Após vilões, Dylan McDermott volta a ser mocinho em 'FBI: Most Wanted'
Ator substitui Julian McMahon no comando da equipe de policiais
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Dylan McDermott, 60, conhecia bem a escuridão requerida para interpretar Richard Wheatley, o sinistro homem de negócios e furtivo chefão do crime da série "Law & Order: Organized Crime". Ele teve pessoas parecidas com aquela em sua vida.
Mas quando Dick Wolf lhe ofereceu a oportunidade de interpretar o agente especial supervisor Remy Scott, substituindo Julian McMahon no comando do elenco de "FBI: Most Wanted", que estreou no último dia 12 nos Estados Unidos, o ator decidiu correr na direção da luz. No Brasil, a série passa no canal pago Universal.
"Eu vinha interpretando pessoas mais questionáveis, já há algum tempo", disse McDermott em uma conversa durante um de seus raros dias de folga. Sua expressão bonita e severa é abrandada constantemente por um sorriso gracioso, e ele deixa transparecer uma grande cordialidade. "E agora, era preciso interpretar alguém mais heroico, e uma pessoa boa, porque interpretar vilões parece ter um prazo de validade junto ao público".
O ator descreveu sua infância depois da morte de sua mãe, que aconteceu quando ele tinha cinco anos; foi um período de enorme sofrimento, marcado pela pobreza e pela violência. Quando McDermott tinha 15 anos, seu pai, gerente de um restaurante no Greenwich Village, em Nova York, o apresentou à dramaturga Eve Ensler, hoje conhecida como V, autora de "Monólogos da Vagina", com quem seu pai viria a se casar. E ela vislumbrou o potencial do adolescente como ator.
"Sempre digo que você só precisa de uma pessoa que o ame, e isso o habilita a fazer tudo que deseja; para mim, V foi essa pessoa", ele disse. "Ela mudou tudo. Acreditou em mim desde o minuto em que me viu. Ninguém tinha agido daquela maneira antes".
Depois da universidade, McDermott foi parar na Broadway, substituindo um dos atores na peça "Biloxi Blues", de Neil Simon. Não demorou para que ele conquistasse o papel de noivo de Julia Roberts em "Flores de Aço" (1989), uma comédia romântica passada no sul dos Estados Unidos.
Mas seu primeiro papel como astro só surgiu em 1997, quando ele foi escalado para interpretar o ético advogado Bobby Donnell, em "The Practice", drama jurídico de David Kelley. O papel valeu a McDermott sua primeira indicação ao Emmy –a segunda viria 21 anos mais tarde por sua interpretação de um operador de posto de gasolina que trabalha nas horas vagas como cafetão, em "Hollywood", série de história alternativa de Ryan Murphy. "Não acho que eu tenha como esperar mais 21 anos", disse McDermott, sorrindo.
No papel de Wheatley, McDermott passou duas temporadas como inimigo primário do inflexível detetive Elliot Stabler (Christopher Meloni), antes de encerrar sua participação em "Organized Crime", em março. A ex-mulher de Wheatley jogou seu carro despenhadeiro abaixo; Wheatley estava no banco do passageiro. O corpo dela foi encontrado; o dele, não. Embora estivesse preparado para deixar o papel, McDermott se sente grato por –e às vezes se diverte– com a durabilidade do chefão do crime.
"Outro dia fui abordado por um morador de rua que me pediu uns trocados, e eu parei para lhe dar dinheiro", disse McDermott. "E ele comentou, ‘oh, Law & Order’. Falou do meu personagem e da série, e eu fiquei pensando que só em Nova York uma coisa dessas poderia acontecer".
Entre garfadas de um prato macrobiótico em um restaurante do East Village –o ator tem duas filhas, mas não o físico típico de um pai de sua idade—, McDermott discutiu sua transformação em um ator muito mais versátil por conta de suas perdas, e discutiu sobre o desaparecimento de Richard Wheatley. Abaixo, trechos editados da conversa.
Você assinou para fazer oito episódios no começo de "Law & Order: Organized Crime", mas terminou ficando por mais uma temporada. Por quê?
Eles me procuraram para perguntar se eu estaria interessado em fazer mais oito. E fiquei interessado na proposta. Quando você se apaixona por um personagem, sempre quer fazer mais. Os personagens se transformam em seus irmãos, ou algo assim. Você não quer dizer adeus.
Mas foi realmente um adeus? O episódio final deixou tudo pendente. Será que nós vimos, será que você viu, realmente o fim de Wheatley?
Nunca diga nunca. Não é algo que tenha sido discutido, mas tudo que sei é que o corpo dele não foi localizado. Onde é que ele foi parar? Como D. B. Cooper, certo? [D.B. Cooper é o nome dado pela imprensa a um homem que sequestrou um avião em 1971, saltou de paraquedas e nunca foi capturado.]
E agora você tem seu primeiro papel principal em diversos anos, em "FBI: Most Wanted". Você sente algum medo de assumir um papel como esse, a esta altura de sua carreira, ou é só mais um desafio?
