Penélope Cruz e Antonio Banderas estrelam sátira sobre os bastidores do cinema
Em 'Competição Oficial', ela vive uma cineasta excêntrica; e ele, um ator egocêntrico
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Que as estrelas internacionais Penélope Cruz e Antonio Banderas não tivessem dividido uma tela de cinema por mais de dois minutos, até agora, é uma verdade surpreendente.
Eles contracenaram brevemente em "Os Amantes Passageiros" (2013), de Pedro Almodóvar, e embora os dois tenham estrelado em "Dor e Glória", do mesmo diretor, em 2019, seus personagens ocupavam períodos diferentes na história e por isso não tinham cenas juntos.
Isso mudou com "Competição Oficial", que tem previsão de estrear no dia 1º de julho no Brasil, uma sátira mordaz sobre a indústria do cinema e o processo criativo, dirigida pelos argentinos Gastón Duprat e Mariano Cohn.
Cruz, 48, interpreta a excêntrica cineasta de vanguarda Lola Cuevas, de vastos cabelos cacheados, e Banderas, 61, é Félix Rivero, um ator egocêntrico e frívolo que divide um filme com o aparentemente modesto, mas dedicado, Iván Torres (Oscar Martínez). Quando os três começam os ensaios para um filme de Cuevas, suas motivações inescrupulosas e egoístas vêm à tona.
Falando juntos por vídeo, de Nova York, onde eles compareceram à estreia do filme nos Estados Unidos, os atores espanhóis discorreram sobre seus papéis atípicos no novo trabalho e sobre premiações cinematográficas. Abaixo, trechos editados da conversa.
Houve outros projetos nos quais vocês tinham planejado trabalhar juntos mas terminaram cancelados por problemas de agenda ou outras dificuldades?
Cruz: Não. É a coisa mais estranha. Não houve outras coisas para as quais tenhamos sido os dois convidados e que um de nós pôde fazer, mas o outro não. Pedro [Almodóvar] às vezes nos fala de ideias sobre coisas que gostaria de fazer conosco. Ele provoca, falando sobre a possibilidade de refilmar "Casamento à Italiana". Adoraríamos trabalhar nisso com ele, mas nunca sei se ele está só brincando ou se a possibilidade é real.
Antonio, entre Félix, obcecado pela fama, e o condescendente Iván, quem você preferiria ser?
Banderas: Félix é arrogante e frívolo, mas também é inteligente. Se tivesse de escolher entre um dos dois atores do filme, eu provavelmente continuaria a escolher Félix, mesmo. Iván é matreiro e finge ter uma ideologia purista quanto à arte, mas, assim que a pessoa se distrai, ele é o tipo de cara que roubaria sua carteira. Ele é um personagem perigoso. Quando Iván finge receber um prêmio, diante do espelho, ele representa como as pessoas, na indústria do cinema mas ainda mais na política, são capazes de se tornar exatamente aquilo que mais criticam.
Vocês conheceram alguém parecido com Lola e viram táticas como as que ela usa, em suas carreiras?
Banderas: As artes, e a indústria cinematográfica especialmente, são um mundo subjetivo no qual existem muitos impostores. É fácil se esconder por trás da subjetividade, em nosso ramo. Por exemplo, nas grandes escolas de atuação, como os métodos Stanislavsky ou Stella Adler, as técnicas que ajudam, os atores vêm de décadas de testes. Mas existem muitos trapaceiros que tentam processos extraordinariamente bizarros e dizem que a verdade da atuação está por trás dos ensinamentos que vendem. E há pessoas ingênuas que compram isso.
Penélope, quem você estava canalizando ou imitando ao retratar Lola uma personagem cheia de caprichos?
Cruz: Não posso mencionar os nomes, mas me inspirei em algumas pessoas, embora nem todas da indústria do cinema e nem todas mulheres. Os diretores e eu assistimos a muitas entrevistas em vídeo dessas pessoas para anotar as coisas absurdas que elas diziam [risos]. Criei um personagem Frankenstein, baseado nelas e em tudo que compartilhamos sobre as coisas mais estranhas que já aconteceram conosco em sets de filmagem.
Qual foi a utilidade daquela peruca, tão vistosa, em sua transformação?
Cruz: A peruca me ajudou muito, porque, quando Lola entra em uma sala, ela quer ser vista. Ela sempre acredita que aquilo que tem a dizer é mais interessante do que o que qualquer outra pessoa tem a dizer. Ela não é boa em ouvir os outros, e vive muito solitária, porque seu ego a devora. É uma pessoa insuportável, mas interpretá-la foi divertido demais.
Em uma cena, Lola tortura os atores destruindo os troféus mais preciosos que eles já receberam. O que vocês sentem, sobre a importância das premiações, com relação àquela cena?
Cruz: Eu curti muito aquela cena. Mas porque alguns dos troféus eram nossos prêmios reais, não quis enlouquecer de vez e quebrá-los de verdade, por acidente, porque trabalhamos muito para conquistá-los. Eles têm valor, e temos de ser gratos por eles.
Banderas: Mas, se pensarmos bem, o troféu é uma materialização de alguma coisa que já lhe foi dada. O que significa que, se você ganha um Oscar, pode guardá-lo em sua casa de campo, deixá-lo no topo de uma árvore ou perder a estatueta, mas o fato de que você o recebeu continuará a fazer parte da história do cinema. Nosso apego à materialização do momento é extraordinário, e o que Lola faz talvez seja uma das cenas mais coerentes do filme, como se dissesse "larga a mão, cara! Isso é simbólico! Mesmo que eu destrua o troféu, você já ganhou o que quer que ele represente". É engraçado o quanto amamos medalhas e coisas reluzentes.
Cruz: Não acho que Lola analise a coisa assim, Antonio. Ela destrói os prêmios que ela mesma recebeu, mas, ao mesmo tempo, é capaz de refilmar o filme inteiro com Félix fazendo os dois papéis. Ela sabe exatamente o que aconteceu com Iván. Mas não faz perguntas porque não deseja saber a verdade. A única coisa que a interessa é levar o filme adiante. Ela continua a se importar com os prêmios mais do que com qualquer outra coisa em sua vida.
Vocês guardam seus prêmios em algum lugar especial?
Cruz: Não, só em casa. Mas quando eu tinha acabado de receber o Oscar, o levei comigo para a praia por alguns dias.
Banderas: Ele precisava se bronzear [risos].
Tradução de Paulo Migliacci