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Taróloga analisa como 'The White Lotus' aborda previsões das cartas e diz se cenas fazem sentido

Personagem de Jennifer Coolidge consulta taróloga para esclarecer dúvidas do relacionamento

Katia Gargano interpreta cartomante em 'The White Lotus'
Katia Gargano interpreta cartomante em 'The White Lotus' - Reprodução/HBO
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Zoe de Camaris

Taróloga

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A série "The White Lotus" (HBO) fez muito sucesso e foi tema de várias discussões na internet. Além disso, nela, tivemos cenas de tarô. No terceiro episódio da segunda temporada, a personagem Tanya, interpretada por Jennifer Coolidge, contrata uma taróloga para investigar se o marido lhe é infiel.

Neste texto, vou discutir um pouco mais sobre tarô no cinema para, na sequência, analisar de forma mais aprofundada sobre como ele apareceu na série.

Se você tem uma questão específica e sente que o tarô pode te dar as respostas, conheça o tarô direto, que vai muito além do sim ou não. E, se você quiser receber um conselho do tarô para hoje, confira gratuitamente o tarô do dia.

O TARÔ NO CINEMA

O tarô faz a festa no cinema. São inúmeras as aparições das cartas em obras de ficção. Se os arcanos do tarô definem plots e tramas ou dão pistas, verdadeiras ou falsas, na consecução de assuntos, suas cartomantes acabam não merecendo tanta consideração e quase sempre se encaixam em uma visão estereotipada.

Bolas de cristal, muitas pulseiras ou colares, anéis gigantes, unhas longas, olhos muito marcados com maquiagem escura, lendo as cartas em tendas de lua e estrelas, por exemplo.

O ambiente exótico e misterioso onde nascem predições assustadoras criam suspense: serão verdadeiros os vaticínios?

Nada mais longe da realidade de tarólogos e tarólogas de carne e osso, mas é a lenda que vence no território da ficção. Um dia, no futuro, seremos representadas como somos hoje. A aura enigmática do tarô será o suficiente.

TARÔ EM 'THE WHITE LOTUS'

A série, ao mesmo tempo em que mantém a tradição ficcional dos vaticínios intimidantes, traz ao espectador uma vertigem de mensagens cifradas.

Ou seja, de simbolismos que traçam quase que uma segunda história dentro da história, principalmente na segunda temporada, que se passa na cidade litorânea de Taormina, na Sicília.

No episódio "Bull Elephants" (elefante macho, na tradução brasileira), em que a prática é introduzida, a personagem central, Tanya, contrata uma taróloga para investigar se o marido lhe é infiel.

UM PARAÍSO NO PAÍS QUE DEU ORIGEM ÀS CARTAS DO TARÔ

Na apresentação desta segunda temporada, quando aparecem os letreiros, cenas da arte renascentista modificadas especialmente para a série, ambientam os créditos.

As imagens são o pano de fundo para os nomes dos atores e guardam uma ligação simbólica com a personagem por eles representada. O diálogo entre a palavra e imagens alegóricas é incessante, mas permanecem cifradas para o olhar desatento.

É o tipo de série que exige atenção para os detalhes, pois eles farão toda a diferença no decorrer da história, dando pistas (erráticas ou surpreendentes) do seu desenvolvimento.

A partir daqui começam os spoilers. Se você ainda não viu "The White Lotus", assista primeiro e depois volte aqui. Aliás, para que você entenda os detalhes e as decorrências da leitura de tarô na série, é necessário que antes tenha visto as duas temporadas já produzidas.

A IMPORTÂNCIA DE TANYA EM 'THE WHITE LOTUS'

Voltemos a Tanya. Ela é a única das personagens que está presente nas primeiras duas etapas da série. Por isso, vou precisar resumir muito e passar por cima de cenas importantes.

Dessa forma, vou focar apenas naquelas cenas que considero absolutamente imprescindíveis para contextualizar o nosso objetivo, que é interpretar a leitura do tarô. Então, vamos lá.

Na primeira fase, Tanya, uma herdeira milionária, chega ao Havaí para hospedar-se em um dos hotéis da rede White Lotus. Ela traz consigo as cinzas da falecida mãe, com quem teve uma relação disfuncional.

Carente, insegura e narcisista, Tanya é uma personagem complexa, muito bem construída —e Jennifer Coolidge arrasa no papel. Com um visual à la Bardot, usa e abusa de cores e joias.

Num primeiro momento faz amizade com a gerente do spa, Belinda (Natasha Rothwell), a requisitando com pedidos de terapias fora de hora, massagens e jantares. Isso até conhecer Greg (Jon Gries), que tentou abrir a porta do quarto de Tanya supostamente por engano.

Greg e Tanya começam a se relacionar amorosamente. Tanya desconfia do interesse dele, mas os dois apostam no relacionamento mesmo depois de ela ter um surto de sinceridade em que expõe suas vulnerabilidades.

Greg tosse compulsivamente e se diz um doente terminal, mesmo que atravesse a piscina do hotel com facilidade. Mais tarde, saberemos que Tanya lhe paga um tratamento completo, do qual ele sai curado.

No último episódio da primeira temporada, a personagem consegue lançar as cinzas da sua mãe na praia, cena com a qual havia sonhado anteriormente.

TANYA TRAZ O TARÔ EM 'THE WHITE LOTUS'

Na segunda temporada, Greg e Tanya já estão casados. Ela viaja sozinha para a Sicília e o encontra no hotel White Lotus, que faz parte da rede em que ela se hospedou na primeira temporada. Assim que o casal se vê, começam os problemas.

Tanya está irritada porque Greg não atendia suas ligações nem respondia seus recados. Ele se justifica alegando trabalho exaustivo. Também implica com a assistente que acompanha Tanya, Portia (Haley Lu Richardson), argumentando que o casal está em um encontro romântico e que a garota deveria voltar para os Estados Unidos.

A disposição de Greg muda da primeira para a segunda temporada. Antes apaixonado, agora crítico, irônico e temperamental. Mesmo assim, para agradar Tanya, ele pede que ela escolha o que mais deseja fazer na Sicília.

Se na primeira etapa a personagem emula Brigitte Bardot, agora a atriz escolhida é Monica Vitti. Por isso, Tanya pede ao marido um passeio de Vespa.

Depois do passeio, no jantar, Greg diz que terá que ir por dois dias aos Estados Unidos para cuidar de negócios. Tanya fica zangada e, no dia seguinte, muito chorosa, pois já havia escutado um telefonema suspeito de Greg.

SERÁ QUE ESTOU SENDO TRAÍDA?

Depois que ele se vai, Tanya busca Valentina (Sabrina Impacciatore), gerente do hotel, e pede que ela consiga uma médium, uma leitora de sorte, uma cigana, e a traga ao hotel para atendê-la. Valentina diz que há uma taróloga na cidade.

A cena seguinte mostra Tanya e Portia com a cartomante no quarto. Ela observa os movimentos da taróloga com o seu pêndulo e diz para a assistente que a mulher com certeza é uma autêntica cigana do Velho Mundo. Assim, Tanya é corrigida por Portia, indicando que esta seria uma fala politicamente incorreta. Mas não se incomoda.

A cartomante embaralha e oferece o monte à consulente, que apenas sorri e bate sobre as cartas. A cartomante fica olhando, esperando a pergunta que Tanya achava que não precisaria ser feita.

Então, Tanya começa a formular a pergunta, que gostaria de saber sobre o seu marido. Constrangida, pede que Porta se retire. Portia vai para o banheiro, onde pega uma calcinha preta de Tanya e observa. Em seguida, rouba alguns comprimidos para dormir.

A decorrência dos acontecimentos, em consonância com a leitura de tarô, criam uma cena dentro da cena, tornando a calcinha e os comprimidos indícios simbólicos de acontecimentos futuros.

Provavelmente, com medo da pergunta que faria à cartomante sobre a fidelidade do marido, Tanya altera a questão, perguntando se o seu casamento irá durar, se eles ficarão juntos.

Mas a taróloga já havia percebido qual a pergunta original e começa a deitar as cartas. O tarô usado é do tipo marselhês e, na arrumação, só saem cartas dos arcanos maiores, apesar de terem sido embaralhadas as 78 cartas.

A partir daqui, dou a minha visão sobre a leitura de tarô feita em "The White Lotus".

SIGNIFICADO DAS CARTAS DE TANYA

A primeira, no topo da arrumação, é A Estrela. Abaixo, O Diabo. À esquerda, A Lua. À direita, O Louco invertido. E, no pé, O Carro. Essas foram as cartas que saíram para Tanya.

A Estrela

A tiragem corresponderia a um esquema bastante popular e tradicional, intitulado com o nome de seu criador, Péladan. Mas pela forma como as cartas são colocadas, divergindo da ordem de Péladan, podemos concluir que a primeira posição significaria a questão que Tanya traz, A Estrela.

A saída desta carta mostra o destino em ação, anulando boa parte do livre-arbítrio da consulente. Refere-se à beleza, à entrega, aos movimentos da vida e a certa ingenuidade.

Quando A Estrela sai em um jogo de tarô, nunca temos certeza quanto aos acontecimentos vindouros porque eles fazem parte de uma ordem maior, ditada pelas estrelas. A carta seguinte, O Diabo, marcaria o momento presente, as influências em ação.

O Diabo

Juntas, as cartas A Estrela e O Diabo podem indicar sujeição à manipulação; a inocência da Estrela influenciada pelo poder de sedução do Diabo.

No escopo do Diabo encontra-se o poder do dinheiro. Não podemos esquecer que O Diabo também é Lúcifer, a Estrela da Manhã (Vênus), o anjo caído, o mais belo entre todos os anjos.

Ou seja, a beleza faz parte do enredo. O arcano 15 reside nas sombras, sempre mostrando o seu melhor aspecto até o momento em que se revela.

Juntas, as duas cartas podem configurar uma armadilha muito bem posta. Além dos significados tradicionais dados a estes dois arcanos maiores, é bom observar que em ambas as cartas as personagens estão desnudas. Sexo faz parte da emboscada.

A Lua

A Lua, à esquerda do Diabo, poderia indicar os eventos passados e também o ambiente onde tudo iria se desenrolar. Ora, sabemos que A Lua nubla a verdade, esconde a realidade. A ideia de arapuca é reforçada, portanto.

O território é pantanoso, perigoso para Tanya. No entanto, o enigma proposto pela carta da Lua pode ser desvendado, se a pessoa no meio do caminho consegue seguir as pistas, deixar que seu instinto protetivo a guie.

Tudo que turva os sentidos está associado tanto à Lua quanto ao Diabo. Drogas, remédios, álcool, por exemplo. Por isso, é muito difícil ter algum discernimento sob o efeito destes dois arcanos maiores.

O Louco

E aí vemos a carta O Louco, disposta de forma invertida. Eu não trabalho com os arcanos invertidos, embora reconheça seu efeito em uma leitura.

Se a carta está bem aspectada, na posição normal, o cachorrinho que morde a perna do Louco o avisa do perigo próximo.

Invertida, o instinto representado pelo animal não é mais sentido nem escutado e a queda no abismo é iminente. Realmente, um sinal de grande perigo tendo em conta as cartas precedentes. No entanto, pode indicar também que o plano dos inimigos ocultos (A Lua, O Diabo), pode sair dos eixos.

O Carro

Finalizando a tiragem, O Carro imprime ritmo na leitura, agiliza fatos e processos mostrando que a determinação dos adversários é constante, quase que obsessiva.

Os eventos terão condução rápida e serão concluídos, embora não da forma prevista. Indica também que os acontecimentos poderão suceder em uma viagem, em trânsito, ou dentro de algum tipo de veículo.

A cartomante então diz a Tanya que seu marido está apaixonado por outra pessoa, uma pessoa muito bela. A consulente pergunta se essa pessoa não poderia ser ela mesma e a cartomante diz que não, que com certeza não. No entanto, a leitura é para Tanya, a protagonista da história.

AS CENAS FINAIS DA CARTOMANTE

Na última cena da cartomante, ela parece entrar em uma espécie de transe. Assim, aponta freneticamente para as cartas indicando uma após a outra e dizendo: "A beleza, o consciente, o inconsciente, este é O Diabo, coscie, coscie [o coche, O Carro]."

Tanya começa a se revoltar quando a cartomante profere em italiano: "A loucura irá fazê-la cometer suicídio". Ela não deve ter entendido, pois não compreende o idioma local, mas sabe que o que foi dito não é bom.

Irritada, diz que não sabe porque pagou por isso: "Você é muito negativa! Deveria me botar para cima, pegue essas suas cartas horrorosas, essas outras porcarias, seu cinzeiro. Você é uma vigarista!".

A taróloga diz que tudo é verdade: "Eu tirei O Louco, isso é perigoso!". Tanya a expulsa e, dessa forma, a mulher sai atrapalhada do quarto do hotel. E Tanya repete: "Negativa, negativa".

O TARÔ NÃO MOSTRA O QUE VOCÊ DESEJA

A cena é divertida. E mostra bem como alguns consulentes vão atrás de uma leitura de tarô para escutar só aquilo que desejam, e não o que as cartas realmente têm a dizer. Quando uma pergunta exige um sim ou um não, torna-se complicada.

O que fará a pessoa diante de uma negativa em relação aos seus interesses? O tarólogo deve perguntar ao consulente se está pronto para escutar a resposta. Se o consulente diz que não está pronto, reformula-se a pergunta.

Na minha forma de ver as coisas, a cartomante não foi nada hábil. No entanto, a consulente também não ajudou. Além disso, existe a barreira da língua e costumes. O tarô é um código cifrado, disponível para iniciados.

A taróloga traduz a imagem para o plano verbal e comunica os resultados. Aí temos um processo de tradução que esbarra em mais um processo de tradução. Deu no que deu.

Outro dado importante é a habilidade da taróloga em comunicar situações delicadas. Tudo poderia ter sido dito de forma que prevenisse Tanya sobre uma armadilha. Assim, ela teria uma chance de escapar do destino iminente através do seu livre-arbítrio.

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