Ex-Trem da Alegria, Amanda Acosta segue carreira no teatro: 'O palco cura'
Atriz e cantora conta que entrar no grupo infantil foi realizar um sonho
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Quem cresceu nos anos 1980 e teve vontade de ser uma das paquitas da Xuxa; morria de curiosidade para saber o que tinha dentro das caixas que as crianças ganhavam, quando venciam uma competição em um programa infantil; achava que ir à Disney era acessível ao assistir às propagandas da Tia Augusta Turismo; sonhou em atuar em novelas ou cantar em alguma banda infantil, saiba que não está só.
Se no rock nacional Cazuza, Legião Urbana e Titãs estavam entre os artistas mais bem sucedidos do Brasil, no mercado fonográfico infantil, não tinha para ninguém: quem comandava era o Trem da Alegria. A banda emplacou hits como "Uni Duni Tê", "He-Man", "Pra Ver se Cola", "Piuí Abacaxi" e "É de Chocolate", que ainda hoje fazem a alegria de muitos marmanjos.
Amanda Netto Acosta, 42, estava entre as crianças que desejava ao menos conhecer o grupo pessoalmente, mas ela conseguiu mais do que isso. Aos oito anos se tornou integrante da banda, na qual permaneceu por cinco anos, passando de tiete a alvo da identificação e carinho do público.
"Quando surgiu a oportunidade de fazer o teste para entrar no grupo, eu era fã deles", diz Acosta, em entrevista ao F5. Ela relembra que mandou uma fita na qual cantava uma música para a extinta BMG Ariola depois que sua tia soube por meio da secretária da gravadora que estavam selecionando cantores mirins para a banda infantil.
"Eles gostaram muito, só que a princípio eu não entrei", esclarece, emendando que cerca de um ano depois, com a saída de Fabíola Braga, finalmente passou a integrar o Trem da Alegria. "Foi um sonho que realizei e tenho isso muito consciente, porque eu era fã e de repente estava lá".
MENINA DE SORTE
A sorte pode ser apontada como um dos norteadores da carreira de Acosta. Aos quatro anos, uma das brincadeiras favoritas dela era cantar e dançar em frente ao portão de casa, na zona leste de São Paulo. Certa vez, um vizinho recém-chegado à vizinhança a viu e sugeriu ao pai da menina que a levasse para se apresentar no Programa Raul Gil, no qual ele trabalhava.
"Minha primeira apresentação foi ao vivo no Raul Gil e eu comecei a chorar. Ele achava que eu estava com medo e expliquei que o motivo das lágrimas era porque tinha errado a letra da música", relembra a atriz, que na ocasião cantou "Ursinho Pimpão", outro clássico infantil dos anos 1980. "Tenho essa imagem muito clara, viva na minha mente: um pouco antes de entrar, eu vendo minha roupinha."
Começou ali uma dedicação intensa à carreira artística, que a levou a campanhas publicitárias, dublagem e a compor por um ano o conjunto Dó Ré Mi. Tudo isso antes de fazer parte do Trem da Alegria, banda que encerrou sua primeira fase quando os integrantes chegaram à adolescência. Com o fim do grupo, Acosta mudou-se para o Rio de Janeiro onde fez a novela "O Mapa da Mina" (Globo, 1993) e o espetáculo "O Mágico de Oz" (1993).
"Foi um tempo de reencontro comigo mesma na adolescência, que é uma fase na qual nos perdemos muito para nos encontrarmos. Eu passei por uma mudança grande e intensa naquele momento, que foi de redescoberta", pondera Acosta, falando sobre sua volta à capital paulista, onde fez cursos de teatro, aulas de circo, participou de saraus e viu a sorte sorrir para ela novamente.
Um amigo avisou que estavam selecionando atores para a peça "No Reino das Águas Claras", inspirada na obra de Monteiro Lobato, e lamentou não poder participar do processo seletivo, por ter compromissos que o impediam de levar o currículo ao Teatro Imprensa. Acosta, que estava livre, se ofereceu para ajudá-lo e, já que ia até lá, montou um portfólio para si também.
"Tinha 17 anos, fiz meu currículo e usei uma foto tirada em casa mesmo, porque não tinha retratos profissionais recentes. Peguei um ônibus e entreguei os currículos de nós dois. Eu consegui um papel e ele não", conta a atriz, rindo da lembrança.
