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Descrição de chapéu The New York Times

Aterrissagem no aeroporto de Londres vira esporte radical durante vendaval

Entusiasta da aviação viraliza com vídeos e comentários durante Eunice

Jerry Dyer filma pousos no aeroporto de Heathrow durante tempestade - Reprodução

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Mark Landler
Londres

Um vendaval de inverno com rajadas de 112 km/h varreu as ilhas britânicas na sexta-feira (18), e o governo do Reino Unido alertou os cidadãos do país para que ficassem em casa. Mas Jerry Dyer decidiu capturar imagens ao vivo na cabeceira da pista 27L do aeroporto londrino de Heathrow, registrando as tentativas de aterrissagem dos aviões em meio ao rugido do vento.

Em poucos minutos, o canal de YouTube de Dyer, Big Jet TV, se tornou sucesso virtual e atraiu quase 200 mil espectadores, que acompanhavam atentos cada minuto de sua narrativa sensacional. Em questão de algumas horas, Dyer se tornou uma sensação na mídia, e transitou da entusiástica, se bem que obscura, subcultura dos observadores de aviões para entrevistas ao vivo com a BBC, ITV e Channel Four.

"Calma, calma, calma", disse Dyer, como que instruindo um Airbus A380 da Emirates que oscilava em meio aos golpes de vento, com as asas flexionadas e os flaps subindo e descendo para tentar manter o gigantesco avião sob controle. "Olhe os ailerons externos, cara", ele disse, enquanto o avião pousava, queimando borracha dos pneus. "E ele está na pista".

"Tenta de novo!", ele gritou para um A380 da Qatar Airways que abortou sua aproximação e voltou a subir para as nuvens, com um rugido de turbinas. O avião fez uma segunda tentativa fracassada de pouso, que rendeu mais um grito de alerta de Dyer. Na terceira, ele disse que pagaria uma cerveja aos pilotos da Qatar se eles conseguissem pousar o avião. E eles conseguiram.

"Cara, ele parece estar alto demais", disse Dyer sobre um jato da British Airways que parecia estar enfrentando dificuldades para descer, antes de tocar a pista de pouso bem adiante da marca usual.

A tempestade, codinome Eunice, causou estragos consideráveis em terra. As autoridades fizeram o primeiro alerta vermelho de meteorologia da história de Londres. O vento arrancou partes da cobertura da arena de esportes O2. Vídeos mostram pedestres sendo arrastados pelo vento nas ruas de um bairro londrino. Voos e trens foram cancelados, e as redes de televisão exibiam as imagens obrigatórias de ondas imensas se chocando contra muros de arrimo na costa.

E no entanto foi Dyer que capturou a imaginação do público. Para qualquer pessoa que já tenha passado por uma aterrissagem complicada, as imagens dele continham momentos aterrorizantes. Alguns aviões pousaram em ângulo e os pilotos tiveram de corrigir o rumo imediatamente, quando os pneus tocaram o solo. Outros despencaram para a pista ou tocaram o asfalto sem firmeza, com as asas ameaçando raspar no chão. Por algumas horas especialmente tempestuosas, cerca de um terço dos aviões que estavam chegando ao país foram forçados a abortar tentativas de aterrissagem, e a fazer "um novo circuito", na terminologia da aviação.

Dyer, um entusiasta da aviação que criou o canal Big Jet TV como um clube para associados e filma aterrissagens duas vezes por semana, costuma misturar análises técnicas de pilotagem com trechos ocasionais de canções (ele cantou um pedacinho de "Leaving on a Jet Plane", de John Denver). Sua preferência parece ser pelos aviões de maior porte (ele definiu o Boeing 777 como "aquele garotão malvado, o triplo sete") e dedicou imensa atenção a um Boeing 747 envelhecido ("esperamos o dia inteiro por ele", disse).

Dyer fez questão de descrever a nacionalidade das companhias de aviação, dizendo em determinado momento "vamos ver como os chineses se saem", e em outro "lá vem os russos". O canal Big Jet TV é como "a Olimpíada de Inverno de pousos de aviões", afirmou Jon Sopel, antigo editor da BBC nos Estados Unidos, em uma mensagem no Twitter.

"Vamos ver como os britânicos se saem com seu 380", ele disse, quando um jato de British Airways se aproximou em meio a ventos cruzados ferozes. Dyer disse que esperava que a companhia continuasse a usar o A380, um gigante de cabine dupla que pode carregar até 600 passageiros mas saiu de moda. Declaradamente romântico, ele elogiou a empresa por pintar alguns de seus aviões em padrões históricos do passado.

"Cheire a fumaça dos pneus daquele 380, companheiro", exclamou Dyer de seu ponto de observação, do outro lado de uma cerca de proteção que isola a pista.

Nos intervalos entre aviões, Dyer fotografou um pequeno grupo de cavalos brincando nos campos, e parando ocasionalmente para esfregar seus focinhos no capô de sua picape. Ele reclamou que a força do vento era tamanha que nem conseguia beber café. Leu comentários de novos assinantes de seu canal, pessoas da Irlanda e dos Estados Unidos. E recebeu visitas de equipes de televisão.

O estilo meio tosco de Dyer às vezes incomoda algumas pessoas. Quando notícias da morte do príncipe Philip, o consorte da rainha Elizabeth 2ª, interromperam um de seus programas, em abril do ano passado, ele resmungou "longa vida ao rei, ou seja lá quem ele fosse". No dia seguinte, ele fez uma declaração pedindo desculpas, e disse ter reagido mal por conta do estresse.

Na sexta-feira (18), porém, ele estava eufórico. "Esse é o melhor cenário que você poderia imaginar", ele disse à BBC Radio. "Parabéns aos pilotos e às equipes que trabalham nos aeroportos".

Embora Dyer repetisse constantemente sua admiração pela capacidade dos pilotos, havia uma alegria inconfundível em sua voz sempre que um avião parecia estar fazendo uma aproximação especialmente complicada. "Ele não está centrado na pista", ele disse sobre um jato a Delta Air Lines cuja aproximação parecia oscilante. "Cuidado, agora", ele disse, enquanto o Boeing 737 chacoalhava sob a força do vento.

"A situação está se tornando uma loucura de novo", ele disse, com prazer inconfundível, quando o vento voltou a uivar depois de uma breve pausa. "Está um inferno por aqui! Manda ver, cara!"

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci