'Não devemos nos intimidar', diz Camila Pitanga após vencer ação na Justiça Eleitoral
Atriz foi acusada de boca de urna por declarar voto nas redes sociais
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Foi com a sensação de que a justiça foi feita que Camila Pitanga, 44, recebeu na terça-feira (31) a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio de Janeiro que, por unanimidade, a absolveu da acusação de crime de boca de urna.
A artista havia sido denunciada pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) por uma publicação que ela fez no Instagram, em que declarou seu voto em Benedita da Silva (PT), sua madrasta, para prefeita da cidade nas eleições de 2020.
"Eu não vejo esse processo de outra forma que não uma maneira de silenciamento. A Justiça Eleitoral tem regras, e eu não infringi nada. Qualquer cidadão tem o direito de poder exercer a sua voz, tem o direito de falar da sua escolha política, seja nas redes sociais ou em uma entrevista", diz a atriz ao F5.
A publicação alvo da denúncia é do dia 15 de novembro de 2020, primeiro turno das eleições municipais, quando Camila postou uma foto de Benedita e do seu pai, Antonio Pitanga, e escreveu na legenda que votaria nela. "Minha madrasta, amiga, família, mulher e cidadã que trabalha e pretende trabalhar ainda mais para que o Rio de Janeiro volte a ser uma cidade maravilhosa."
Para o MPE-RJ, a atriz teve o objetivo, com a publicação, de arregimentar eleitores para a candidata. A Promotoria sugeriu a suspensão condicional do processo desde que Camila pagasse R$ 64 mil por dano moral coletivo, deixasse o Instagram enquanto o processo estivesse paralisado e ficasse proibida de deixar o Rio sem autorização da Justiça Eleitoral.
Em um primeiro momento, a 211ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro rejeitou a abertura de ação penal eleitoral. O MPE-RJ entrou com recurso, que foi rejeitado na terça-feira pela relatora, a desembargadora Alessandra Bilac Pinto. Ela votou por absolver sumariamente a atriz, e foi acompanhada por todos os demais integrantes do TRE-RJ.
Na decisão, o tribunal seguiu o entendimento que “declaração de voto em rede social é manifestação da liberdade de pensamento e não constitui propaganda eleitoral quando não ficar configurada panfletagem ou impulsionamento”.
Para Camila, é um absurdo a acusação e o que a Promotoria exigia para a suspensão condicional do processo. "Não poder sair da cidade porque eu emiti uma opinião no Instagram? Como assim? Para onde estamos caminhando?", indigna-se.
"Acho que essa sentença é exemplar ao mostrar que a Justiça está fazendo o seu papel de delimitar, de não entrar neste campo golpista, de delírio, que não respeita a liberdade de expressão das pessoas, a liberdade de pensamento", completa.
"Você não pode odiar uma pessoa porque ela pensa diferente de você", enfatiza. Para os advogados da atriz, Geraldo Prado e Antonio Pedro Melchior, a acusação apresentada contra a artista reflete o contexto de intolerância que o Brasil vive.
"Tem coisas tão mais graves de pessoas disseminando mentiras, fake news. Isso precisa ser eliminado da nossa prática social. Isso sim precisa ser combatido. Agora a pessoa emitir uma opinião afetiva, porque ainda tem isso, a dimensão do afeto que eu tenho com a Benedita obviamente. E eu não posso falar disso?", questiona Camila.
A atriz reforça ainda que, embora tenha ficado "estupefata" ao saber do processo, em nenhum momento ela se sentiu intimidada ou com medo de se manifestar em suas redes sociais por causa do processo. "Pelo contrário", afirma.
"Mais do que nunca, a gente não deve se intimidar. A gente tem que confiar na Justiça, no rito democrático, no rito da lei, para coibir esse tipo de delírio, de obscurantismo". Camila cita o escritor Guimarães Rosa, ao destacar que o momento "pede coragem".
POSICIONAMENTO
Camila Pitanga critica abertamente o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e, na visão dela, se posicionar no momento atual "é uma necessidade". A atriz pondera, porém, que respeita muito quem não se sente "com musculatura para sustentar uma opinião".
"Mas, dentro dos limites de cada um, é necessário se posicionar", diz. E isso, completa ela, não precisa ser publicamente. "Por exemplo, se você recebe uma fake news no grupo da família, você não pode ser omisso, você tem que se colocar, tem que lançar luz sobre essas coisas que se apresentam nas relações mais do cotidiano, da sua família, do seu amigo."
Para ela, isso deve ser feito a partir do diálogo, e não do confronto. "Acho que a democracia é isso, é o exercício pleno das diferenças num sistema. Não é para um ter a sua voz maior que a do outro. A escuta é necessária", acrescenta.
Camila vê o movimento dos povos indígenas que estão em Brasília protestando contra a alteração da política de demarcação de terras indígenas como uma inspiração. "É daquele lugar de dignidade, força, coragem que eu acho que o Brasil precisa se colocar, de não se intimidar por essa maluquice que estão querendo estabelecer no nosso país", destaca.