Veja trilhas sonoras que fizeram sucesso em novelas de Gilberto Braga
Autor ouvia músicas para ter inspiração
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O universo da música sempre inspirou o autor Gilberto Braga, morto nesta terça-feira (26) aos 75 anos. Ele escolhia grande parte das trilhas sonoras de suas novelas e escrevia ao som dos temas dos personagens. São trilhas que marcaram gerações noveleiras e, assim como muitos personagens criados pelo autor, viraram ícones da teledramaturgia brasileira.
Mas nem sempre foi do jeito que ele gostaria. Em entrevista à Folha em 2001, Braga criticou a trilha de "Escrava Isaura", novela de 1976 protagonizada por Lucélia Santos e que se tornou uma das obras mais vendidas no mercado internacional.
"Eu não tive a menor participação. Aliás, acho bastante cacete aquele tema principal, 'nascer negro é difícil, é difícil como o quê. Que Caymmi me desculpe, porque estou desconfiado que é dele, feito de encomenda pra novela, mas não gosto. Caymmi é um gênio, mas aquele 'nascer negro é difícil' eu não curto", disse.
Com o refrão "lerê, lerê", "Retirantes", canção de Caymmi, até hoje é associada à escravidão.
A trilha de "Escrava Isaura" era formada por canções inéditas, com exceção de "Banzo", composta pelo maestro Eckel e gravada pelo conjunto Os Tincoãs.
As escolhas musicais para "Dancin'Days", novela que marcou a estreia de Braga no horário nobre da Globo, em 1978, também não agradaram ao exigente e ácido autor.
"Não tive participação alguma. Apenas pedi 'Copacabana', pelo Dick Farney", contou à Folha. "O disco não servia à novela, tanto que foi preciso lançarem um single na metade do caminho com 'Outra Vez', por Roberto Carlos. Não havia romantismo na trilha".
O tema de abertura da novela, no entanto, fez sucesso e impulsionou a moda da discoteca e das meias Lurex no país. Era a animada "Dancin’ Days", interpretada pelas Frenéticas.
Aqui, uma curiosidade: o grupo As Frenéticas foi formado por atrizes e cantoras que trabalhavam como garçonetes na discoteca do jornalista e produtor musical Nelson Motta. Ensaiadas por Roberto de Carvalho, elas estrearam como artistas no palco da casa noturna e conquistaram o público.
"O Roberto fez essa missão quase impossível: ensaiou seis loucas", contou Motta em entrevista recente a Pedro Bial.
Com sucessos como "Macho Man", do Village People, e "Dancin’ Days Medley", a trilha internacional da novela vendeu quase um milhão de cópias, segundo o site Memória Globo.
É de "Dancin’ Days" a cena inesquecível e libertária em que Sônia Braga, intérprete da ex-presidiária Júlia Matos, dança na pista da discoteca ao lado de Paulette, do Dzi Croquettes.
Em "Água Viva", de 1980, coautoria de Braga e Manoel Carlos a partir do capítulo 57, a trilha nacional foi formada por medalhões, que interpretaram clássicos da MPB, como Gal Costa ("Noites Cariocas"), Elis Regina ("Altos e Baixos"), Gilberto Gil ("Realce"), Maria Bethânia ("Grito de Alerta"), Angela Ro Ro ("Amor, Meu Grande Amor"), João Gilberto ("Wave") e Milton Nascimento ("Cais").
De Caetano Veloso, o tema de abertura, "Menino do Rio", na voz de Baby do Brasil (Consuelo, na época), é praticamente um hino carioca.
A novela seguinte, "Brilhante", de 1981, não deixou por menos. "Luiza", de Tom Jobim, foi composta especialmente para a personagem de Vera Fischer.
Também em "Brilhante" está "Me deixas louca", o último grande sucesso de Elis Regina, morta em janeiro de 1982, aos 36 anos, quando a novela ainda estava no ar.
Quem é noveleiro-raiz vai lembrar: a última cena de Vera Fischer ao lado de Tarcísio Meira é uma homenagem à cantora. "Esse disco foi o primeiro que nós ouvimos juntos", diz Luiza (Vera) ao par romântico, ao som de ""Me deixas louca". "Ela estava viva ainda. Uma morte tão triste. Uma artista maravilhosa, tão jovem".
Tom Jobim voltou a ter uma canção como tema de novela em "O dono do mundo", de 1992. Ao som de "Querida", a abertura mostrava uma das cenas do filme "O Grande Ditador", em que Charles Chaplin satiriza Hitler ao dançar com um globo terrestre.
De "Vale Tudo" (1988-1989), "Brasil", interpretada por Gal Costa e composta por Cazuza, Nilo Romero e George Israel, até hoje é associada a protestos contra a corrupção. Cazuza também está na trilha nacional com "Faz parte do meu show", tema da jornalista Solange (Lídia Brondi).
Segundo o autor, em entrevista de 2007 ao jornal O Tempo, a canção "Isto aqui o que é", de Ary Barroso, o ajudou a criar Raquel, a heroína vivida por Regina Duarte na novela.
Na trilha internacional, a elegante "Il Faut Savoir", de Charles Aznavour, foi a canção escolhida para a super-vilã Odete Roitman, que adorava menosprezar o Brasil.
São caprichadas também as trilhas das duas séries memoráveis de Gilberto Braga, "Anos Dourados" (1986) e "Anos Rebeldes" (1992). Na primeira, a produção musical foi do próprio autor, com uma novidade: as canções eram definidas para as cenas e não para os personagens.
Mais uma vez Tom Jobim, dessa vez ao lado de Chico Buarque, está na abertura, com "Anos Dourados". Segundo o site Memória Globo, Jobim, que era fã de Malu Mader, exigiu que a atriz estivesse presente quando foi apresentar a melodia para o autor. Malu interpretou a reprimida Lurdinha na série.
Em "Anos Rebeldes", a abertura é de Caetano Veloso, com "Alegria, Alegria", marco do tropicalismo na década de 1960. No ar no período em que o ex-presidente Fernando Collor de Mello era acusado de corrupção, "Alegria, Alegria" voltou a ser cantada por jovens em protestos dos caras pintadas nas ruas.
Cássio Gabus Mendes, o rebelde João Alfredo na série, foi um dos artistas a lamentar a morte de Gilberto Braga nesta terça.
"Que tristeza. Querido Gilberto, descanse na luz e na paz. Muito obrigado por tudo", escreveu.