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Shoppings investem em papais noéis negros: 'Natal tem todas as cores'

Adultos pedem foto e choram, contam os aposentados fãs de samba e tricolores

Papai Noel Aylton Lafayette, 66, em shopping do Rio de Janeiro - Madureira Shopping / Divulgação
Michel Alecrim
Rio de Janeiro

O carioca Aylton Lafayette e o baiano Ubirajara Araújo estão com 66 anos. Fãs de samba, também têm em comum a paixão pelo futebol. Ambos torcem para os tricolores de seus estados --Fluminense e Bahia, respectivamente.
 
O que os une neste fim de ano, ainda, é o fato de serem negros e atuarem como Papai Noel em shoppings de seus estados. Lafayette veste a roupa do bom velhinho diariamente no Madureira Shopping, no subúrbio do Rio. Já, Bira, como gosta de ser chamado, encara o personagem no Center Lapa, na região central de Salvador.
 
A aposta desses centros de compras na diversidade tem repercutido nas redes sociais. Muitos adultos também aproveitam para tirar foto com Lafayette. "Achei uma ideia bem bacana e resolvi disseminá-la", disse o fundador do concorrido Baile "Charme" de Madureira, Jones MFjay, que postou foto no Facebook com o Papai Noel "negão".

A iniciativa de buscar a diversidade não é inédita. Um Papai Noel negro já atuou em shopping de São José dos Campos, no interior de São Paulo. Outro shopping da mesma cidade apostou em um bom velhinho que sabia a Libras (linguagem de sinais) para se comunicar com crianças surdas.
 
"É tempo de parar com a discriminação. O Natal tem todas as cores. É a festa do nascimento de Jesus, que ama a todos", afirma Lafayette, que é ator aposentado e portelense --o shopping onde atua, aliás, fica em uma região que é berço das escolas de samba Portela e Império Serrano.

Ainda solteiro e sem filhos, ele diz que não desistiu de casamento. "Ainda espero a chegada da minha Mamãe Noel". Lafayette conta que já vestiu a roupa do personagem natalino diversas vezes em eventos fechados, depois de ter feito um curso em 2005. A barba natural branca, o sorriso sempre pronto e a descontração facilitam incorporar o personagem. "Basta tratar todos com carinho e saber lidar com os imprevistos".
 
Assim como no Rio, o colega baiano Araújo conta que também muitos adultos fazem questão de tirar foto ao lado dele, muitas vezes aos prantos, porque não tiveram essa oportunidade quando crianças. Com quatro filhos, ele ainda não tem netos e está lidando com as crianças como tais. Segundo ele, há quem grite e até se jogue no chão de emoção. 
 
"Um menino negro me falou outro dia que eu era lindo porque era igual a ele. Fiquei muito emocionado", afirma Araújo. "Quando eu era criança o Papai Noel, sempre branco, chegava de helicóptero e eu nem conseguia chegar perto. Eu entendo bem a realização das pessoas aqui", explica ele, que é químico aposentado.
 
Com 1,85 metro de altura e um corpo, segundo ele, "esbelto", Araújo já atuou em trabalhos na capital baiana como figurante. A ausência de barriga é questionada pelas crianças, acostumadas com a figura nórdica barriguda.
 
"Eu brinco dizendo que venho de Madagascar, onde é muito quente, e onde tenho que me exercitar", diz Araújo, em referência ao tema da decoração do shopping, que remete à franquia de animação da DreamWorks que leva o nome do lugar.
 
Entre as crianças que recebeu, Araújo lembra de um menino autista, com quem conversou bastante. Outro chegou e ofereceu a ele uma moeda de dez centavos. "Ele disse que eu não teria condições de presentear todo mundo e que me ajudaria. Cheguei a chorar".