Linda Evangelista: Problema que 'deformou' modelo nem sempre é revertido
HAP é uma complicação causada pela criolipólise e afeta mais homens
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Linda Evangelista, uma top model da década de 1990, revelou em uma mensagem no Instagram na semana passada que ela tinha sido desfigurada por um procedimento de redução de gordura chamado CoolSculpting (ou Criolipólise em português), que terminou por fazer o oposto do prometido: em lugar de reduzir a quantidade de gordura que ela tinha no corpo, o procedimento a aumentou, ela revelou.
Depois do tratamento, Evangelista afirmou ter desenvolvido uma condição chamada hiperplasia adiposa paradoxal, ou HAP, sob a qual o tecido da área tratada cresce, se enrijece e permanece desse jeito. A HAP às vezes é descrita como “efeito manteiga em barra”, porque ela causa a impressão de que o paciente tem uma barra de manteiga oculta por sob a pele.
O tecido expandido tem formato semelhante do aplicador do CoolSculpting, um objeto longo e fino. “A HAP não só destruiu meu ganha-pão, mas me colocou em um ciclo de depressão profunda, imensa tristeza e me causou a mais amarga autodepreciação”, escreveu Evangelista.
Ela abriu um processo no final de setembro contra a Zeltiq Aesthetics, subsidiária da Allergan que comercializa e licencia os aparelhos CoolSculpting, acusando a empresa de “ocultar os riscos intencionalmente” e de não ter “alertado devidamente” os consumidores, entre os quais Evangelista, sobre eles.
O QUE É O COOLSCULPTING OU CRIOLIPÓLISE?
O CoolSculpting é um tratamento não cirúrgico aprovado pela Food and Drug Administration (FDA), agência americana de fiscalização e regulamentação de alimentos e remédios, que foi projetado para matar células de gordura perto da superfície da pele, refrigerando-as por meio de um processo conhecido como criolipólise.
Cientistas propuseram inicialmente a ideia que embasa a técnica em 2008, e tomaram como ponto de partida a existência de um fenômeno raro que afeta crianças, conhecido como “paniculite do picolé”. Quando crianças pequenas chupam picolés, suas bochechas podem desenvolver nódulos permanentes porque o frio danifica células de gordura localizadas nas proximidades.
De forma semelhante, na década de 1980 médicos descobriram que, quando mulheres andam a cavalo no frio, elas às vezes perdem gordura na região das coxas. O CoolSculpting não foi desenvolvido para ajudar as pessoas a perder peso de maneira significativa, no entanto.
“Não se trata de um tratamento criado para propiciar perda de peso”, disse o médico Paul Friedman, dermatologista em Houston e diretor do Dermatology & Laser Surgery Center naquela cidade. O método “tem por objetivo remover bolsões teimosos de gordura que não respondem a dietas e exercícios, em casos de pacientes que têm peso adequado”, ele disse.
Licenciado pela Zeltiq Aesthetics, o tratamento com o CoolSculpting pode ser ministrado por médicos —usualmente dermatologistas ou cirurgiões plásticos. Depois de aplicar gel na pele para protegê-la contra danos, um médico usa aplicadores especiais para resfriar a pele até pouco acima do ponto de congelamento, em áreas gordurosas como o queixo, abdome, coxas, braços, costas ou sob as nádegas.
O frio, aplicado à pele por 30 minutos, “mata as células de gordura sem danificar os nervos, músculos ou células epidérmicas adjacentes”, disse a médica Whitney Bowe, dermatologista que trabalha em Nova York. Em prazo de um a seis meses após o tratamento, as células de gordura morrem, disse Bowe, e os pacientes em geral veem uma redução de cerca de 20% da gordura.
É frequente que pacientes passem por dois ou mais tratamentos das áreas afetadas a fim de reduzir a gordura em 40% a 50%, eliminando pequenos bolsões adiposos e dando à área uma aparência mais definida. O custo do procedimento não é coberto por planos de saúde, e um tratamento completo em geral varia de preço entre os US$ 600 e US$ 3.000, cerca de R$ 3.300 e R$ 16.540 disse Bowe.
ATÉ QUE PONTO O COOLSCULPTING É POPULAR?
Mais de oito milhões de tratamentos com o CoolSculpting foram ministrados nos Estados Unidos até 2019, de acordo com o site da empresa criadora do método. A Sociedade Americana de Cirurgia Plástica e Estética reporta que cirurgiões plásticos certificados que trabalham nos Estados Unidos realizaram 129.686 tratamentos não cirúrgicos de redução de gordura em 2019, que o CoolSculpting e outros tratamentos que empregam ultrassom para matar células adiposas. Mas esses números não refletem a aplicação de CoolSculpting por dermatologistas, e por isso o número real de tratamentos é provavelmente muito mais alto.
Comparado a técnicas cirúrgicas como a lipoaspiração, o CoolSculpting não querer um tempo longo de recuperação, e por isso pacientes que não tenham como arcar com longas interrupções em seu estilo de vida podem preferir esse método. “Você pode se submeter a uma aplicação de CoolSculpting e depois ir à academia no mesmo dia”, disse Bowe.
QUAIS SÃO OS RISCOS ASSOCIADOS AO COOLSCULPTING?
Durante o procedimento, os pacientes podem sentir uma sensação de pressão na pele, como se ela estivesse sendo puxada –a maioria das máquinas usa aspiradores para manter a pele no lugar desejado–, e o frio pode causar uma sensação desconfortável, até que a pele amorteça durante o tratamento.
Depois da aplicação, disse Bowe, os pacientes às vezes sentem um formigamento, uma sensação incômoda que surge à medida que a sensibilidade retorna na área amortecida pelo frio.
Nos dias e semanas posteriores ao tratamento, de acordo com o fabricante, os pacientes também podem experimentar diversos efeitos colaterais passageiros, entre os quais vermelhidão, inchaço, machucados, enrijecimento, formigamento, ferroadas de dor repentinas, sensibilidade aumentada, câimbras, dores, irritação e sensibilidade na pele.
Quando os pacientes são tratados na área sob o queixo, também podem sentir uma sensação de constrição na garganta. Entre os efeitos colaterais mais raros há queimaduras causadas pelo frio, hérnias, tonturas ou dores, que podem durar semanas.
A HAP, o problema que Evangelista agora enfrenta, é mencionada pelo fabricante como mais um efeito colateral raro do CoolSculpting, mas estimativas recentes indicam que esse risco pode ser superior ao que a empresa calcula. A Zeltiq, empresa que licencia o CoolSculpting, estima que casos de HAP aconteçam uma vez a cada 4.000 tratamentos com o método.
Mas em um estudo publicado esse ano, médicos do Canadá acompanharam 2.114 pacientes que receberam um total de 8.658 tratamentos de CoolSculpting entre 2015 e 2019, e constataram que casos de HAP aconteceram em média a cada 666 tratamentos.
E quando um paciente desenvolve essa condição, ela tipicamente precisa ser tratada por meio de lipoaspiração cirúrgica, mas a cirurgia pode não resolver o problema, ou pode causar novas complicações. De acordo com seu processo, Evangelista passou por diversas cirurgias corretivas, que a deixaram com “grandes cicatrizes queloides”.
Os novos modelos de aplicador do CoolSculpting parecem mais seguros, no entanto. No estudo canadense, pesquisadores reportaram que o risco de HAP era significativamente mais baixo –ocorrendo apenas em aproximadamente uma em cada 2.000 aplicações– entre os pacientes tratados com as máquinas mais novas, provavelmente porque elas requerem menos tempo de aplicação e funcionam com aspiração menos intensa da pele, o que significa que menos força é exercida sobre os tecidos, disse Friedman.
O QUE CAUSA A HAP?
Os médicos não sabem ainda o que faz com que alguns pacientes tratados com o CoolSculpting desenvolvam HAP. As estatísticas sugerem que o risco para os homens é maior do que para as mulheres, porque 55% dos pacientes que desenvolveram HAP no estudo canadense eram homens, embora eles tipicamente representem apenas 15% do total de pacientes que recebem tratamento com o CoolSculpting.
Quanto ao que acontece com o tecido depois que a HAP se desenvolve, isso tampouco está claro. É possível que, à medida que o organismo tenta reparar o dano causado pelo CoolSculpting, outras células sejam recrutadas e outros mecanismos de reparo sejam ativados, resultando em crescimento de tecido, disse Bowe. “Mas não compreendemos realmente por que isso acontece”.
Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci