Thiago Stivaletti

Filme reconta o dia em que atriz sofreu abuso em pleno set de cinema

Só anos depois entendemos que Maria Schneider foi estuprada por Marlon Brando em 'O Último Tango em Paris'

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Cena do filme "Meu Nome é Maria" - Divulgação

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São Paulo

O ano era 1971. O italiano Bernardo Bertolucci era um dos cineastas mais elogiados do mundo depois de rodar obras-primas como "Antes da Revolução" (1964) e "O Conformista" (1970). Ele consegue escalar Marlon Brando, 47, considerado o melhor ator do mundo, para o novo filme que irá rodar na França, "O Último Tango em Paris". Ele também escala uma atriz novata, a francesa Maria Schneider, de 19 anos, para viver a amante de Brando.

"O Último Tango" ficou marcado por uma cena muito forte, em que Brando imobiliza Schneider no chão e a sodomiza usando um tablete de manteiga, enquanto a atriz chora muito. Anos depois, ela revela que Bertolucci e Brando combinaram toda a cena sem seu consentimento, muito menos ensaio. "Foi como se eu tivesse sido estuprada por dois homens ao mesmo tempo", declarou.

Essa história de abuso sexual embalada em filme de arte aclamado por público e crítica é recontada em "Meu Nome é Maria", de Jessica Palud, exibido no Festival do Rio. Num mundo completamente dominado por homens, Brando e Bertolucci foram indicados ao Oscar pelo filme, enquanto Maria recebeu inúmeros convites para estrelar filmes eróticos, quase sempre nua em cenas gratuitas.

Lobo em pele de cordeiro


No filme, Schneider é vivida pela romena Anamaria Vartolomei, que já estrelou outro grande libelo feminista, o pró-aborto "O Acontecimento", Leão de Ouro em Veneza. Brando é vivido por Matt Dillon, de "Crash: No Limite", que reproduz à perfeição a voz rouca e o ar sempre intocável do astro.

Faz toda a diferença que "Meu Nome é Maria" seja dirigido por uma mulher. Jessica Palud refilma a cena do abuso, mas desta vez mantendo o close no rosto de Maria, a vítima que é estuprada tendo uma equipe inteira de filmagem como cúmplice e testemunha.

O filme também mostra como o episódio abalou Schneider emocionalmente por muitos anos, acentuando a sua dependência de heroína. Seu pai ausente, o ator Daniel Gélin, foi quem a indicou a um agente para os primeiros testes como atriz –mas, em vez de proteger a filha no episódio, ele se limitava a relembrar o tempo todo a "sorte" da filha em filmar com Brando e Bertolucci já em seu primeiro grande filme.

Filme obsceno


Schneider teve uma longa carreira de atriz depois do trauma, mas o único ponto alto veio três anos depois, quando filmou "O Passageiro – Profissão: Repórter" com Antonioni. Morreu de câncer em 2011, aos 58 anos.

Nos anos 1970, Bertolucci foi processado na Itália por obscenidade por conta de "O Último Tango" –mas nada ainda se falava sofre a violência sofrida pela atriz, tachada apenas de obscena. Nada mais justo que uma diretora resgatasse essa história, que mostra o quanto o cinema era (e ainda é) dominado por homens machistas.

Por falar em abuso sexual, vale conferir um dos melhores filmes brasileiros da última safra. "Manas", de Marianna Brennand, se passa na Ilha de Marajó e acompanha uma garota de 13 anos que sofre abuso dentro de casa –uma situação bastante comum para a qual as autoridades ainda fecham os olhos. O filme foi exibido no Festival do Rio e estará na Mostra de São Paulo, a partir do dia 17.

"Meu Nome é Maria"
Festival do Rio. Sexta (11), às 18h45, no Kinoplex São Luiz; sáb (12), às 21h45, no Estação Net Gávea

"Manas"
Mostra de São Paulo. De 17 a 30 de outubro. Programação em breve em mostra.org