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Estilo
Descrição de chapéu The New York Times

A psicologia secreta das cores dos tênis

Fabricantes de calçados esportivos apostam em cores conflitantes

Nike versus Sacai VaporWaffle em toda a glória de confronto de cores

Nike versus Sacai VaporWaffle em toda a glória de confronto de cores NYT

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Mark C. O’Flaherty
The New York Times

Azul-aqua, verde-limão-ácido e roxo-uva. Laranja brilhante com faixas rosa neon. Camurça cinza e estampa de leopardo combinadas a branco e dourado. Não se trata de descrições do pior pesadelo de um minimalista, mas de combinações de cores de novos modelos de tênis da Adidas, Reebok e New Balance.

E as cores conflitam de propósito. Na era do scroll ininterrupto e da cultura do tênis, na qual a corrida para produzir o modelo mais procurado, mais raro e mais desejado se tornou mais intensa que nunca, o calçado no qual os tons se chocam com mais força pode parar o trânsito —pelo menos o online.

Como resultado, os fabricantes de calçados esportivos estão se tornando adeptos cada vez mais fluentes daquela antiga arte: a teoria das cores. Os vínculos entre cor e emoção são estudados há séculos, da codificação de traços de personalidade com base em cores propostas por Carl Jung a grupos de foco que avaliam a maneira pela qual as cores usadas em confeitos podem afetar a percepção sobre seu sabor.

Os fabricantes de medicamentos colorem as pílulas em tons “quentes” ou “frios”, de acordo com o efeito desejado (os hipnóticos são muitas vezes verdes ou azuis, os antidepressivos, amarelos), e usamos lâmpadas SAD no inverno para replicar as qualidades energizadoras de um dia de sol.

Pouco admira que as marcas de tênis tenham departamentos inteiros dedicados a manipular minúsculas alterações de tom, e a desenvolver visuais parecidos com os de uma cena de crime: o objetivo é atrair os olhares dos internautas. A missão desses departamentos é criar sentimentos e acelerar negócios.

“Entre 70% e 90% do julgamento subconsciente sobre um produto é realizado em questão de poucos segundos e com base apenas na cor”, diz Jenny Ross, que comanda a área de estratégia e conceituação de design na divisão de calçados “lifestyle” da New Balance. “As cores podem nos empolgar e acalmar, podem fazer com que nossa pressão sanguínea suba. São realmente poderosas."

Assim, embora o arroz com feijão da maioria das marcas continue a estar nas cores básicas —o Nike Air Force 1 foi o tênis mais vendido de 2020, e seu modelo básico é todo branco—, as ideias que movimentam o giro e o agito continuados do mercado surgem nos colecionáveis de edição limitada, que buscam acesso ao nosso subconsciente para criar desejo.

Às vezes os gatilhos são óbvios: o uso do vermelho “varsity”, por exemplo, desperta nostalgia pela era colegial de Ferris Bueller; púrpura e ouro trazem à memória um jogo do Lakers; e branco está associado aos esportes com raquete. Mas na moda, a cor também é marca. Fendi e o amarelo, Hermès e o laranja, Tiffany e o azul. Assim, as marcas de tênis se alternam entre as cores básicas e as experiências radicais.

A New Balance, por exemplo, tem o cinzento como raiz, onipresente em todas as temporadas. A cor sugere um calçado para corrida em área urbana, uma referência ao concreto.

“Fazer um sapato cinzento do jeito certo é algo que nos orgulhamos muito”, diz Ross. “Todos os cinzentos no nosso anel de cores têm caráter e personalidade. O Castle Rock é quente. O Steel é azulado. Nos modelos tradicionais, tomamos cuidado para que a produção não se desvie das cores corretas. Elas são reproduzidas com exatidão."

No extremo oposto do espectro está a Nike, com a cor que ela chama de Volt, um verde-limão neon visto pela primeira vez na Olimpíada de 2012. Para algumas pessoas, é horrorosa. Para outras, uma ideia genial.

“Foi uma escolha intelectual e científica para a Nike”, diz Bryan Cioffi, vice-presidente de design de calçados da Reebok. "A primeira cor que você lê em seu receptor óptico é aquele verde-limão superbrilhante. Talvez seja um traço evolutivo relacionado a animais venenosos, e sinalize perigo. Algo físico acontece quando a pessoa vê aquela cor. A Nike triangulou isso e vem repetindo constantemente."

Repetição é o caminho da vitória, no jogo da cor. Você talvez veja o Volt e sinta rejeição, mas sempre vai pensar: “Nike”. Em termos de cor, é um paradigma para o marketing de marca. “Realizamos um estudo completo de inovação tecnológica sobre como a cor era vista em TVs de alta definição e nas pistas de esporte”, diz Martha Moore, vice-presidente e diretora de criação da Nike.

“Estávamos estudando a ideia da velocidade e que cor a complementava, na vibração do olho humano. A cor Volt é emocional”. Depois de um ano vivendo nossas vidas quase totalmente online, a coloração dos pixels se tornou ainda mais importante.

