Emma Stone fala sobre experiência de ficar nua em 'Pobres Criaturas': 'Vou virar nudista agora'
Atriz usa talento cômico de maneiras novas e ousadas sob o olhar único de Yorgos Lanthimos
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Uma coisa é chorar durante uma performance. Emma Stone pode fazer isso. O que ela não quer fazer, e o que ela se viu fazendo de qualquer maneira, é chorar no meio de uma entrevista. "Eu sou tão atriz, o que há de errado comigo?", ela disse, seus olhos se enchendo de lágrimas.
Era meados de novembro em Los Angeles e estávamos almoçando com Yorgos Lanthimos, o diretor grego com quem Stone fez as comédias distorcidas "A Favorita" e agora "Pobres Criaturas", que ganhou o Leão de Ouro no Festival de Cinema de Veneza em setembro e é apontado como um grande concorrente ao Oscar quando for lançado em 8 de dezembro nos Estados Unidos (no Brasil, o filme deve chegar apenas em 1º de fevereiro de 2024).
Baseado no romance de Alasdair Gray, "Pobres Criaturas" tem Stone como Bella Baxter, que pode ter a história de origem mais escandalosa do ano no cinema: Presa em um casamento infeliz, ela se joga de uma ponte e é ressuscitada por um cientista louco (Willem Dafoe) que troca seu cérebro pelo do seu bebê não nascido.
Stone aproveita ao máximo seu lado cômico ao interpretar essa mulher adulta com a mente de uma criança, mas o arco eventual de Bella é impressionante: à medida que ela ganha consciência, embarca em um despertar sexual e político e luta pela independência, Bella deve lidar com os pretendentes desajeitados (interpretados por atores como Mark Ruffalo e Ramy Youssef) que são atraídos pelo seu espírito rebelde, mas também buscam possuí-la.
Esse é um personagem que significou mais para Stone do que a maioria ("eu simplesmente a amo tanto", ela me disse) embora ela tenha tentado rir de como falar sobre "Pobres Criaturas" às vezes a fazia chorar. "Estou cansada, é só isso", disse Stone.
Além de "A Favorita" e "Pobres Criaturas", Lanthimos, 50, e Stone, 35, colaboraram no curta-metragem "Bleat" e na antologia cômica "And", que será lançada no próximo ano. "Obviamente, confio plenamente nele, de forma muito intensa", disse ela, "e como atriz, é a melhor sensação de todas, porque é tão raro sentir que, não importa o que você faça, você está protegida pelo seu diretor".
Lanthimos facilita essa confiança com um longo processo de ensaios que tem mais em comum com a comédia improvisada do que se poderia esperar: os atores recitam suas falas enquanto fazem rolagens de tronco, andam para trás ou fecham os olhos. "Nós nunca ensaiamos tipo: 'OK, como você vai fazer a cena e vamos apenas atuar'", disse Lanthimos. "É mais sobre criar essa atmosfera de camaradagem e se divertir, se conhecer para que possamos nos sentir à vontade em nos ridicularizar."
Alguns atores estabelecem relacionamentos de longo prazo com autores que exigem sacrificar o que os tornou estrelas de cinema: para ascender a um plano mais prestigioso, comediantes franzem a testa, belezas se sujam de lama e ídolos adolescentes falam em se torturar em nome de sua arte. Mas com Lanthimos, Stone não precisou abrir mão do timing cômico e da empatia inata que são seus maiores talentos como atriz. Em vez disso, ela coloca esses talentos em uso de maneiras novas e ousadas sob o olhar único de seu diretor.
Ainda assim, essa parceria frutífera cria uma dupla incomum pessoalmente:onde Lanthimos é impassível e um homem de poucas palavras, sua protagonista tem olhos arregalados, é calorosa e ansiosa para se conectar. Ou, como Stone colocou: "Eu sou uma garota do Arizona e ele é um cara de Atenas. Eu não sei como isso funcionou, porque nossas personalidades não poderiam ser mais diferentes, mas é incrível".
Aqui estão trechos editados de nossa conversa.
Quando vocês dois se conheceram?
EMMA STONE: Foi em junho de 2015, em um café. Eu estava em ensaios para "La La Land" e o encontrei para falar sobre "A Favorita". Eu pensei que ele seria realmente assustador e perturbado, mas ele não é. Foi uma conversa muito confortável e fácil e nos demos bem imediatamente.
Você achou que ele poderia ser uma presença mais intimidadora?
STONE: Tendo visto os filmes que ele havia feito até aquele ponto, sim.
YORGOS LANTHIMOS: Que clichê.
STONE: Eu tinha 26 anos! Eu era apenas uma criança. Mas, a partir daí, mantivemos contato e nos conhecemos um pouco. Quando estávamos fazendo "A Favorita", já tínhamos uma relação e o início de nossa amizade e, então, no final das filmagens, começamos a falar sobre "Pobres Criaturas".
Yorgos, o que estava acontecendo em sua vida quando você leu "Pobres Criaturas" pela primeira vez?
LANTHIMOS: Eu tinha acabado de me mudar para Londres e comecei a conhecer pessoas para projetos em língua inglesa. Foi depois que "Dente Canino" [2010] foi indicado ao Oscar, e as pessoas começaram a se interessar.
STONE: [brincando] Indicado ao Oscar. Todo mundo estava tipo: "Uau, esse cara é tão incrível!".
LANTHIMOS: Mas quando comecei a mostrar "Pobres Criaturas" para as pessoas, ele foi rejeitado muitas vezes para desenvolvimento.
Que motivo eles deram?
LANTHIMOS: "É muito estranho, muito estranho." Naquela época, havia a ideia de: "Ah, vamos contratar um cineasta europeu ou não-americano para fazer algo convencional, eles só vão trazer seu toque próprio para isso".
STONE: Isso ainda acontece.
LANTHIMOS: Então, isso foi bastante decepcionante porque eu era muito ingênuo ao conhecer pessoas e elas diziam: "Meu Deus, 'Dente Canino' é incrível, queremos fazer coisas com você". E então eu produzia "O Lagosta" [2016] e eles diziam: "Ah, não, não, não estamos falando de algo assim. Você não quer fazer algo mais normal?".
Emma, como Yorgos apresentou esse projeto para você?
STONE: Ele me deu uma visão geral de Bella, do que ela passa e do que os homens em sua vida experimentam como resposta à sua evolução. E eu simplesmente disse: "Me inscreva". Meu Deus, ela é a melhor personagem que provavelmente vou interpretar.
O que há nesse personagem que é tão fascinante?
LANTHIMOS: Ela é diferente de qualquer pessoa.
STONE: Ela absorve o mundo ao seu redor de uma maneira única e bela que eu só sonho em poder fazer. Eu a acho tão inspiradora, e viver isso todos os dias durante todo o processo foi o maior presente —é a maior alegria que já tive como personagem. Cada pessoa que existe tem tantas coisas que as moldaram até a vida adulta, e foi interessante descobrir que se você tirar tudo isso, tudo o que resta é alegria e curiosidade.
Conhecemos Bella quando ela ainda está no início de sua troca de cérebro: Antes uma mulher adulta chamada Victoria Blessington, agora ela é como um bebê adulto, impulsiva e infantil. Como foi incorporar essa fase?
STONE: Difícil. Essa foi a fase mais difícil para mim, porque é quando ela está no seu estado mais primitivo. Atuar é inerentemente constrangedor —esse trabalho é apenas bobo e você pode se sentir realmente estúpido. Felizmente, com Yorgos, é muito mais libertador e eu me sinto confiante porque podemos rapidamente chegar a um ponto em que dizemos: "Acho que isso não está funcionando, vamos tentar algo diferente". Além disso, posso chorar com ele se estiver surtando com alguma coisa, o que aconteceu muitas vezes.
Trabalhamos nisso por tantos anos, e realmente colocar isso em filme sempre é assustador. Acho as duas primeiras semanas de filmagem de qualquer coisa muito difíceis porque você ainda está encontrando seu caminho e o tom do que realmente é na prática, não apenas a ideia disso. Então, a primeira semana foi realmente desafiadora para me entregar a isso e confiar no processo, e acho que você sentiu o mesmo.
LANTHIMOS: Sim.
STONE: Conversávamos sobre isso todos os dias, e eu ficava pensando: "O que estou fazendo?". E você dizia: "Não sei". Ambos estávamos descobrindo quem ela era.
Como a confiança mútua de vocês se estendeu para a forma como vocês filmaram o despertar sexual de Bella?
STONE: Simplifica tudo. Sempre que havia uma cena assim, havia apenas quatro pessoas na sala, além de qualquer ator que estivesse lá. Estavam Yorgos e nosso diretor de fotografia Robbie Ryan, que me olha como se eu fosse uma lâmpada —ele já me viu nua tantas vezes, que é algo muito próximo de nada— e depois Hayley [Williams, a primeira assistente de direção], e Olga [Abramson], nossa assistente de foco. Essa era a sala.
LANTHIMOS: Às vezes, nem mesmo som. Colocávamos microfones quando podíamos e nem mesmo tínhamos um operador de boom lá. Então é muito íntimo.
STONE: E, também, [tivemos] uma incrível coordenadora de intimidade [Elle McAlpine]. Estupidamente, no começo, eu disse: "Está tudo bem [em fazer sem uma coordenadora de intimidade], eu te conheço há tantos anos". E, então, quando chegou a hora de realmente fazer todas aquelas cenas, tê-la lá foi maravilhoso —ela realmente deixou a energia calma e profissional. Mas foi estranho ver o filme no final porque fazer essas cenas foi uma experiência tão íntima e então eu pensei: "É verdade, isso está no filme!".
Mas, quero dizer, isso é Bella. Ela não tem vergonha de seu corpo, de sua sexualidade e de quem ela é, e estou muito orgulhosa desse aspecto do filme.
Isso te encoraja a permanecer nesse espaço?
STONE: Tipo ficar nua o tempo todo? Sim. Vou virar uma nudista agora, estou encorajada!
Eu quis dizer o estado mental de Bella. Você se sente encorajada quando passa tanto tempo em um personagem livre de vergonha?
STONE: Eu gostaria de poder dizer que sim. Isso ficou comigo de certa forma e, se eu pudesse viver como Bella, adoraria. É realmente difícil quando você tem sua própria história para lidar, o que aparentemente todo mundo tem, exceto ela. Mas eu a acho tão inspiradora de uma forma geral que estou sempre tentando pensar se posso ser um pouco mais como ela.
Yorgos, você atuou no filme grego "Attenberg" no início de sua carreira, que exigiu que você participasse de algumas cenas de sexo. Isso lhe deu uma perspectiva única ao dirigi-las?
LANTHIMOS: Para mim, esse aspecto nunca foi um problema. Sexo em filmes, ou nudez —eu simplesmente nunca entendi a reserva em torno disso. Sempre me deixa louco como as pessoas são liberais em relação à violência e como permitem que menores a experimentem de qualquer maneira, e depois somos tão pudicos em relação à sexualidade. Para mim, o que era difícil em ser um ator era ter que esperar muito, e é por isso que, quando faço filmes, tento ter o mínimo possível de coisas [no set]: sem luzes, sem equipamentos, sem nada. Ninguém vai a lugar nenhum, ninguém sai. Não há tempo para fumar um cigarro, porque continuamos seguindo em frente.
STONE: É por isso que você tem que mudar para o cigarro eletrônico.
Emma, você quer algo diferente dos seus projetos agora do que quando tinha vinte anos?
STONE: Espero que, quando se trata de projetos ou personagens, sempre seja uma surpresa e um pouco assustador. Mas também, o quão assustador pode ser? É atuar, não estou salvando vidas. É uma coisa tão sortuda de se poder fazer, então sentar aqui como atriz e dizer: "Isso foi tão difícil", é loucura.
LANTHIMOS: Eu também penso nisso. "Ah, estou fazendo filmes, o que há de tão incrivelmente difícil nisso?" Mas eu realmente sofro muito. O estresse.
STONE: Ele fica realmente miserável enquanto estamos filmando.
LANTHIMOS: Sim, é insano. É imenso.
E isso não diminuiu com o tempo?
STONE: Piorou.
LANTHIMOS: Você tenta racionalizar: "Por que você está tão chateado? Isso é um filme". Claro, quando você compara com outras coisas que estão acontecendo no mundo, é ridículo. Mas, para você, naquele momento, é tudo.
STONE: Além disso, muitas vezes você está em locação. Você está longe da sua vida real, está trabalhando tantas horas por dia e é tão absorvente.
Então, como foi se aproximar do fim de um projeto tão absorvente como "Pobres Criaturas"?
STONE: Eu estava um caos. Meu Deus, eu estava arrasada. Nem consegui terminar as cenas que estávamos filmando no último dia porque estava chorando tanto.
Você não queria deixar ir?
STONE: Eu queria terminar porque estávamos exaustos, mas realmente não queria terminar. Foi uma experiência tão importante para mim que me deixa triste pensar nisso agora.
LANTHIMOS: O último dia foi no estúdio, e fizemos ela pulando da ponte.
STONE: Estou ficando emocionada. Desculpe, isso é tão bobo. Bizarro. Naquele último dia, eu fiz o salto que Victoria faz da ponte quando está grávida, e eu estava tão emocionada. Você pode imaginar, se estou aqui anos depois assim!
Eu disse a Hayley, nossa assistente de direção: "Meu Deus, isso é tão triste. Estou filmando um suicídio, e é o fim do filme depois de toda essa experiência alegre". E ela disse: "Não, isso é o nascimento de Bella". Eu disse: "É o nascimento de Bella! Porque Victoria ter ido embora é o nascimento de Bella". É tão bom terminar assim.
[Limpando os olhos] Sim. De qualquer forma, foi legal. Nada demais. Filme divertido, nos divertimos, foi apenas um bom cachê.