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Sentada num banquinho, tocando violão, de repente Gal Costa abria as pernas. Não era uma provocação. Era um gesto natural, de quem se sente à vontade no palco e no próprio corpo. Mesmo assim, foi um escândalo.
O ano era 1971, auge da repressão da ditadura militar. Caetano Veloso e Gilberto Gil, gurus da Tropicália, estavam no exílio em Londres. Mas o espírito libertário do movimento resistia em Gal, que lançou naquele ano o show e o álbum ao vivo que mudariam o rumo de sua carreira: "Fa-Tal, a Todo Vapor".
O repertório incluía faixas que se tornaram clássicas, como "Vapor Barato", "Dê um Rolê" e "Como Dois e Dois". As letras pouco têm de subversivas: são, em sua maioria, canções de amor.
Mas a maneira como Gal tornava autobiográficas as músicas escritas por outros, a atitude desafiadora que exibia em cena, tudo isso garantiu para a cantora um lugar de eterno destaque no panteão da MPB.
Gal Costa foi Anitta, muito antes da própria Anitta ter nascido. Foi, na verdade, mais atrevida do que a carioca de Honório Gurgel, pois teve a coragem de se expor num tempo ainda mais repressor que o atual, quando a censura era oficializada e qualquer manifestação contrária ao regime podia render cana.
Depois de "Fa-Tal", Gal ainda cometeria várias ousadias, como a capa do disco "Índia", de 1973: um close em sua pélvis, usando apenas uma calcinha de biquíni. Algo que Madonna copiaria muito tempo depois, no álbum "Like a Prayer" (1989).
Frequentadora assídua da praia de Ipanema no começo da década de 1970, ela ainda batizou um trecho em que as obras de construção de um emissário submarino deixaram enormes montanhas de areia revirada: as míticas "Dunas da Gal", onde o topless, os baseados e outras pequenas contravenções eram permitidas.
Gal e Maria Bethânia foram as primeiras estrelas da nossa música a se deixarem fotografar como os seios à mostra. As imagens pouco têm de eróticas, mas mostram uma nudez serena, natural. Anos mais tarde, Gal posaria para a extinta revista "Status", mas sem nu frontal. Não precisava. A revolução já havia acontecido.
Ela ainda exibiria os seios no seu show de 1994, dirigido por Gerald Thomas, ao cantar a música "Brasil" – o tema de abertura da novela "Vale Tudo", que se tornaria um de seus carros-chefes. Com uma blusa aberta e sem mais nada por baixo, Gal erguia um dos braços durante o refrão, ostentando excelente forma aos 49 anos de idade.
Mesmo assim, a exposição do próprio corpo nunca foi um dos pilares da carreira de Gal Costa. Ela teve fases em que aparecia completamente vestida, às vezes em modelitos luxuosos assinados pelo badalado estilista Guilherme Guimarães. Mas a sensualidade sempre esteve presente, ainda que só nos imensos lábios sempre pintados de um vermelho vivo.
Ao contrário de Anitta, Gal sempre foi discretíssima na vida pessoal. Fora do meio artístico, poucos sabiam que ela era casada há anos com a empresária Wilma Petrillo. Não era um segredo guardado a sete chaves, mas a cantora jamais tocava no assunto em entrevistas.
Sua morte súbita nesta quarta (9) deixou o Brasil em choque. Ainda vamos levar um bom tempo para digerir a notícia e reavaliar a importância que Gal Costa teve, e não só na música. Suas atitudes libertárias também fazem parte desse gigantesco legado.