“Estamos desenvolvendo cores que parecem iluminadas de dentro”, afirma Moore. “Pixels posicionados uns ao lado dos outros criam cores antes não vistas. Criam novas combinações, neutras e complexas. Estamos usando linhas tecidas de forma complexa, com pontos brilhantes e sombreados, que até agora não tinham sido vistas”.

Com certeza. “Temos visto uma resposta especialmente positiva a tons-pastel reforçados e a amarelos fortes”, diz Heiko Desens, diretor mundial de criação da Puma. "Coisas que falam de energia e positividade."

Essa nova energia está em toda parte. Por exemplo, o Yeezy Boost 700 Sun, um tênis lançado em janeiro, é uma mistura de amarelo e laranja que fica a um mundo de distância dos modelos bege da Yeezy no passado.

Os fãs mais fervorosos de Rick Owens podem ter muitos pares de seu modelo Dunk preto, mas os Geo Baskets da nova estação, em cor rosa chiclete, rompem com o passado e invertem a estética escura do design do estilista. Cores brilhantes e sólidas podem servir como indicador de referências culturais específicas.

“Usamos um amarelo que estará ligado para sempre ao futebolista Pelé”, diz Melissa Tvirbutas, vice-presidente mundial de design de cores e materiais da Puma. (Até mesmo o nome de seu cargo é uma prova da importância crescente da teoria das cores.) “E não importa que idade você tenha. Se você é fã do futebol, encontra a história dele com dois ou três cliques, e por isso os jovens ainda sacam a referência."

No ano passado, a Reebok lançou uma colaboração com "Ghostbusters" e “fomos fundo para encontrar as cores exatas usadas na tela, para sermos o mais autênticos que pudéssemos” diz Cioffi. “Estamos trabalhando em um lançamento para o ano que vem ligado a um super-herói de televisão da década de 1990, e nossa equipe assistiu a mil episódios da série, fazendo numerosas anotações, em quantidade que eu nunca tinha visto. Eles estudaram os materiais usados pelos fabricantes de corantes que trabalharam nos figurinos na época da produção."

Televisão e jogos são temas recorrentes nas cores dos tênis. Algumas das referências são retrô –como a série Puma RSX Toys, concebida como "colecionáveis" de produção limitada e cujos modelos são decorados com gráficos primários que trazem à memória o Cubo de Rubick. Outras são contemporâneas, como uma nova linha do Instapump Fury que tem um botão de ligue/desligue semelhante ao de um console de videogame.

Um dos designs Console, da coleção Reebok Glitch de modelos Fury, é executado em branco e verde, com um botão Pump envolto em um anel vermelho —uma imagem conhecida dos “gamers” mais dedicados, quando seus consoles apresentam algum defeito.

“Queríamos brincar com a ideia de falhas nos computadores, que temos de encarar no trabalho, na mídia social, e quando apps travam”, diz Joe Carson, o designer da Reebok, que também incorporou uma malha metálica àquele modelo específico, como uma menção ao lado de trás dos discos de videogames.

Para além do óbvio, todos nós temos relações complexas com as cores. Para algumas pessoas, os tons e padrões cuidadosamente escolhidos e configurados podem parecer interessantes, confusos, ou simplesmente bonitos. Mas para outras, eles parecerão poéticos, quem sabe profundos. É quanto a isso que a teoria das cores vai mais longe.

As colaborações entre Grace Wales Bonner e a Adidas conjuram de maneira muito bonita a década de 1970, especialmente o estilo da comunidade jamaicana e de descendentes de jamaicanos em Londres, naquela era. Para seus mais recentes modelos, a designer disse que a palheta de cores suaves foi inspirada por “filmes jamaicanos emblemáticos”.

“Eu estava interessada em explorar cores que se desbotaram sob o sol da Jamaica”, diz Wales Bonner.
Moore, da Nike, também aponta que as referências usadas na definição de cores muitas vezes incorporam influências cinematográficas. "Podemos, por exemplo, preferir um clima Wes Anderson a um clima Sofia Coppola", ela diz.

E há o estilo híbrido que a Sacai deu ao VaporMax e ao Waffle Racer, dois tênis de corrida da Nike, com marcas gráficas duplas da fabricante em “laranja fogueira” e “íris escuro”, em projetos que Moore define como “autenticamente esportivos, mas com um viés futurista”.

E não se pode esquecer o Puma Mirage Tech, que usa cores conflitantes e de eras diferentes propositadamente, de uma forma que lembra o display digital no equipamento de um DJ. “É um remix”, explica Desens, da Puma. “Queríamos ligar os modelos à cultura da música eletrônica."

Como expressão abstrata da EDM [electronic dance music], os modelos são fascinantemente efetivos. Fazem com que quem os vê se sinta animado. E remetem à era da discoteca. E é por isso que a teoria das core importa mais do que nunca quando o assunto é decidir o que você vai calçar. “Consideramos múltiplas visões do tênis em um estágio bem inicial de seu desenvolvimento”, diz Cioffi, da Reebok.

“Consideramos o brilho e a retroiluminação de modo mais crítico. Como é que esse tom de azul vai parecer às 20h em um feed de Instagram quando a carga da bateria do celular estiver baixa? Pensar demais vale a pena."

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci.

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