A gente devia viver do jeito que Gal Costa cantava
E se expuséssemos nas redes sociais só o que fizesse sentido, o que fosse nossa verdade?
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A voz da Gal Costa sempre foi perfeita. Afinada, potente, melodiosa. Mesmo os tons mais altos entram nos ouvidos de forma delicada, sem arestas. Ouvir Gal é um prazer divino, maravilhoso.
Mas não foi só o som dessa voz primorosa que me impressionou a vida toda, mas o jeito de Gal cantar. Gal canta sem esforço, sem fazer caretas, sem aquilo que chamamos de "máscara". Ao contrário. Quando Gal cantava parecia que ela estava conversando com a gente. Sem contar que em muitos vídeos de suas apresentações é comum vê-la sorrindo enquanto canta. O nome disso é dom.
O nome disso também é liberdade.
Gal tinha uma voz livre, tinha um corpo livre, porque era uma mulher verdadeiramente livre. Não seguia padrões, não copiava ninguém, não se rendia. Lutava pelas causas que acreditava, convivia com as pessoas que amava. Escondia e revelava a seu bel-prazer: mantinha sua vida real reservada e, quando queria, expunha os seios nus em plena ditadura militar.
Seu nome era Gal e, como ela, nunca houve igual. Gata, sexy, leve, doce e também vanguarda, revolucionária. Única.
Quando nos deixou, Gal fez o Brasil derramar todas as lágrimas possíveis, entre lembranças de canções e emoções de seus amigos, fãs e parceiros de vida. Ver Caetano, Bethânia e Gil emocionados falando dela foi um momento triste e lindo.
Revendo toda sua carreira, vendo seus 77 anos passando nas reportagens da TV, eu só consigo pensar numa coisa: a gente devia viver do jeito que Gal cantava. A gente devia escolher o que vamos consumir, o que vamos cantar, o que vamos exibir, sem essa necessidade doentia de se expor tanto nas redes sociais.
A gente devia escolher o que falar como ela escolhia o repertório que ia cantar: só o que fizesse sentido, o que fosse nossa verdade. A gente devia se importar menos com o que os outros pensam de nós e mais com o que nós realmente queremos ser. A gente ainda tem muito a aprender com essa mulher tão potente.
Gal dizia que cantar era sua missão. E, como espectadores de todos esses anos, atestamos:
- Missão cumprida, Gal. Missão maravilhosamente cumprida.