Criadores de 'And Just Like That' comentam final e possível continuação
Revival de 'Sex and the City' termina sem 2ª temporada confirmada
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ALERTA: Esse texto inclui spoilers leves sobre o episódio final da temporada
Carrie atendeu ao chamado. Miranda seguiu seu coração. E Charlotte enfim se tornou mulher. Mazel tov!
"And Just Like That..." lançou o episódio final de sua primeira temporada na semana passada, no serviço de streaming HBO Max. A nova série levou três das personagens de "Sex and the City" à Manhattan da era pós-pandemia e lhes deu novos amigos, novos hábitos, novos chapéus. Em relação ao original, houve menos sexo e mais morte e perdas.
"Os espectadores tiveram de passar por muita coisa", disse Michael Patrick King, o showrunner da série, em uma conversa recente por vídeo. "Muita gente reagiu como se fosse uma ducha forte de emoções. Fez bem para eles, mas também doeu!"
Desde o primeiro episódio, que mostrou a morte de Mr. Big (Chris Noth) depois de um ataque cardíaco causado por uma sessão de exercícios em uma bicicleta Peloton, a série gerou respostas passionais, e os espectadores correram à mídia social a fim de dissecar os relacionamentos, as roupas, o uso do termo "concerto de comédia".
As acusações de agressão sexual contra Noth, que surgiram dias depois da estreia de "And Just Like That...", complicaram ainda mais a recepção à série. (O ator teve sua imagem cortada de uma sequência que o mostraria em um sonho, no episódio final da temporada.) Cada episódio subsequente parece ter resultado em uma nova leva de artigos analíticos sobre o significado de tudo que estava acontecendo.
"Ter uma base de fãs tão incrivelmente engajados, que se importam tão profundamente com os personagens, como se eles fossem pessoas reais, é algo muito difícil de atingir", disse Julie Rottenberg, uma das roteiristas da série. "Por isso, aceitamos com agrado a paixão e até a raiva –e as vemos como sinal de que fizemos alguma coisa certo".
Ainda não surgiu um anúncio de se a série vai voltar para uma segunda temporada. Por isso, se você ainda tem perguntas pendentes sobre o vizinho de baixo de Carrie ou o compromisso de Miranda para com a justiça social ou a batalha de Charlotte por controlar o conselho da escola de seus filhos, elas podem ou não vir a ser respondidas.
Mas poucos dias antes de o episódio final ser exibido, King, acompanhado por Rottenberg e por Elisa Zuritsky, que escreveram juntas o episódio final, participou de uma conversa em vídeo para discutir constância, mudança, justiça para Steve e as esperanças de uma segunda temporada (tudo isso acompanhado por leves "spoilers"). Abaixo, trechos editados da conversa.
O que vocês pretendiam realizar com esse episódio final?
King: Transportar as pessoas a algum lugar em que elas não estavam no primeiro episódio, levá-las em uma viagem. Para Carrie (Sarah Jessica Parker), o objetivo era conduzi-la da escuridão à possibilidade de alguma coisa nova. Para Miranda (Cynthia Nixon), era levá-la a um ponto em que ela estava autorizada a ser não uma coisa só, mas muitas coisas. E, por fim, para Charlotte (Kristin Davis), queríamos que ela enfim deixasse de lado suas ideias infantis de perfeição e se tornasse uma mulher, não uma menina.
O tom adotado no episódio foi conscientemente mais leve? Ninguém morre. Ninguém passa por uma cirurgia de bacia.
Zuritsky: Eu não percebi uma virada consciente de tom. Senti que tivemos uma progressão de leveza e de humor ao longo da história toda.
O Mr. Big de Chris Noth, que morre no final do primeiro episódio, originalmente apareceria no episódio final como parte de uma sequência onírica. Até que ponto vocês cortaram e alteraram essa sequência?
King: A conversação sobre a cena do sonho terminaria por importar mais que o sonho. Há sete desempenhos magníficos no episódio final que nada tem a ver com aquilo que aconteceu cinco meses atrás. E, para ser bem franco, sonhos são sempre complicados, artisticamente. Por isso, na sala de edição, a pergunta que tivemos de responder era se a sequência de sonho estava realmente funcionando, e se valia a pena mantê-la e enfrentar todas as reações da imprensa que teriam a ver não com ela ser maravilhosa, ou sobre o final ser interessante. Por isso, o que aconteceu foi que agora é Carrie que está no sonho.
A sessão começou com o ataque cardíaco de Mr. Big. Por que matar o personagem?
King: Pelo crescimento de Carrie. E para fazer alguma coisa de radical e novo. A última narração em off de Carrie em "Sex and the City" é ela afirmando que o relacionamento mais significativo de todos é o que você tem com você mesmo. E era nisso que eu estava realmente interessado, desde o começo, o relacionamento significativo de Carrie com ela mesma. E também em uma situação incrivelmente interessante: Carrie Bradshaw, solteira de novo aos 55 anos. E 90% de "Sex and the City" era Carrie sem Big, mas desejando tê-lo ao seu lado. Por isso, a ideia de que ele partiria –estaria em algum outro lugar, inatingível– parecia muito autêntica.
Rottenberg: A verdade é que mudanças acontecem. A realidade é assim. Aquilo me pareceu a coisa mais real que poderíamos ter feito. Parecia um encaixe completamente orgânico com coisas que infelizmente costumam acontecer, para pessoas nessa idade.
Depois da exibição do primeiro episódio, surgiram acusações de agressão sexual contra Chris Noth. Isso mudou a maneira pela qual as pessoas recebem a série?
King: Com todo respeito, se eu não coloquei Mr. Big no episódio final, também não vou dedicar mais tempo nessa entrevista a falar sobre por que ele não está na série.
Na mídia social, vi pessoas descreverem "And Just Like That..." como "uma série que assisto por ódio". Essa reação os surpreendeu?
King: Amo aquilo que fizemos. "Assistir por ódio?" Nem sei o que isso significa. Tenho certeza de que existe um grupo de pessoas que assistem por amor, e posso afirmar que elas mal podem esperar pelo episódio da semana seguinte, e estão muito felizes por as meninas estarem de volta.
Zuritsky: Um dia desses, eu estava assistindo a um episódio de "Get Back", o documentário sobre os Beatles, e comecei a pensar em nossa série como se fosse uma banda. Se uma banda lança um disco novo depois de uma pausa de muitos, muitos anos, a reação inicial muitas vezes é "calma lá, onde está minha canção favorita? E isso tem um som diferente demais!" A coisa pode ficar desconfortável.
King: Nós tiramos a narração em off. Carrie, na velha série, tinha o papel de uma supervisora. Resumia a coisa toda para quem assistia. Havia uma proteção. Ao remover a narração, nós jogamos a audiência no meio do desconhecido que Carrie está enfrentando. Talvez as pessoas estejam sentindo uma pontinha de desconforto por não haver alguém resumindo as coisas para elas.
Li um artigo que diz que a série faz com que a meia-idade pareça realmente horrível. É verdade?
Rottenberg: Do mesmo jeito que fazíamos 20 anos atrás, sempre escrevemos com base em nossas experiências. Por isso, tudo que aparece na série é algo que realmente aconteceu. Infelizmente, estamos cercados de casais que se divorciaram, e conhecemos pessoas que morreram, ou passaram por cirurgias de bacia. Nós temos uma afinidade para com esses desafios que a vida traz; e sempre encontramos algo de engraçado neles. Sentimos que precisávamos ser fiéis àqueles personagens e ao que estaria acontecendo com eles na idade que têm agora.
Vocês acham que trataram Steve com justiça? Ele parece um velhote.
Rottenberg: A ideia de ele ter de usar aparelho auditivo veio da vida real, como todas as demais histórias que contamos. David Eigenberg (o ator que interpreta Steve) usa um aparelho auditivo. Para mim é incrível que isso seja apontado como coisa de homem velho. Na verdade, não é. Isso é real. E quero dizer realmente real.
Com a morte de Mr. Big e Miranda deixando Steve, será que a série está dando a entender que as personagens não podem crescer e mudar se continuarem casadas?
Zuritsky: No caso de Charlotte e seu casamento, nessa temporada nós não os acompanhamos passando por grandes dificuldades de relacionamento.
King: De propósito. Por escolha.
Zuritsky: O casamento dela está vivo e bem, e parece estar prosperando. No caso de Miranda e Carrie, tivemos uma oportunidade de explorar outras avenidas de crescimento na meia-idade.
King: Nós três estamos envolvidos em relacionamentos de longo prazo. Não acredito que não possa existir crescimento pessoal ou incentivo a crescer se você se mantiver em um relacionamento longo. Mas, a fim de permitir que a série avançasse, precisávamos mudar alguma coisa. O engraçado é que as pessoas querem que a série seja aquilo de que elas se lembram. E agora duas das mulheres estão solteiras!
Vocês apresentaram quatro novas personagens —Nya (Karen Pittman), Seema (Sarita Choudhury), Lisa (Nicole Ari Parker) e Che (Sara Ramirez). E imaginavam que elas se tornassem novos personagens principais da série. Acham que conseguiram concretizar isso?
King: As pessoas conhecem Miranda há 20 anos, e conhecem Nya há 20 minutos. É uma prova de nossas intenções o fato de que fizemos delas pessoas reais, com vidas e problemas, e que conseguimos mostrar isso. Tudo é uma evolução. As pessoas sabem os nomes delas, sabem um pouco sobre elas, sabem mais do que sabiam 10 episódios atrás. Elas existem e gostamos delas. Se tivéssemos mais tempo e mais episódios, elas definitivamente estariam mais presentes.
Rottenberg: Tivemos de descobrir de que maneira manter sete bolas no ar simultaneamente, em uma quantidade finita de tempo.
Zuritsky: Certamente há mais a descobrir sobre todas elas.
Caso haja uma temporada dois, o que vocês gostariam de fazer, nela?
King: Sempre começamos cada temporada de "Sex and the City" com a mesma regra: nada de repetição.
Ou seja, Carrie não vai ter de operar a bacia de novo?
King: Para começar, aquilo era um defeito congênito. Mas a verdade é que tentamos não nos repetir. É uma mina de ouro a que você pode recorrer. Gostamos das pessoas, e elas são todas complicadas. Algumas têm mais defeitos do que as outras. E algumas têm defeitos que ainda não foram revelados. Por isso, quem é que sabe para onde a história pode ir?
Zuritsky: Miranda, quando estava no sofá dizendo a Steve que queria se separar dele, tem um diálogo importante: "Mais. Eu quero mais. Mais sexo, mais energia, mais tudo, mais, mais, mais". É isso que eu gostaria de ter na série.
Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci