Cinema e Séries
Descrição de chapéu The New York Times Filmes

Jonathan Bailey fala de projetos e como 'Bridgerton' catapultou sua carreira

Ator destaca sua formação no teatro e clareza sobre sua sexualidade

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Londres

Jonathan Bailey, 33, tem pensado muito sobre Tupperware. Não necessariamente sobre a capacidade do produto para guardar comida –ainda que essa função tenha servido bem ao ator recentemente, já que ele vem se transferindo rapidamente de produção a produção—, mas sim sobre como ele vem guardando elementos diferentes de sua vida em caixinhas que sempre parecem pequenas demais, e que não têm o formato perfeito.

Esse tipo de compartimentação "não é a coisa mais confortável que alguém pode fazer, especialmente no final de uma pandemia", disse Bailey, em uma entrevista recente. Mas, para sobreviver, é algo que se tornou necessário.

Essa necessidade surgiu quando ele rapidamente se tornou um dos astros emergentes de "Bridgerton", o drama romântico de época da Netflix que conquistou imenso sucesso. A série combina elementos amenamente subversivos —personagens femininas que têm conversas intelectuais e orgasmos, e um elenco que inclui pessoas não brancas– a casos de amor escaldantes.

A segunda temporada, recentemente lançada, tem por foco a busca de Anthony Bridgerton, o personagem de Bailey, por uma cônjuge, e seu envolvimento com Kate (Simone Ashley). A Netflix diz que a temporada bateu recordes de audiência, e agora há páginas de fãs de Anthony Bridgerton superlotando a internet.

Mas Bailey não se deteve para desfrutar da aceleração repentina de sua fama. Em lugar disso, está seguindo o conselho que recebeu quando tinha 23 anos do diretor de teatro Nicholas Hytner: não pare de trabalhar. No momento, isso significa se colocar à mercê de uma audiência do West End londrino quase todas as noites da semana. Ele estrela a peça "Cock", de Mike Bartlett, que trata de questões de orientação sexual e identidade por meio da história de um romance malfadado entre dois homens –um dos quais se apaixona por uma mulher.

Nas últimas semanas, Bailey vem se alternando entre o trabalho na promoção de "Bridgerton", durante o dia, e noites no palco. O estresse de fazer as duas coisas "faz com que de alguma forma elas se cancelem, porque são ambas tão intensas", ele disse.

A produção de "Cock" também vem sendo afetada por diversos problemas; Taron Egerton, o outro astro da peça, desmaiou no palco certa noite, contraiu Covid-19 e depois teve de abandonar o projeto de vez, mencionando "razões pessoais". Mais recentemente, Jade Anouka, a outra colega de cena de Bailey, também passou por um teste positivo de coronavírus, o que significa que ele vem trabalhando a cada noite com dois atores substitutos.

Mas apesar de tudo isso o ator perseverou. Em uma apresentação recente, ele se movia pelo palco com a graça sólida de um bailarino, e lidou habilidosamente com um espectador embriagado que o apupou durante um monólogo sobre se a orientação sexual era genética. Bailey fez uma breve pausa, olhou diretamente para a plateia e disse sua linha seguinte de texto como se estivesse falando com o encrenqueiro.

"É empolgante quando a audiência sente que pode responder da maneira como realmente deseja, porque significa que algo de animal está acontecendo", disse Bailey sobre o incidente.

O teatro é o lar de Bailey como ator, e ele credita a "alquimia" de "Bridgerton" em parte ao fato de que muitos dos atores –entre os quais Adjoa Andoh, Luke Thompson e Ruth Gemmell– têm formação teatral.

Bailey cresceu em Wallingford, uma cidade próspera a meio do caminho entre Londres e Oxford, e se descreve como "uma criança criativa e expressiva", apaixonada por balé e que sabia que queria ser ator desde muito pequeno.

Ele foi escalado para uma produção de "Um Conto de Natal", de Dickens, pela Royal Shakespeare Company aos oito anos de idade, depois de ser descoberto em uma aula de teatro em sua cidade. Mas Bailey descreve o período seguinte de sua carreira como "lento": aos 15 anos, ele trabalhou em seu primeiro filme importante, "5 Criaturas e a Coisa", e assinou com uma agência de talentos. Aos 23 anos, ele trabalhou em "Othello", no National Theater de Londres e enfim decidiu que conseguiria ganhar a vida como ator. Aos 25, ele estava começado a fazer sucesso no Reino Unido como um dos atores principais na série policial "Broadchurch".

Marianne Elliott, diretora de Bailey em "Cock", o descreve como um ator ousado. "Ele é uma das pessoas mais amáveis que você pode conhecer", ela disse. "Mas quando atua há algo de agressivo nele, que pode até parecer perigoso, mas de um jeito ótimo. E há imprevisibilidade". Os dois trabalharam juntos inicialmente em uma produção de "Company", musical de Stephen Sondheim, no qual os gêneros dos personagens principais eram invertidos; o espetáculo valeu um prêmio Olivier para Bailey em 2019.

Elliott disse que Sondheim se encantou com Bailey. Três dias antes de o dramaturgo e compositor morrer, no ano passado, Elliott lhe disse que Bailey estrelaria em "Cock". Sondheim "literalmente parou no meio do caminho, fechou os olhos, levou as mãos ao peito e disse ‘não sei se meu coração aguenta’", disse Elliott.

Em pessoa, Bailey parece charmoso e sincero. Sentado em uma sala confortável de um hotel de luxo no centro de Londres e vestido confortavelmente em shorts, uma camiseta cinzenta e um casaco aconchegante ele tinha uma expressão muito mais suave do que a turbulenta fúria que caracteriza boa parte da busca de Anthony Bridgerton por uma cônjuge.

"Foi só quando começamos a gravar a temporada dois que percebi exatamente" o que era preciso para fazer a transição a um papel principal, disse Bailey. "Se estamos falando de Tupperware, isso é algo que precisa ir para aquela caixa bem grande".

Os atores mais jovens que interpretam os irmãos mais novos de Anthony talvez venham a ter papéis principais em futuras temporadas de "Bridgerton", e por isso Bailey escreveu um guia para eles com o título de "Como Sobreviver a Se Apaixonar Diante de 82 milhões de Domicílios", ele disse por email. A ideia do guia é ajudá-los a "manter a sanidade e o equilíbrio no set", disse o ator, e o texto trata dos aspectos práticos da interação com a equipe e de com quem conversar se eles sentirem que as coisas não estão correndo bem.

Perguntado se considera a sua função como a de um mentor, Bailey preferiu contornar a questão. "Não importa de que irmão Bridgerton estejamos falando, estou propondo uma conversa que com sorte os ajudará a se sentirem mais sólidos e preparados", ele disse, com jeito de mentor.

Nicki van Gelder, que é agente de Bailey desde que ele tinha 15 anos, riu quando informada dessa reticência. Bailey, ela disse, tem "uma grande generosidade para com outros atores", e é um exemplo importante para os atores menos conhecidos que ela representa, por não ocultar sua sexualidade. "Acho que isso certamente ajudará atores mais jovens" a se assumirem publicamente, disse a agente; "Tenho um par de atores mais jovens com os quais discuti o assunto. Eles comentaram que ‘Jonny assumiu, isso é OK?’, e eu respondi que absolutamente sim".

Em seu discurso de agradecimento pelo prêmio Olivier, Bailey falou apaixonadamente sobre a importância da representação LGBT. "Se posso ocupar espaços que eu não tinha quando mais jovem, sinto que isso é realmente brilhante", ele disse.

Depois de seu trabalho em "Bridgerton" e "Cock", Bailey disse que agora está empolgado "em pensar nos meus novos projetos e sobre como posso lidar com diferentes versões de minha compreensão da representação".

Ele tenta em geral manter "instintos afiados", disse Bailey, na seleção de novos trabalhos. O ator trabalhou em séries criadas por Phoebe Waller-Bridge e Michaela Coel mais cedo em suas carreiras, e prioriza trabalhar com pessoas que ele tem "em alta estima, pessoas empolgantes e envolventes", disse. "E o mais frequente é que essas pessoas garantam que seus elencos sejam bem diversos".

A diversidade é importante para Bailey. "Se você é inerentemente uma pessoa que está fora da sociedade –não posso falar de raça, obviamente, mas em termos de sexualidade e queerness—, você tem aquele acesso à empatia", disse. "E o que vem com a empatia é uma atitude brincalhona, uma capacidade de ver de onde as pessoas vêm, e a segurança para encontrar a alegria dentro disso".

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci