Krishna Mahon
Descrição de chapéu Sexo casamento

Para o mau fodedor até as bolas atrapalham

A certeza dos idiotas -é mais fácil ver defeito no outro do que na gente

Obra de Adriana Eu - Instagram/adrianna.eu

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Quando me casei na igreja disse para o padre que até poderia jurar amor eterno, mas jurar passar a eternidade com o marido... Ter passado uma vida toda indo à missa com meus avós não me permitia mentir no altar e, além disso, eu não acreditava em casamentos. Não sei se por uma desconstrução dos meus pais, que flertavam com uma onda hippie a ponto de me darem esse nome, ou talvez por ter assistido de perto ao ciclo das suas paixões, ou melhor, da páh-chão deles, porque sempre havia o páh, do arrebatamento, e o chão da dura queda que ia acontecendo ao longo da relação.

Já contei aqui que sou nerd? Lembro que meses antes de me casar saí por aí perguntando para todas as pessoas casadas, que pareciam felizes, em que momento tiveram certeza de que aquela era "A Pessoa", a famosa The One.

Entre respostas questionáveis, como "sempre soube", "desde o primeiro beijo" e toda sorte de desculpas românticas demais para quem tem recursos cognitivos razoáveis, ouvi uma surpresa. Vovó disse: "nunca tive essa certeza; e só outro dia, com mais de 50 anos de casados, passei a desconfiar que a gente vai ficar junto para sempre". Escrevo esse texto duas décadas depois dessa conversa e já posso dar spoiler: eles viveram juntos até o último voo dele.

Outro dia meu podcast favorito (shhh... não fala para os outros tantos que amo e participo, porque não quero magoar ninguém), Rádio Escafandro, me contou sobre o efeito Dunning-Kruger, um viés cognitivo que leva as pessoas com pouco conhecimento sobre um assunto a passar a supervalorizar o próprio conhecimento, enquanto os experts no tema subestimam a própria capacidade.

Pensei primeiro na identidade ideológica que leva "especialista formado no Whatsapp" a lutar com toda sua força contra a vacina, e depois pensei em mim mesma, nas versões antigas. Porque é mais fácil ver o defeito no outro que na gente, né?

Lembra quão idiota e cheio de certezas a gente era na adolescência? Ah, você não era desses? Pois eu era. E justamente por ter sido bem mais burra (acredite se quiser, rs) é que fui percebendo que quanto mais idiota eu era, mais certezas eu tinha. Sabe aquele colega que dizia que tinha arrebentado na prova e tirava notas péssimas? Toda sala de aula tem um exemplo de que o idiota tem mais certezas, assim como o estudo do efeito Dunning-Kruger.

Um outro exemplo paradigmático está no elã socrático, onde o reconhecimento da ignorância é importantíssimo, pois, sem este reconhecimento, estaremos fadados a encontrar miragens de conhecimento em meio ao deserto da ignorância.

Porém, pasmem, não há registros do Sócrates dizer, ipsis litteris, "só sei que nada sei"... Descobri isso recentemente com o Zé, que em seguida me mostrou um momento d’Apologia de Sócrates que é análogo à frase não encontrada e que explica direitinho a certeza dos idiotas: "Mais sábio do que esse homem eu sou –disse Sócrates–; é bem provável que nenhum de nós saiba nada de bom, mas ele supõe saber alguma coisa e não sabe, enquanto eu, se não sei, tampouco suponho saber. Parece que sou um nadinha mais sábio que ele exatamente em não supor que saiba o que não sei".

Dos ditados da vovó, um dos meus favoritos é: "para o mal fodedor até as bolas atrapalham", rs. Então, lembrando do efeito Dunning-Kruger, se você acha que arrasa no sexo, pense duas vezes. Pode ser que você esteja personificando uma propaganda enganosa.

Boquetchy com dente (ui!). O que jura que vai fazer horrores a noite toda e não dura 3 minutos, tampouco tem energia ou jogo de cintura para seguir e ajudar a outra pessoa a pontuar. O que brada aos quatro mares ser "imbrochável" (inclusive, brochar é super saudável, tal como defendi na coluna, o problema é querer bradar para o mundo o fato de ser imbrochável), mas que na hora do "vamos ver" dobra ao meio, que nem cenoura velha na geladeira, saca? E ao invés de usar outras ferramentas, quer logo encerrar o jogo no 0 x 0. A bate-cabelo toda trabalhada na sedução, mas que pega peru com guardanapo e faz cara de nojinho para chupar. Aliás, todo mundo que ainda tem algum nojo na hora do sexo...

Sob um céu de brigadeiro, mais raro que casamentos felizes na Inglaterra, diante de uma noiva usando um vestido de réveillon, com uma maquiagem feita em menos de 15 minutos, um par de sapatos em um número maior (sim, eu com 26 ou 27 anos e papai com esperança dos meus pés crescerem), e uma completa descrença no matrimônio, Father Jeff e seu ex-coroinha, meu futuro ex-marido, se deram por satisfeitos só com as minhas juras limitadas, porém honestas.

De lá pra cá larguei esse marido e, também, algumas certezas: que sexo era mais de 50% de um casamento, que jamais trairia ou perdoaria uma traição, aliás o próprio conceito de traição mudou. Entre lealdade ou fidelidade escolho a primeira. Passei a questionar a monogamia compulsória, aquela que "vem de fábrica" sem a gente nem saber se quer e vai usando só porque todo mundo usa, a famosa pressão social, que pode até ser perfeita para alguns, mas não para todos, só que isso merece um texto à parte. E nos últimos anos, quando decidi tirar o trabalho do topo das minhas prioridades e sair daquela rodinha que o hamster corre incessantemente, passei a olhar mais para dentro, para fora, para o céu, a viver mais... E quanto mais a vida reverbera em mim, mais certezas deixo no caminho.

A Phoda Madrinha torce sempre por encontros de cabeça, coração e rabo, torce por mais certezas para os nossos krushes, porque a gente quer que o krush queira a gente, apaixonado que nem a torcida do Galo gritando "eu acre-di-tooo!", mas que a certeza seja mais em relação ao afeto, senão corre o risco de virar mais um idiota como explicado no efeito Dunning-Kruger. Então a Phoda Madrinha torce por prudência nas nossas vidas, pero no tanto, assim a gente pode ser livre até para ser iludida a ponto de acreditar no felizes para sempre.