostou de Shults.
Quando Shults a convidou para um almoço, por intermédio de Morrow, algumas semanas mais tarde em Rosendale, Nova York, ela aceitou, e descobriu que Shults tinha muito mais assunto do que material elétrico. Os dois tinham elos fortes com suas comunidades. Shults era membro do Kingston Kiwanis Club há mais de 60 anos, e Morrow-Nulton foi professora primária em Rosendale até se aposentar, em 1986.
“Nos meus últimos 20 anos de trabalho, dei aulas de pré-primário”, disse Morrow-Nulton. “Às vezes encontro ex-alunos que já estão com 50 anos, e o surpreendente é que eles me reconhecem”.
Os dois também são ativos em suas igrejas, ela na Tillson Community Church e ele na Cross Point Fellowship Baptist Church, em Hurley. E os dois têm o hábito de pedir que a assistente digital Amazon Alexa encontre música da década de 1940 para eles.
“Gostamos de Perry Como e da 101 Strings Orchestra”, disse Shults. “E agora temos um novo favorito: Vince Guaraldi. Um pianista fantástico”.
Se Morrow-Nulton não tinha certeza de que estava sendo cortejada no primeiro almoço que o casal teve sem a presença de Morrow, ela não demorou a perceber que Shults tinha a intenção de continuar saindo com ela, ao final de mais alguns encontros.
“Ele começou a me convidar para almoçar todos os dias”, disse Morrow-Nulton. “Percebi que ele estava apaixonado. Ele ligava e perguntava o que íamos comer no almoço, e onde iríamos naquele dia”. Ela dirigia. Shults conta que “meus filhos tiraram minha carteira de habilitação porque sofri três derrames e quebrei a bacia’.
“Eu o levei a todos os restaurantes em Rosendale, exceto um”, disse Morrow-Nulton. A exceção era o 1850 Inn House and Tavern, que só estava aberto para o jantar nos dias em que eles saíam. A cautela ditava que seus encontros acontecessem apenas durante o dia. “Não é que eu não possa dirigir à noite”, ela disse. Mas Morrow-Nulton se preocupa com a possibilidade de perder sua carteira de habilitação. “Amo dirigir”, ela disse. “E calculo que, se fosse sofrer um acidente, isso aconteceria à noite. E eles adorariam tirar a licença de alguém com mais de 90 anos”.
Pelo final de 2019, Morrow-Nulton e Shults já tinham se tornado um casal, com uma rotina diária que se estendia até os finais de tarde. Nos dias de bom tempo, eles iam ao Robert Post Park, em Ulster, para ver os barcos deslizando pelo rio Hudson. A solidão e isolamento que os dois afirmavam sentir antes de seu encontro desapareceram.
“Fico muito feliz por eles terem se aproximado e por desfrutarem da companhia um do outro”, disse Morrow. “Pode apostar que todo mundo ficou feliz por eu ter encontrado alguém, na minha idade”, disse Shults. Os dois sentem que, sem a companhia do outro, a vida parece vazia.
Morrow-Nulton nasceu em Mount Kisco, Nova York, e cresceu em White Plains. Ela e seu primeiro marido, Robert Morrow se casaram em 1949 e tiveram dois filhos, John e Melanie. Robert Morrow morreu em 1984. O segundo marido dela, Thomas Nulton, com quem Joy se casou em 1986, morreu em 2017.
Shults nasceu em Phoenixville, Pensilvânia, e se casou com Elizabeth Salzmann Shults em 1956. Ela morreu em 1997. Os três filhos do casal são John 3º, Elizabeth e Barbara. Em 1999, Shults se casou com Mary Fuller Shults, que morreu em 2017. Os dois têm dificuldades para se lembrar de todos os detalhes sobre suas famílias. “Temos um excesso de ancestrais”, disse Morrow-Nulton.
Os três netos e cinco bisnetos de Morrow-Nulton estão espalhados pelos Estados Unidos. Os 10 netos e cinco bisnetos de Shults também vivem dispersos. Dois dos filhos dele, porém, vivem por perto. John Shults 3º, conhecido pelo apelido Pete, é pastor da igreja Cross Point Fellowship e vive a duas casas de distância do pai. Barbara Loughran vive a quatro quarteirões de distância.
“Eles não o deixam abandonado”, disse Morrow-Nulton. “Fazem muita companhia a ele”. Era algo muito visível no começo da pandemia, quando a vida se tornou assustadora para todo mundo, mas especialmente para as pessoas mais velhas.
“Quando veio a Covid-19, tentamos escapar dela”, disse Morrow-Nulton. Em lugar de saírem para almoçar, “nós comíamos na casa dele com frequência. As netas dele compravam nosso almoço, e nós comíamos na sala de jantar”. Pelo final de fevereiro, os dois já estavam vacinados. E noivos.
Morrow-Nulton acha que anotou a data do noivado em seu diário, mas nenhum dos dois se lembra do dia exato. “É como nosso primeiro beijo”, disse Shults. “Não me importa quando aconteceu, mas sim que tenha acontecido”.
A estratégia dele para conseguir que Morrow-Nulton aceitasse seu pedido de casamento foi a mesma que Shults adotou para incentivá-la a aceitar a rotina de almoços diários. “Eu a aporrinhei por quase um ano. E ela respondia sempre que não, não, não”.
A relutância de Morrow-Nulton em aceitar as propostas, que por fim começaram a acontecer todos os dias, da mesma forma que os convites para almoço, não era por falta de afeto por Shults. Ou pela esperança de que alguém melhor aparecesse.
“Não há muitos homens da minha idade, é verdade”, ela disse. “E mesmo que os dois tenhamos 95 anos, sou 12 dias mais velha. Uma das minhas amigas disse: ‘Joy, você é uma cougar’”. A cautela dela quanto a se casar era puramente prática.
“Eu tinha uma casa para cuidar, e não tinha certeza de que queria ajudar a tomar conta de alguém”, ela disse. “E, sejamos honestos: nem eu e nem ele estamos na melhor forma para andar por aí”. Shults usa um andador, e Morrow-Nulton uma bengala. Mas o inverno a fez mudar de ideia.
“Tivemos um dia de neve e não pude sair de carro para visitá-lo. Fiquei com saudade”, ela disse. Pela metade de fevereiro, “eu enfim decidi que era melhor dizer sim. Nós nos divertimos juntos. Ele é diferente de qualquer pessoa que eu tenha conhecido antes”.
O casamento deles, dia 22 de maio na Cross Point Fellowship Baptist Church, teve 50 convidados. Morrow-Nulton, levada ao altar pelo filho John, usou uma blusa cor de rosa de cetim que havia vestido para o casamento de um neto; Shults usou calças de linho e um blazer azul escuro. O pastor Pete Shults oficiou a cerimônia, o que levou pai e filho às lágrimas.
“Foi na parte em que ele disse ‘até que a morte os separe’”, disse Shults. “Fiquei com a voz embargada”. Uma recepção em um pavilhão do Robert Post Park celebrou os casamentos e o 95º aniversário dos dois. Enquanto familiares tiravam fotos, o casal estava sentado de mãos dadas em um banco de piquenique.
“Ninguém começa uma vida aos 95 anos”, disse Morrow-Nulton. “Mas foi o que fizemos”. “Deixei de ser solitário”, disse Shults. Ainda melhor, “não acho que enjoaremos um do outro”.
Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci