Por que filme 'Super Mario Bros.', que foi fracasso em 1993, faz sucesso três décadas depois
Com nova adaptação arrasando na bilheteria, primeira versão é revisitada por novas gerações
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O novo filme de animação "Super Mario Bros. - O Filme" recria o espírito ensolarado, a ação efervescente e a estética de confeito dos jogos de vídeo homônimos, com as vozes de Chris Pratt como Mario, Charlie Day como Luigi, Jack Black como Bowser e Anya Taylor-Joy como Princesa Peach. Podem contar com céus azul-turquesa, tubos chanfrados verdes e personagens com cabeça de cogumelo.
O bigodudo mascote da Nintendo já esteve na telona antes —embora algumas das pessoas envolvidas com o projeto original talvez prefiram esquecer.
Em 1993, a popularidade de Super Mario levou à primeira adaptação de grande orçamento de um jogo de videogame por Hollywood. "Super Mario Bros.", adaptação "live action", trazia Bob Hoskins como Mario e John Leguizamo como Luigi, dois azarados irmãos encanadores que vivem de biscates em Brooklyn.
Filmado em grande parte em uma fábrica de cimento abandonada na Carolina do Norte, o filme foi ambientado não no altamente colorido Reino do Cogumelo, e sim em uma alternativa, distópica e cinzenta a Nova York chamada Dinohattan, governada pelo ditador maníaco Rei Koopa (Dennis Hopper). Um fungo pegajoso e elástico desempenha papel fundamental na trama. E o resultado não se parecia em nada com os videogames originais, ou nem mesmo os lembrava.
Para Rocky Morton, que realizou o filme com Annabel Jankel, aquele era o objetivo. Morton e Jankel eram realizadores britânicos de videoclipes musicais que também participaram da criação de Max Headroom, um apresentador de TV supostamente criado por um computador. O agente de Morton e Jankel tinha lhes enviado um roteiro para um filme de Mario Bros escrito por Barry Morrow, um dos criadores de "Rain Man". Descartando o roteiro como fofo demais, Morton lançou outra ideia: uma história de origem mais sombria e mais bruta para os Mario Bros.
"Parecia uma oportunidade muito grande", disse Morton em uma recente entrevista por telefone, "de transformar o fenômeno dos videogames em um filme". "Parecia a coisa óbvia a fazer. E traria uma audiência incorporada. Uma oportunidade feita no céu."
O resultado foi um desastre crítico e comercial. Roger Ebert definiu o filme como "um completo desperdício de tempo e dinheiro". Embora Gene Siskel tenho aberto uma exceção ("eu gosto dos Goombas", ele escreveu, sobre os capangas superdimensionados de Koopa), vários dos atores fizeram referências depreciativas sobre a produção, e Hoskins chamou a filmagem de "pesadelo". Com isso, foi game over para qualquer continuação, e para as carreiras dos diretores em Hollywood.
Em anos mais recentes, os devotos da Nintendo na geração milênio que rejeitaram o filme em 1993, ou, como eu, simplesmente o evitaram, resolveram que o trabalho merece uma nova oportunidade.
Hoje, "Super Mario Bros." vem sendo objeto de uma espécie de reavaliação e, no processo, veio surpreendentemente a ser considerado como um cult movie. Seu verbete no site de classificação de filmes Letterboxd é acompanhado por uma série de críticas apaixonadas e perspicazes. "Super Mario Bros." é um filme "com boas referências cinematográficas, ousado, político e escancaradamente insano", escreveu o usuário Zeke Knott.
Enquanto aguardam "Trust the Fungus: Bob-Omb to Cult Classic", um documentário realizado por fãs que está para ser lançado, os interessados podem ouvir um podcast dedicado a uma dissecação minuto a minuto do filme, ou visitar o Museu Nacional do Videogame em Frisco, Texas, que está realizando uma exposição sobre ele. Este mês, o Nitehawk Cinemas, em Williamsburg, Brooklyn, vai exibir "Super Mario Bros." como parte do Re-Consider This!, uma série que mostra obras-primas mal compreendidas.
A liberdade artística excessiva tomada com a adaptação faz parte da diversão da mesma, disse Desmond Thorne, um programador de cinema do Nitehawk. "Numa época em que estamos inundados de adaptações de videogames e quadrinhos que têm uma abordagem mais literal, é refrescante olhar para ‘Super Mario’ 30 anos mais tarde", ele disse. "É preciso admirar os enormes riscos que o filme se dispôs a correr". Como exemplo de "forte risco", veja por exemplo, a cena em que Dennis Hopper toma um banho de lama com Fiona Shaw.
Mas mesmo os fãs mais ardentes admitirão que "Super Mario Bros." é bem confuso. Morton disse que os problemas começaram depois de a Disney ter adquirido os direitos de distribuição, exigindo uma revisão extensa do roteiro, redução dos efeitos especiais e uma história que agradasse mais às famílias, tudo isso 10 dias antes do começo da fotografia principal (a Disney não conseguiu localizar qualquer pessoa envolvida na produção para comentar).
Mas é uma confusão fantástica e inspirada, com cenários densamente artificiais concebidos pelo designer de produção de "Blade Runner, o Caçador de Andróides", David Snyder; figurinos em estilo de cartum desenvolvidos por Joseph Porro (que mais recentemente trabalhou em "The Mandalorian"); e uma partitura lunática do compositor Alan Silvestri. Por outro lado, os desenhos de criaturas de Patrick Tatopoulos antecipam seu trabalho em "Dia da Independência".
"O filme aceita todo tipo de influência, em sua inspiração e execução", disse o superfã Ryan Höss. "Cenários práticos, maquilagem, figurinos, pirotecnia, próteses, animatrônicos e fantoches. Há problemas de tom, e um excesso de cozinheiros no fogão, mas, para qualquer parte da história de "Super Mario" que você olhe, encontrará algo fascinante em algum nível."
Em 2007, quando Höss estava na faculdade, criou o site Super Mario Bros. The Movie Archive. "Senti que a conversa em torno do filme não era a que ele merecia", disse o pesquisador. O site era "um lugar para mostrar o máximo do background e da história do filme a todos os interessados".
Desde então, Höss, juntamente com o editor-chefe do site, Steven Applebaum, localizou versões alternativas do roteiro, fotografias dos cenários e adereços, e publicou numerosas entrevistas com membros da equipe. Mais recentemente, os dois revelaram e restauraram uma primeira impressão do filme, criando uma edição estendida disponível para visualização online.
Ele acrescentou: "A maior surpresa tem sido conhecer tantas das pessoas talentosos do elenco e equipe do filme. Todos disseram que ‘Super Mario’ foi um dos filmes mais memoráveis da sua carreira".
Eles também realizaram sessões de exibição e outros eventos para os fãs interessados. "São um dos grupos de fãs mais entusiásticos e positivos que já encontrei", disse Höss.
Leguizamo disse que se orgulha de seu envolvimento no filme. "Sou da velha guarda", ele disse recentemente ao IndieWire, elogiando também Jankel e Morton pelo seu esforço de promover a diversidade no elenco. Eles "lutaram muito para que eu fosse o protagonista porque eu era um homem latino", disse o ator. "Foi um grande avanço."
Hoje, Morton contempla a experiência dele no filme como um momento de humilhação total: "Foi horrível, uma experiência realmente horrível, e só". Jankel não respondeu a um pedido de entrevista e aparentemente não participou em nenhuma história sobre a realização do filme. "A história toda a magoou mesmo", disse Morton.
A reavaliação de "Super Mario" é "reanimadora", disse Morton. E o fato de que um filme antes desdenhado agora esteja sendo celebrado e apreciado —sem ironia— não parece ter sido totalmente absorvida por seu realizador. No dia seguinte à nossa entrevista, ele concordou em assistir a uma projeção do filme em Hollywood, a primeira vez que o viu em cerca de 20 anos. "Queriam que eu o apresentasse, mas não consigo pensar em nada de positivo para dizer."
Quanto ao novo filme, se tudo correr bem, poderá assinalar o lançamento de mais uma franquia de cinema, o Universo Cinematográfico Nintendo. O que, admitiu Morton, é provavelmente o que as audiências esperavam 30 anos atrás. "Este é o filme que todos queriam", ele disse. "E eles agora o têm."
Tradução de Paulo Migliacci