Celebridades

Luciana Vendramini diz que TOC a fez pesar 36 kg e ficar imóvel por horas: 'Estava morta'

Atriz de 'Espelho da Vida' lançará livro sobre a doença

São Paulo

"Eu estava quase terminando de gravar ‘O Rei do Gado' [Globo, 1996-1997], uma novela em que eu tinha muitos amigos, e isso mexia comigo. Peguei a minha bicicleta para andar ao redor da lagoa no Rio de Janeiro e tive uma sensação horrorosa: um medo misturado a pânico. Não conseguia me mexer e tinha na minha cabeça que só poderia ir embora dali se minha diarista viesse me buscar. Fiquei parada por três horas."

Foi assim que Luciana Vendramini, 48, descobriu que algo de errado acontecia. Paralisada e com o coração disparado, ela desenvolvia em 1997 o  TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), uma doença mental que a fazia acreditar e fazer coisas "sem lógica por trás". 

À noite, eram quatro horas de rituais: Vendramini só podia se deitar depois que passasse na rua o terceiro táxi amarelo. O problema era o mesmo retratado por Jack Nicholson no filme "Melhor é Impossível" (1997), e começou a se desenvolver na atriz através de manias, como sair de casa com o pé direito.

"Manias todo mundo tem. Mas quando elas começam a ficar insuportáveis, a tomar lugar na sua vida, é preciso olhar para ela como uma patologia. O TOC é uma impotência. É como se tudo o que você já aprendeu na vida, a liberdade que você conquistou, de nada valesse mais", diz a atriz. 

Com o tempo, Luciana Vendramini começou a eliminar tarefas do cotidiano que a davam muito trabalho por envolver dezenas de rituais, como comer, e chegou a ficar 11 dias sem se alimentar. Nessa época, ela diz que 4% da população assumia sofrer de TOC , mas que ela não fazia parte dessa estatística. 

"Era inadmissível para mim ter algo que era uma ordem na cabeça, me mandando conferir as coisas várias vezes. Se você não luta contra essas manias, elas vão durando. E a permanência de um minuto, vai aumentando. Quando você vê, está parado há dez horas.". 

Vendramini até tinha dado uma chance para o tratamento, com sessões na psicóloga que já fazia, e adotando a Terapia Comportamental Cognitiva (TCC), técnica indicada pela médica Roseli Gedanke Shavit. Mas era resistente quanto aos medicamentos: como uma "naturalista lacto vegetariana", ela não tomava remédio para quase nada.

"Nunca tinha bebido ou me drogado. A única droga que uma vez eu experimentei foi maconha, e foi uma coisa horrorosa." Sem a ajuda química, ela chegou a pesar 36 kg. "Cheguei a um nível de subvida. Levava seis horas para sair da cama, mais dez horas para tomar banho, e aí já era a hora de voltar a dormir. Estava bem limitada, praticamente morta, e foi aí que eu aceitei o remédio."

O quadro era avançado e a médica da atriz achava que, se ela conseguisse melhorar 20% do estado, já estava no lucro. Vendramini diz se lembrar da exata sensação do medicamento entrando em seu corpo: relaxamento e um alívio como nunca havia experimentado na vida.

Em seis meses, já era outra pessoa. Reavaliou sua vida e pensou em desistir da carreira de atriz, por conta da exposição. Um passo importante da nova vida foi voltar a estudar com Antunes Filhos, como fez em 1989. "Quando eu começo a relatar, parece um filme. Não acredito que passei por tudo isso. Não dá para aceitar hoje. É bizarro", conta.

Agora, carregando uma enorme bagagem de experiências e aprendizado, Luciana Vendramini recupera tudo isso, em parceria com o jornalista Armando Antenore, em seu novo livro –ainda sem nome oficial, mas que por ela, se chamaria "Retrogosto".

Com previsão para ser lançado em 2019, o livro está 70% escrito e reúne fotos impactantes da época do TOC, além de momentos que ela diz nunca ter revelado em entrevistas ou contado às pessoas. "Esse livro tem um caminho longo, como o meu tratamento", diz a atriz, que desenvolveu o projeto em sete meses.

Ela já havia escrito uma obra sozinha e preferiu lançar a versão com Antenore, mas não descarta a possibilidade de publicar seu primogênito. Segundo a atriz, o novo livro relata esse período e as dúvidas que ela teve, sem pretensão de ser uma biografia. O objetivo é ajudar pessoas a entenderem o problema e procurarem um caminho de tratamento, uma vez que ela mesma não encontrou muita informação sobre o assunto quando precisou.

Além disso, Luciana Vendramini pretende acabar com o tabu das "doenças invisíveis". "São as mais perigosas porque ninguém acredita ou sabe como lidar." Ela diz que chegou a desistir de lançar o livro pelo medo de ficar estigmatizada pela doença, mas voltou atrás após ver uma demanda crescente do assunto.

"O Brasil cresceu um pouco nesse tabu horroroso. Já ouvi que o TOC é frescura, que eu tenho tudo na vida, que tenho ‘dois braços e duas pernas’... Essas comparações ridículas acabavam comigo. Foi aí que minha doença piorou, porque resolvi escondê-la por um ano e meio."

Ela diz que o "julgamento das pessoas ainda é pesado", e que percebe isso na maneira como as pessoas a pedem ajuda, com medo e "como se contassem um segredo". Nesse aspecto, a família e os amigos têm papel fundamental.

"Se a família não souber o que fazer, pode piorar o caso. A gente não faz ideia, mas quem está do lado, assistindo, pode estar sofrendo tanto quanto a gente. Às vezes, é melhor a família procurar ajuda, antes de ajudar.”

Vendramini diz que, até hoje, ninguém sabe o que desencadeou seu gatilho, mas acredita que o fato de ter começado a carreira cedo, sem preparo emocional para lidar com a demanda, pode ter sido um motivo. Hoje, mesmo com a doença controlada, ainda tem receio de que ela volte.

"Toda pessoa com doença mental fica um pouco refém dela, com medo", diz. Mas a atriz afirma que está preparada para lidar. "Você se torna uma guerreira, adquire uma força diferente ao enfrentar o desconhecido dentro de você. Hoje sou muito melhor que eu era antes. Gosto muito da minha história e trajetória, e estou muito amiga do meu TOC."

'REALIDADE É DURA'

No ar na novela "Espelho da Vida” (Globo), Luciana Vendramini diz que a arte tem o importante papel de a tirar da realidade: "A realidade é dura. E a vida é uma tragédia, de fato". Ela afirma que tem gostado de explorar o seu humor nas telas.

No set, ela se dá particularmente bem com Vera Fischer, quem ela descreve como uma pessoa “maravilhosa de todos os ângulos e que a gente não vê por aí”; e com Evandro Mesquita, com quem costuma ter dificuldade para se concentrar pela quantidade de brincadeiras.

"Todo o trabalho que eu faço é uma minifaculdade. Esse foi um grande e com um tema que eu tinha medo: de espiritismo, de ver almas. Ter perdido esse medo infantil foi uma cura para mim", diz a atriz, que relembrou a única crise de meia-idade que teve, aos 26 anos.

Hoje, Luciana Vendramini afirma ter muito orgulho da idade. "Não tem como não envelhecer. O que dá para fazer é cuidar da saúde física, porque hoje está todo mundo sedentário pra cacete", brinca.

Para 2019, os planos são muitos: com sua produtora, a atriz está produzindo dois longas e estuda levar duas séries de livros para as telas. Ela tem duas peças encaminhadas e quer lançar uma editora online.