Como Whindersson Nunes, pessoas relatam tristeza e isolamento na depressão; saiba mais
Especialistas dão dicas de como identificar e tratar a doença
Tristeza, angústia, pouca vontade de viver. Essas são algumas das palavras que estavam em um vídeo divulgado pelo humorista Whindersson Nunes, 24, há cerca de três meses, antes de confirmar que estava enfrentando uma depressão. Nos últimos dias, sua mulher, a cantora Luísa Sonza, 20, afirmou que já via sinais da doença há anos.
“É uma doença silenciosa, que pode pegar qualquer pessoa. Você pode estar bem financeiramente, com a família ótima e, de repente, não tem mais vontade de fazer as coisas, não tem ânimo, fica cansado rapidamente, não tem vontade de sair da cama de manhã”, explica Marina Vasconcellos, psicóloga e terapeuta de casal e familiar.
Foram esses os sintomas que a confeiteira Simone Heloísa Castilho, 46, começou a sentir há cerca de sete anos. Ela conta que passou a se isolar, passava longos períodos na cama e saia de casa apenas para trabalhar —e por que era obrigada. Até o cuidado da filha mais velha, na época com 13 anos, ela diz que começou a negligenciar.
“Eu estava em um relacionamento abusivo na época, demorei para perceber que o que sentia era depressão”, diz Castilho, que acabou tendo crises ainda piores antes de procurar ajuda. “Melhorou, mas tudo [os sintomas] voltou com a morte da minha mãe dois anos depois. Tive falta de ar, dor no peito, comecei a achar que tinha problema do coração”.
Foi só em 2015, após uma nova recaída, que Castilho procurou ajuda profissional. Já havia perdido o emprego na área de marketing e, sem plano de saúde, recorreu ao postinho do bairro em que mora, em São Bernardo do Campo, na Grande SP. Iniciou então a terapia e o acompanhamento psiquiátrico, após “desabar com uma médica”.
Especialistas afirmam que o tratamento tardio não é incomum e pode acontecer por vários motivos. Os próprios sintomas da doença podem aparecer de formas variadas e, eventualmente, serem camuflados. Também pode haver confusão entre tristeza momentânea e depressão, ou ainda preconceito do paciente ou amigos na hora de procurar um psiquiatra.
Segundo Vasconcelos, apesar de haver sintomas clássicos, a depressão pode se manifestar de várias formas, o que atrapalha o diagnóstico. Enquanto, em algumas pessoas, a doença provoca insônia, em outras ela pode causar longos períodos de sono. O mesmo acontece com o apetite, que pode aumentar ou diminuir a depender do paciente.
Há ainda casos de depressão sorridente. A psiquiatra e psicoterapeuta Lívia de Lima Basse explica que nem todo mundo que está deprimido chora o tempo inteiro. Ela cita como exemplo o caso do vocalista do Linkin Park, Chester Bennington, que se matou em 2017. "Há foto do mesmo dia de sua morte em que ele está sorrindo. Ele não tinha sintomas clássicos. É uma depressão atípica.”
Entre os variados sintomas, a OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta que, entre os anos de 2005 e 2015, aumentou em 18% o número de pessoas que vivem com depressão em todo o mundo, chegando a 322 milhões. No Brasil, a doença atinge 5,8% da população, segundo o último relatório do órgão divulgado em 2017.
Dicas para regular o humor*
> Alimentos ricos em ômega 3, como salmão, atum, nozes, sementes de chia e linhaça, couve, brócolis, entre outros
> Alimentos ricos em vitamina B, como salmão, fígado, feijão, ovos, batata, abacate, banana, leite, entre outros
> Prática de atividades físicas, por conta da liberação de endorfina, o hormônico que provoca sentimento de prazer e bem-estar
> Atividades de lazer e meditação são recomendadas como forma de evitar estresse e aumentar o autoconhecimento
Tratamento e seus tabus
As dicas podem ajudar a regular o humor a combater a depressão, mas especialistas alertam que eles não substituem um tratamento com especialista. É necessário procurar um psicoterapeuta, que poderá encaminhar o paciente ainda para um psiquiatra. Em alguns casos, é recomendado o uso de medicamentos, mas é preciso quebrar alguns tabus: antidepressivo não causa dependência, nem serão, necessariamente, usados a vida toda.
