Tony Goes

Queda de Dony de Nuccio faz a Globo rever suas regras

Vários jornalistas da casa fazem trabalhos que podem ser considerados propaganda

Dony De Nuccio - Instagram/donydenuccio
São Paulo

Poucas vezes se viu no telejornalismo brasileiro uma carreira tão meteórica quanto a de Dony de Nuccio. Meros seis anos depois de ingressar na Globo, ele assumia a bancada do “Hoje”, o noticiário vespertino da emissora, substituindo Evaristo Costa. Não tardaram a circular rumores de que Nuccio também seria o provável sucessor de William Bonner no “Jornal Nacional”.

Mas sua queda também foi meteórica. Bastou o site “Notícias da TV” revelar que a produtora de Nuccio havia faturado mais de R$ 7 milhões produzindo conteúdo interno para o Bradesco – basicamente, vídeos de comunicação interna estrelados pelo próprio Nuccio – para o jornalista se ver forçado a pedir demissão.

Como a maioria das empresas de mídia, a Globo proíbe seus jornalistas de fazer propaganda. A razão é óbvia: um profissional da área não pode alugar sua isenção e credibilidade para terceiros. Só quando se bandearam para o entretenimento é que nomes como Fátima Bernardes e Tiago Leifert foram autorizados a estrelar campanhas publicitárias.

Mas o que Dony de Nuccio fez pode ser considerado propaganda? Ele não apareceu na TV cantando as vantagens do banco, nem em banners na internet. O material que sua produtora Prime Talk produzia para o Bradesco era para consumo interno do Bradesco: basicamente, vídeos de treinamento e palestras para funcionários. O grande público jamais veria essas peças.



A Globo sempre tolerou esse tipo de trabalho. As estrelas do jornalismo da casa são figuras frequentes em eventos corporativos de outras empresas. A regra era mais ou menos clara: se estiver longe dos olhos do espectador, o profissional pode muito bem faturar uns trocados a mais.

Digo “mais ou menos” por que há mesmo uma zona de sombra nessa regra. A revista Veja revelou nesta quinta (1º) que Renata Vasconcellos e Rodrigo Bocardi também já apareceram em peças internas do Bradesco. Se alguém for atrás, irá descobrir que praticamente todos os âncoras da casa já emprestaram suas imagens a materiais que, a grosso modo, podem ser chamados de publicitários.

Aparentemente, o problema com Nuccio é que seu envolvimento com essas peças ia muito além da simples participação. Sua produtora Prime Talk tem cerca de 30 funcionários, que desenvolvem campanhas inteiras para clientes corporativos. E seu sócio é o jornalista Samy Dana, especializado em economia, que também acaba de ser afastado da Globo.

A própria emissora reconhece que precisa rever seus regulamentos e estabelecer uma fronteira mais nítida entre o que é ou não é aceitável. O jornalismo da Globo já é alvo de todo tipo de ataque: não pode deixar aberto esse flanco. 

Mas também precisa se adequar aos tempos que correm. O próprio conceito de propaganda não é mais o que já foi um dia. Hoje ele incorpora novidades como o branded content, o storytelling e as chamadas “experiências”, que vão muito além do comercial de 30 segundos.

E o que será que vai acontecer com Dony de Nuccio? Ele talvez perca o contrato também com o Bradesco: fora da Globo, seu valor para o banco despenca como o de uma bitcoin falsificada. Será que ainda restam vagas na CNN Brasil, que deve entrar no ar em breve?

De qualquer forma, fome ele não vai passar.