Inspirado em livro de Erasmo Carlos, 'Minha Fama de Mau' resgata sucessos dos anos 1960
Filme conta história das canções do músico e da Jovem Guarda
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Ao falar de “Minha Fama de Mau”, que estreia nesta quinta (14) e é inspirado na autobiografia de Erasmo Carlos, o diretor Lui Farias não tem dúvidas. "O filme está preocupado em contar a história das músicas. E daí a trajetória do cantor, do autor."
Pode parecer estranho ler algo assim sobre uma obra que se baseia em episódios da vida de um artista, mas a trilha sonora ganha mesmo destaque na produção. Antes do início das filmagens, ocorridas em 2015, o primeiro passo de Chay Suede (que encarna o Tremendão na trama), Gabriel Leone (Roberto Carlos) e Malu Rodrigues (Wanderléa) foi gravar em estúdio faixas dos anos 1960, que seriam utilizadas no longa –a trilha sonora registrada pelos atores está nas plataformas digitais.
Acompanhados pela atual banda de Erasmo, eles cantaram clássicos como "Prova de Fogo", "Festa de Arromba" e "Devolva-me". "Foi muito divertido reinterpretar essas músicas, buscando pontos de conexão com os intérpretes originais e, ao mesmo tempo, podendo dar a nossa cara, dos dias de hoje", diz Suede.
Na tela, é possível ver os três soltarem a voz em reprodução do cenário do programa Jovem Guarda. Ou Chay Suede apresentando "Gatinha Manhosa" a um executivo e ao público de um bar. Ver o filme é mergulhar na cena musical do período. Nele, tem o "Clube do Rock", atração do rádio e da TV comandada por Carlos Imperial (1935-1992), papel de Bruno De Luca.
É possível ver Tim Maia (1942-1998), ainda o garoto Tião, construindo uma melodia no violão, na pele do ator Vinicius Alexandre. E ouvir nomes como Renato e Seus Blue Caps e Eduardo Araújo.
Imagens de arquivo fazem a festa de quem gosta do tema. Em meio à trama, flagra-se trecho da abertura do filme "Roberto Carlos em Ritmo de Aventura", de 1968, dirigido pelo pai de Lui, o cineasta Roberto Farias (1932-2018), e também o cantor Bill Haley (1925-1981) e seu grupo His Comets no Brasil, em 1958.
A apresentação do americano no país, aliás, pode ser considerada uma espécie de Gênesis do rock nacional. Como Roberto faria um dos shows de abertura, precisava de repertório e encontrou em Erasmo uma fonte de letras de canções gravadas por Elvis Presley (1935-1977). O episódio faz parte de "Minha Fama de Mau" e dá início à parceria entre os dois.
Para Gabriel Leone, captar toda essa ebulição cultural era o caminho das pedras na hora de atuar. "Fomos entender essa época que eles viviam, a energia que tinham. Sempre pautados em não imitar esses personagens, e, sim, em construir nossas visões deles."
Em uma das cenas do filme, Erasmo, Roberto e Wanderléa vão a uma reunião no Copacabana Palace, no Rio, para acertar um contrato com a Record. Logo, passariam a se apresentar no teatro da emissora, em São Paulo, diante de uma multidão enlouquecida. Era o começo do programa Jovem Guarda, em 1965.
Àquela altura, a bossa nova já se tornara internacional, com o show que artistas como João Gilberto e Tom Jobim (1927-1994) fizeram no Carnegie Hall, em Nova York, em 1962. E uma das pioneiras do rock no Brasil, Celly Campello (1942-2003), do sucesso "Banho de Lua" (1960), estava saindo de cena.
A Jovem Guarda levantava voo e estourava na TV e no rádio. Em um dos momentos do longa, a cantora Paula Toller surge para fazer Candinha, apresentadora de uma atração radiofônica cheia de fofocas sobre o trio formado por Tremendão, o rei Roberto Carlos e a Ternurinha.
"Minha Fama de Mau" mostra o panorama cultural brasileiro dos anos 1950 até o fim dos 1960 e tem uma forte influência da linguagem dos quadrinhos. Com direito a cenas de desenhos e balões dominando a tela. "Esses detalhes vieram depois que eu percebi, nas letras de música que Erasmo faz, símbolos como a Luluzinha, o Bolinha, o mocinho do bangue-bangue", conta o diretor da produção, Lui Farias.
Erasmo Carlos é fã de HQs e até hoje demonstra disso. Basta lembrar da música "Olhar de Mangá", termo inspirado nos quadrinhos japoneses, de 2009. Já em relação a caubói, o maior ídolo do Tremendão e de Roberto Carlos era Bob Nelson (1918-2009), o "Vaqueiro Alegre”. Artista que se vestia como se estivesse em um faroeste e cantava country em português, ele ganhou homenagem dos dois em “A Lenda de Bob Nelson”, lançada em 1974.
Chay Suede, que vive o Tremendão, diz imaginar como era, em suas palavras, a “enxurrada de informações” da época. “Cinema acessível, música, moda, os arquétipos do valentão, da juventude transviada”, enumera. “Aquilo estava na cabeça deles e é óbvio que tentavam imitar.”
Na conversa, o ator faz referência a sequências da primeira parte do longa, em que se caracteriza como o Erasmo dos tempos de Tijuca, com topete e fazendo poses com o violão em frente ao espelho.