TEATRO TRANSFORMADOR
Foi nos palcos que Acosta se descobriu artista de fato. Não que ela rejeite a carreira musical, as novelas ou até mesmo o cinema — mídia em que ainda tem o desejo de atuar — mas, para ela, o teatro é inigualável. "Ali aprendemos demais a lidar e equilibrar nossas emoções. O palco cura. E o que é comunicado chega com uma potência muito maior", acredita ela, que protagonizou sucessos como "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá" (2003-2005), "My Fair Lady" (2007-2008) e "Bibi, Uma Vida em Musical" (2018).
O outro grande amor de Acosta atende pelo nome de Vicente, 13. Ela conta que teve o privilégio de viver intensamente a maternidade nos primeiros meses de vida do filho único e que a rede de apoio que construiu ajudou tanto nesse processo quanto na volta dela ao trabalho. "Eu me vi um pouco na ansiedade, no receio de perder o meu lugar, sempre me policiava e pensava: 'estou trabalhando, gerando uma vida e isso é muito importante, criando um ser, meu filho. Essa base que ele está tendo agora é única'", defende.
"Acho que as mães tinham que ter a tranquilidade de ficar com os filhos em casa sem essa pressão que vem do mercado e eu estou falando da minha profissão, que é artística. As mães que trabalham em empresa ou em serviços domésticos não podem viver isso, o que é um absurdo", reclama Acosta. "Tem que haver uma mudança na sociedade, nesse sistema. Elas têm que ser abraçadas", defende.
A atriz aceitou voltar ao teatro quando Vicente ainda era bebê. Isso só foi possível porque o ator e diretor teatral, Tadeu Aguiar, 61, criou uma estrutura que permitiu à atriz levar não só o filho, mas a mãe aos ensaios para que pudesse auxiliá-la nos cuidados e na fase de introdução alimentar do pequeno.
"Ele me abraçou com meu filho. Quando meu peito fisgava, dava uma parada no ensaio e eu amamentava", diz a atriz, tecendo elogios a Aguiar, que, segundo ela, costuma agir assim com outras atrizes na mesma situação. "Todos nos ajudamos. É isso que deve ser feito."
PEQUENA NOTÁVEL
Quando o isolamento social imposto pelo coronavírus teve início, em março de 2020, Acosta viu sua vida profissional parar, assim como grande parte das pessoas que vivem da arte no Brasil. A peça que ela encenava no TUCA, em São Paulo, "Carmen, a Grande Pequena Notável" (2018-2021), foi encerrada duas semanas antes do previsto, e "As Cangaceiras: Guerreiras do Sertão" (2019), que estrearia em seguida também no teatro da PUC (Pontifícia Universidade Católica), foi cancelada. Além disso, as gravações de "Poliana Moça" (SBT), na qual Acosta atuava, foram interrompidas.
Ela teve que se reinventar e durante a pandemia fez apresentações online da peça "Maternagem" — cujo texto é do ex-marido dela, André Fusko —em parceria com o projeto Vivo em Casa. Somente no início de 2021, ela pôde voltar aos palcos com o mesmo espetáculo que encenava quando chegou a pandemia, num misto de preocupação, mas também de muita alegria.
"Todo mundo se cuidou muito, fizemos as apresentações usando máscara. Durante os dois meses de temporada ninguém pegou Covid e foi um sucesso. Tinha 190 lugares, mas só 50 estavam liberados e lotamos o CCBB", conta, referindo-se ao teatro que fica no Rio de Janeiro. "Foi muito emocionante no final ver a emoção da plateia, ouvi-la. Foi incrível".
Acosta não romantiza a pandemia, embora perceba que o tempo reclusa a tornou mais reflexiva e a fez se reeencontrar. Ela acredita que essa mudança de postura transformará não só a vida pessoal, mas seus planos profissionais futuros. "Estou num processo de me escutar e realizar. O que quero comunicar? Qual é o meu lugar de fala? Vivo um momento de gestação de pensamentos, escuta e muitos ressignificados", avalia.
"Eu acredito em bons seres humanos, naqueles que estão preocupados com a vida, com o próximo, com o planeta. Não adianta ser bem sucedida se não tiver um ar bom para respirar, uma comida sem veneno para comer e uma água boa para beber", argumenta a atriz. "É tanta coisa que acontece, que dá vontade de gritar. Fico pensando no que posso fazer, e sei que meu caminho é por meio da arte, porque a arte traduz a vida", conclui a eterna Amanda do Trem.