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'Pantanal': Não esperava que existissem peões gays, admite Silvero Pereira

Ator interpreta mordomo que sofreu com homofobia; trama terá uma reviravolta

Silvero Pereira como Zaqueu em 'Pantanal' - Divulgação/TV Globo/João Miguel Júnior

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Rio de Janeiro

Ser um dos peões mais competentes de José Leôncio (Marcos Palmeira) em "Pantanal" vai ser agora o foco de Zaqueu na sua volta à trama. O ex-mordomo da família Novaes saiu de cena após ser vítima de homofobia por parte dos funcionários da fazenda e reaparece por lá nos próximos capítulos. Um retorno ansiosamente aguardado por Silvero Pereira, 40. Ele concedeu a seguinte entrevista ao F5:

Você assistiu à primeira versão de 'Pantanal'? Qual é a sua maior lembrança daquele tempo?
Eu tinha oito anos e tenho algumas lembranças. Recentemente, eu voltei a ver a novela e fui só até o capítulo que o Zaqueu, interpretado magistralmente por João Alberto Pinheiro (1960-1992), chega à fazenda. Parei ali porque fiquei com medo de me sentir influenciado pela atuação do meu colega.

Na primeira versão, Zaqueu era mais caricatural, não?
Sim. Me lembro até que eu senti uma rejeição ao personagem. Me identificava com o Zaqueu pela situação que ele vivia e pelo bullying que ele passava na trama. Ver aquele personagem me deu a sensação de que eu não queria passar por aquilo na vida, entende?

Com oito anos de idade você já sabia sobre a sua orientação sexual?
Desde muito pequeno entendia que não me encaixava nos padrões de masculinidade que a sociedade tentava me colocar.

Zaqueu deixou a fazenda depois de sofrer com o preconceito, e agora ele vai voltar. Como será esse retorno?
Nesse primeiro momento, ele é acolhido por todo mundo e vai ter até uma roda de viola em sua homenagem. Isso tudo acontece depois de uma conversa entre José Leôncio [Marcos Palmeira] e os peões. Meu personagem chega mais confiante, disposto a se adaptar àquele ambiente. Ele decide conhecer outras formas de trabalho, como a lida e o trato com os animais.

Ele vai se dar bem?
O Zaqueu vai passar a estar mais entre os peões, vai se envolver com eles e achar interessante aquela vida. Ele vai querer se tornar um grande peão e a partir daí a função dele será mostrar e provar para o Zé Leôncio que ele pode ser um peão exemplar.

Como foi o seu contato com a vida na fazenda?
Nunca tinha andado a cavalo. Aprendi um pouco antes viajar para o Pantanal (risos). Tive quatro aulas e os primeiros momentos de gravações no set mesmo foram assustadores.

O que aconteceu?
O cavalo de uma escola é completamente diferente. Lá na fazenda, no Pantanal, o animal tem outra maneira de cavalgar. Ele é mais livre, mais selvagem, e eu passei por alguns momentos que o cavalo não me obedecia de jeito nenhum (risos). Quando não tinha essa relação entre o cavalo com o ator, a produção trocava o animal até encontrar um que estabelecesse uma relação. Também me vi no meio de 300 bois e lidando com todos eles e foi uma experiência incrível.

O meio sertanejo é um meio ainda bem machista. Você acha que os peões de verdade poderiam rejeitar o seu personagem?
Profissionalismo e competência não têm nada a ver com diversidade, gênero e orientação sexual. O que precisa ter é o respeito. Nos 45 dias em que eu estive no Pantanal, conversei com alguns peões e eles me contaram da existência de peões gays na lida real. Me contaram que eles eram extremamente profissionais e iguais a qualquer outro peão.

Ficou surpreso com essa informação?
Sim. Não esperava que existissem peões gays porque achava que era um meio mais fechado, mais preconceituoso, e não é nada disso. Me senti aliviado e acolhido. Foi muito agradável.

Na primeira versão, Zaqueu se apaixona pelo Alcides (Juliano Cazarré), mas é uma paixão que não dá em nada. O que vai acontecer agora?
O Zaqueu e o Alcides vão ter uma relação de amizade profunda. Existe uma discussão nessa nova versão entre a gente [produção], que se não for para existir o amor real, não vai existir essa história de amor platônico. Afinal de contas, 30 anos se passaram e não dá mais para ter uma bicha envolvida em um relacionamento impossível na teledramaturgia. Se não vai acontecer, que seja de fato uma amizade e pronto. Lógico que a gente pretende brincar com o telespectador nessa perspectiva de que tem uma paixão ali, mas não tem essa de amor platônico.

Pantanal é a sua segunda novela [ a primeira foi A Força do Querer] e mais um vez você interpreta um personagem homossexual. Não teme ficar estigmatizado?
Confesso que dentro da teledramaturgia e sendo o meu segundo trabalho seguido nessa linha [Nonato e Zaqueu], isso me deixa preocupado. Não posso negar a minha responsabilidade porque, de fato, eu contribuo direto e indiretamente para a minha comunidade. Mas tenho medo de ficar estigmatizado na teledramaturgia, sim. De fato, eu sempre espero e gostaria muito fazer um personagem que não tivesse nada a ver com a minha sexualidade.

No cinema você recentemente interpretou alguém bem diferente do Silvero da vida real.
Sim, acabei de fazer um filme com a Cleo Pires, 'Me Tira da Mira'. Meu personagem é completamente fora desse viés que as pessoas me colocam. Interpretei um galã vilão e era tudo que eu queria fazer.

Você tinha ideia da repercussão de "Pantanal"?
Eu tive porque cheguei depois. O pessoal gravou a primeira fase, veio para o Rio, foi para a segunda fase, e só aí eu entrei. Quase seis meses depois eu comecei a gravar em estúdio. Estava acompanhando de fora e tinha uma noção maior; lá no Pantanal a gente ficou sabendo pelas redes sociais. As buscas nas redes sociais cresceram de forma gigantesca. Absurda. As pessoas têm a curiosidade em saber para além da novela. As nossas vidas viraram um reality show (risos).

E os haters? Continuam te atacando nas redes?
Diminuiu bastante, mas eu não dou muita atenção e tento me blindar. Sei de ferramentas na redes sociais que impedem e você pode até censurar algumas palavras, mas deixo. Tento dialogar com esses haters. Quando não tem jeito, excluo e sigo a minha vida.

No seu Instagram você postou a seguinte frase: 'Deus me livre do cidadão de bem"...
Deus me livre! Infelizmente, a gente chegou a esse ponto, e seria ótimo que a nossa sociedade tivesse mesmo os cidadãos de bem. O conceito, hoje, de cidadão de bem é um cidadão perigoso. Foi construído erroneamente nos últimos tempos e a gente sabe muito bem. Precisamos interromper esse processo.