"Para ser franco, caras de 60 anos de idade não estão exatamente conquistando todos os papéis principais em séries de TV, hoje em dia. Por isso, achei que seria um bom exercício para mim descobrir se era capaz de fazer o trabalho. Acho que muitas vezes os atores –e eu entre eles– chegam a um set e são apresentados a novos colegas e a um novo diretor, e sentem a necessidade de provar seu talento, e um pouco de medo. O que aconteceu é que eu estava fazendo papéis secundários, mas importantes, um trabalho de que gosto muito mais do que fazer papéis principais. Mesmo quando faço um papel principal, tento encontrar alguma coisa excêntrica para fazer, para escapar do peso de ser aquele cara todo certinho. E é quando começo a fazer isso que o medo vai se dissipando aos poucos.
Você declarou que sabia quem Wheatley era assim que leu o roteiro sobre ele. Como isso aconteceu?
Acho que ele representa um amálgama de diferentes pessoas que passaram por minha vida. O namorado de minha mãe era ladrão de bancos. Cresci na companhia dele, e depois, quando me mudei para Nova York e trabalhava como garçom, eu atendia a criminosos, na juventude. Eu frequentava os clubes sociais italianos, e às vezes os clubes sociais irlandeses, depois do trabalho, quando era menino. Uma das coisas que eu fazia era observar as pessoas e estudá-las, e consegui implementar aquilo em minha mente, de alguma maneira. Por isso, quando li o papel de Richard Wheatley, eu imediatamente pensei que sabia que roupa ele usava, sabia o que ele comia, sabia o que ele estava pensando. Tudo aquilo me ocorreu na hora. Quando isso acontece, é miraculoso, porque você não precisa sair à procura dessas coisas.
Você teve um momento similar de reconhecimento com Remy?
Isso nunca acontece quando você cria um personagem a partir do zero. Foi o que eu fiz, com Dick [Wolf] e o "showrunner" David Hudgins. Mas havia uma determinada coisa que eu queria nele –que ele, como eu, tivesse passado por perdas em sua vida. Era muito importante para mim porque, em muitas séries desse tipo, os personagens são simplesmente policiais, ou agentes do FBI, e caçam bandidos porque esse é o trabalho deles. Mas achei que seria mais intrigante ter alguma espécie de combustível, que ele estivesse fazendo o que faz por um motivo. Ele trabalha apaixonadamente para lidar com algo que existe dentro de si.
A que perdas você se refere?
A perda de minha mãe quando eu era criança, por exemplo. Acho que isso mudou a paisagem de minha vida para sempre, e que o efeito foi tão poderoso que é algo que continuo a sentir ainda hoje. Assim, coloquei aquele sentimento em meus personagens porque faz sentido. Era como se eu desejasse personalizar aquilo porque se trata de um trabalho que eu talvez passe um bom tempo fazendo. E eu queria conseguir me manter conectado. Acho que muitas vezes a armadilha de séries como essas é que você perde o foco e elas perdem a energia, e a sensação começa a se parecer com a de trabalhar em uma fábrica.
Por que, então, assinar um contrato de diversos anos para uma série policial convencional com Dick Wolf?
Há uns cinco ou seis anos, eu tenho improvisado mais, desenvolvido algumas ideias. Isso mudou radicalmente minha maneira de trabalhar. No caso de Richard Wheatley, pude fazer isso, assim como em "Hollywood". Acho que as pessoas começaram a receber meu trabalho de um jeito um pouco diferente, porque ele se tornou diferente. E agora estou fazendo a mesma coisa com Remy, e isso foi realmente satisfatório. Ninguém me diz que não devo dizer isso ou aquilo, porque não está no roteiro. As pessoas me dizem que querem mais improviso, na verdade.
Você fez diversos papéis em "American Horror Story", de Ryan Murphy, e conquistou sua segunda indicação ao Emmy trabalhando em "Hollywood", outro projeto dele. Alguma chance de que vocês voltem a trabalhar juntos?
Sempre existe a possibilidade. Qualquer convite dele, a resposta é automaticamente sim. Nem preciso ler o roteiro. Ele me deixa fazer personagens que outros produtores talvez não deixassem, e me dá a liberdade de criar, que eu amo. Eu sabia, depois de "The Practice", que precisava mudar de rumo. Muitas vezes, depois de fazer uma grande série como aquela, sua carreira chega ao fim. Por isso, eu sabia que tinha de me reinventar. Quando li o roteiro dele para "American Horror Story", liguei para o meu agente e disse que era aquilo que eu estava procurando. Era exatamente o que eu precisava.
Você teve um a careira longa e variada. Como é que define o sucesso, a esta altura?
Às vezes me pergunto isso, porque há uma coisa engraçada. O que é sucesso para você nem sempre é sucesso para outras pessoas. Você sabe o que quero dizer com isso. Não é um mistério, e, assim, basta o fato de que eu tenha podido fazer qualquer coisa em minha vida para me tornar um sucesso. Conseguir encontrar uma careira para mim foi uma realização notável. Isso é algo de que sempre tento me lembrar. Se surge um momento em sua vida em que você acha que está à deriva, que não tem para onde ir, basta lembrar de onde você veio, e você ficará bem.
Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci