Intérprete de libras traduz parto e choro de bebê a pais surdos: 'Mãos que falam'
Sonia Franco de Paula trabalha com deficientes auditivos desde 2014
Um dos momentos mais emocionantes ao presenciar um parto é ouvir o choro do recém-nascido. É como se toda a tensão existente naquele momento se desfizesse dando lugar a um misto de alegria e alívio. Mas e se os pais do bebê forem surdos? É possível transmitir a eles a emoção desse instante? A resposta é sim, como podem comprovar os deficientes auditivos Olimpia Virginia Páes Duin, 41 e Ronildo Fernandes de Melo, 43.
O primogênito deles, Rony, nasceu no último dia 14 de outubro em Curitiba por meio de uma cesárea. Na sala de parto, além de a equipe médica e os pais do bebê, estava a intérprete de libras Sonia Franco de Paula, 50. Coube a ela avisar a Duin e Melo que da consulta de rotina eles partiriam para o centro cirúrgico. “A Olimpia se emocionou e eu também. Ela estava muito cansada, foi um alívio. Perguntei à médica se eu acompanharia o parto e ela disse que sim”.
“Subimos até a sala de cirurgia e Olimpia estava bem tranquila. No momento em que o bebê nasceu, avisei e ela me perguntou: ‘meu filho já chorou?’. Eu falei que não. Em seguida, o Rony chorou e eu disse que ele ‘chorou forte, que o pulmão dele estava forte’. Ela, então, foi às lágrimas”, relembra De Paula.
A intérprete salienta que toda a comunicação com o casal foi feita em libras — Língua Brasileira de Sinais, utilizada para se comunicar com deficientes auditivos. A profissional explica que “há movimentos diferentes para o choro, para a emoção e para o nascimento. Tudo em libras”.
Aceitando o desafio
No Departamento dos Direitos das Pessoas com Deficiência, em Curitiba, desde 2014, De Paula conta que foi a primeira vez que narrou um parto, mas que já passou por situações delicadas enquanto cumpria seu ofício. Um dos momentos mais difíceis foi contar a um casal que o filho deles, que nasceria em cerca de trinta dias, tinha hidranencefalia, que é o acúmulo de líquido no lugar do cérebro.
A profissional destaca que sua atuação não se restringe apenas a acompanhar deficientes auditivos a consultas médicas. Ela também auxilia em audiências e em casos em que o surdo esteja com problemas relacionados às drogas ou tente tirar a própria vida, por exemplo.
“Antes de entrar nessa área eu era de uma forma. A partir do momento que você passa a trabalhar com deficientes, sabendo que é uma ponte de comunicação e acessibilidade para eles, muda muito a nossa vida, te transforma para melhor. Aos olhos deles, sou a voz do médico, da psicóloga, da assistente social, do repórter. Eles vêem o outro por meio de mim e o que aquela pessoa está passando é o que transmito para eles. Se é uma notícia triste, ele tem que ver a tristeza nos meus gestos e expressõe, o mesmo para a felicidade. Eu me emociono junto”.
De Paula conta que pensou em desistir da carreira de intérprete, mas quando passou a estudar e ver a importância do trabalho abraçou o ofício, que hoje, segundo conta, traz enorme prazer à vida dela. “Se eles ficam sem comunicação, sem entendimento, principalmente em uma consulta médica, são muito vulneráveis às informações. Isso que foi me motivando a permanecer: perceber que sem o intérprete a comunicação é quebrada. É o mundo do silêncio, no qual eles se comunicam por meio do visual. São as mãos que falam”.
Serviço
Em São Paulo o apoio às pessoas com deficiência auditiva, surdos e surdo-cegos é feito pela Central de Intermediação em Libras (CIL). O serviço, coordenado pela Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência de São Paulo, realiza a mediação da comunicação na assistência em qualquer serviço público instalado na capital paulista.
O atendimento pode ser feito por meio do número (11) 96470- 4414, das 9h às 17h, de segunda a sexta (exceto feriados), pelos e-mails agendamentocil@prefeitura.sp.gov.br ou contato.cil@prefeitura.sp.gov.br ou online, com a instalação do aplicativo CIL – SMPED, disponível gratuitamente para celulares e tablets Android ou IOS e computadores, via website.
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