EXTERNOS OU INTERNOS
Assim como os sintomas, as causas da depressão também são muitas. Ela pode ser desencadeada por eventos externos, como um relacionamento abusivo ou a perda da mãe, mas também pode ser uma reação endógena, sem motivo aparente, uma espécie de “desequilíbrio do cérebro”, segundo Vasconcelos.
Whindersson Nunes, por exemplo, já vinha mostrando alguns sintomas clássicos da doença, mas foi após um período de estresse, com uma série de 40 shows em quatro continentes, que as coisas pioraram e fizeram com que ele mesmo percebesse que não estava bem. "Um alívio" para Luísa Sonza, que diz que só aí ele aceitou buscar ajuda.
Mas também existe o fator hereditário que pode desencadear a depressão e que, segundo especialistas, chega a ser de 40% a 50% em caso de parentes de primeiro grau. Isso não quer dizer, necessariamente, que o filho de uma pessoa depressiva desenvolverá os sintomas, mas é bom ficar atento, afirma Basse, por que há sim mais chance dessas pessoas terem depressão.
Solange Regina Negri Vicentini, 55, que enfrenta a depressão há 35 anos, acredita estar entre as pessoas com depressão trazida de pai para filho, no caso dela a mãe. “Minha mãe tomava ansiolítico, mas não teve diagnóstico de depressão. Acho que não era comum na época, psiquiatra era ligado a loucura, mas olhando hoje o sintoma bate muito com a minha mãe e minha avó”.
Vicentini por outro lado foi diagnosticada com depressão desde o início dos sintomas, em 1984, após o nascimento da primeira filha. “Era uma coisa meio estranha, uma aflição, um medo, ela chorava, eu chorava junto. Meu obstetra falou que poderia ser depressão pós-parto, mas na época não tomei remédio nenhum, passou”.
Novas recaídas, no entanto, aconteceram nos anos seguintes, com sintomas ainda piores. Vicentini conta que ainda nos anos 1980 chegou ao ponto de não conseguir comer ou dormir direito por 15 dias. Já nos anos 2000, chegou a ter crises de falta de ar, ataque de pânico. “Não conseguia dormir, me concentrar, vivia em alerta”, resume.
Vicentini segue o tratamento com medicação ainda hoje, em decorrência da última reincidência da depressão, ocorrida em 2014, durante tratamento contra um câncer de mama, e diz estar ciente que, em alguns casos, o tratamento é para o resto da vida. “Como se fosse uma diabetes. Tem tomar remédio pra sempre”, compara ela.
FRESCURA E IGNORÂNCIA
Complexa em suas causas e sintomas, a depressão não fica simples na hora do tratamento, que também acontece de várias formas. Há pessoas que melhoram apenas com uma mudança de vida, outras com um psicólogo que as faça se conhecer um pouco mais, mas, como Vicentini, há quem precisa de medicamento.
“É um conjunto, mas o mais importante é ter uma boa avaliação, procurar um bom especialista. Nem todo mundo que está deprimido precisa de medicação, mas grande parte pode precisar sim. Aí é bom a gente quebrar alguns tabus: antidepressivo não causa dependência, nem será, necessariamente, usado a vida toda”, afirma Basse.
Vicentini, que continua a se tratar com remédio, diz que o problema às vezes é o preconceito. Não apenas o que relaciona o tratamento psiquiátrico à loucura, mas também o que relaciona a patologia com a busca por atenção.
“É frescura, eles dizem, coisa de quem não tem o que fazer. Falam pra ir igreja que cura. Mas não me afeta mais, é ignorância.”
O primeiro passo é procurar um psicólogo. A partir daí, o paciente pode ser indicado a um psiquiatra, a depender da necessidade.
Algumas pequenas mudanças no estilo de vida também podem ajudar no tratamento, como fazer atividade física, que libera endorfina, hormônio associado ao bem-estar, meditação, e priorizar alimentos que ajudam na regulação do humor, em especial os ricos em ômega 3 ou em vitamina B.
Essas mudanças, no entanto, não substituem o tratamento psicológico e psiquiátrico quando necessário. Castilho, que abandonou os remédios e o acompanhamento médico, encontrou melhora com “muita atividade física” e diz que hoje está 75% melhor. Ainda assim, pretende retomar o tratamento com especialistas no segundo semestre.
Fonte: Marina Vasconcellos, psicóloga e terapeuta de casal e familiar, e Lívia de Lima Basse, psiquiatra e psicoterapeuta