'Bug da Segunda' teve forte impacto em empreendedores periféricos
Coluna colheu impressões sobre o apagão do Facebook, Instagram e WhatsApp
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Lembra do Bug do Milênio? Para os novinhos, explico: na virada de 1999 para o ano 2000, houve uma grande apreensão de que poderia haver uma pane em todos os computadores do mundo, pois não se sabia se eles entenderiam os dígitos do ano “00” como 2000 ou 1900.
Algumas previsões eram apocalípticas: sistemas bancários, de energia, de telefonia, de transporte e até hospitais poderiam ser afetados. Perto da meia-noite, a humanidade respirou fundo e... nada aconteceu.
Pois na última segunda-feira tivemos um gostinho de bug planetário, com o apagão simultâneo de Facebook, Instagram e WhatsApp, que durou mais de seis horas e alcançou 3,5 bilhões de usuários no mundo —quase metade da população da Terra.
Tudo por causa de uma alteração incorreta de configuração na estrutura que coordena o tráfego entre os centros de dados das redes, segundo a companhia de Mark Zuckerberg, dono das três empresas.
As reações foram variadas. Coletei impressões com pessoas que vivem diferentes realidades. Houve muita gente que comemorou: “para mim foi ótimo, paz”; “adorei, quero fazer isso sempre hahaha”; “desculpa para postergar alguns compromissos kkk”; “foi um dia mais calmo, mais focado, sem interrupções”; “fui 50 milhões de vezes mais produtiva”.
Houve quem não percebeu ou não se importou muito: “como estou no Canadá, pensei que fosse um problema só comigo, só fui descobrir bem mais tarde que era geral”; “nem percebi muito, fiquei em reunião o tempo todo”; “atrapalhou um pouco a troca de informações de trabalho, mas usamos e-mail e telefone; depois fui ler um livro sem stress até voltar tudo”; “eu estava em visita técnica num sítio, quando entrei nas redes à noite já estava normal”.
E houve quem detestou: “foi um sufoco, não conseguia trabalhar”; “foi péssimo, pois trabalho em restaurante e perdi vários pedidos”; “esquisito ficar sem as redes, me sinto desconectada, é um vício”; “louco, entro até em depressão kkk”; “acho que todos pensaram como ficamos dependentes disto”.
Entre os mais afetados, estão os microempreendedores que estruturaram seus canais de contato com os clientes para venda de produtos e serviços por meio dessas plataformas —o que cresceu exponencialmente durante a pandemia.
E muitos deles trabalham com metas diárias, ou seja, a receita de um dia faz muita diferença. “Aquilo que aconteceu teve um impacto direto sobre o público que nós atendemos”, afirma Silvia Caironi, coordenadora geral da ONG Aventura de Construir (AdC), que apoia empreendedores periféricos.
“Sem WhatsApp e Instagram funcionando, ficamos no escuro. É como se não estivéssemos aqui”, relata Maria Rose, sócia da doceria Maria’s Doux (@mariasdoux), do Morro Doce. Segundo ela, a queda nas vendas foi de 84%. “A vontade de consumir é despertada com os vídeos ou fotos.”
“Para que nossas ações sociais aconteçam, precisamos 100% da comunicação instantânea e social, não dá pra bater de porta em porta pra pedir ajuda”, conta Evelyn Daisy, fundadora do projeto TrançAmor Cozinha (@trancamor), do Capão Redondo.
“A queda das plataformas me fez repensar como tenho que expandir a visão dos meus clientes e a minha sobre a não dependência de uma única plataforma”, diz Laila Covolan, fundadora da Agência São Francisco (@saofrancisco.agencia), que atende microempreendedores.
Ouvindo tanta gente com experiências diversas, o “Bug da Segunda” também fez pensar na centralidade que as redes sociais assumiram nas nossas vidas, seja para amar ou odiar a ausência delas, ainda que só por algumas horas.
E por que nós permitimos isso —por que passamos tanto tempo na frente de telas todos os dias, fornecendo nossos dados, nossos cliques e nossas escolhas gratuitamente para gerar lucros trilionários para alguns poucos, que ainda por cima falham.
E até que ponto é uma escolha pessoal se desconectar, quando muitos dependem justamente dessas plataformas para pagar as contas, botar comida na mesa e sobreviver no dia de hoje, do jeito imperfeito que o mundo é.