Cantor Akon quer construir na vida real a cidade mágica do filme 'Pantera Negra'
A ideia já contaria inclusive com o apoio das autoridades de Senegal
O cantor americano Akon quer construir uma "Wakanda da vida real" no Senegal –uma espécie de cidade futurista, inspirada no país fictício do filme "Pantera Negra", onde o dinheiro seria sua recém-anunciada criptomoeda, a Akoin.
A ideia já contaria inclusive com o apoio das autoridades locais: nesta semana, durante o festival Cannes Lions, o artista declarou que o governo havia disponibilizado um terreno de 2.000 acres (cerca de 800 hectares) para que desse início ao projeto.
Em um painel sobre blockchain durante o evento, que promove uma das mais importantes premiações da área de publicidade, ele falou sobre sua "Akon Crypto City". A referência ao filme da Marvel está no próprio site da criptomoeda. Até onde se sabe, contudo, nem o Senegal nem Akon têm um estoque de vibranium –o metal que, na ficção, deu a Wakanda sua riqueza e poder. E cidades não custam barato.
Onde seria construída a 'Wakanda da vida real'? Não está claro. A BBC tentou entrar em contato com o governo senegalês e com a equipe de Akon em busca de mais detalhes, mas não teve retorno. A área de 2.000 acres –que equivale a 2.000 campos de futebol–, informa o próprio site do cantor, estaria a cinco minutos do novo aeroporto internacional do Senegal, próximo da capital, Dakar.
A localização bate com a da cidade de Diamniadio, que está atualmente em construção. Ela foi anunciada três anos atrás e é parte do plano do governo do presidente Macky Sall para revitalizar a economia do país. Outro fator sinaliza que ambos podem se tratar do mesmo empreendimento: nas imagens promocionais da "nova Wakanda" aparecem alguns dos prédios que também estão no material de divulgação de Diamniadio, apartamentos de alto padrão e prédios futuristas.
Se de fato se tratar de Wakanda, a "criptocidade" vai custar caro. Quanto? A resposta curta é: muito. A estimativa atual para a Diamniadio Lake City é de US$ 2 bilhões (aproximadamente R$ 7,5 bilhões), de acordo com a revista fDi Intelligence, uma publicação do Financial Times.
Akon, que tem 41 anos e é filho de pai e mãe senegaleses, tem uma fortuna avaliada em US$ 80 milhões (cerca de R$ 300 milhões) –um patrimônio de volume considerável, mas que não chega perto do investimento necessário para dar cabo ao projeto.
No papel, entretanto, essa cidade dentro de uma cidade –já que foi pensada, entre outras razões, como uma solução para o rápido e desordenado crescimento urbano de Dakar– não parece ter relação com o cantor. A Diamniadio Lake City está sendo construída pelo grupo Semer, que tem escritórios no Senegal e em Dubai.
Procurada pela BBC, a companhia não comenta sobre uma eventual relação com o artista.
E A CRIPTOMOEDA?
A criptomoeda anunciada por Akon, a Akoin, estaria no centro da vida financeira da cidade, de acordo com a descrição que consta em seu site. Mais que isso, se estabeleceria como "uma moeda estável que circularia por toda a África". "Ela trará o poder de volta ao povo e segurança ao sistema monetário", disse Akon no festival Cannes Lions, na última segunda-feira.
Akon não foi capaz de explicar, contudo, como o ambicioso sistema funcionaria –e admitiu que deixou a tarefa de transformar sua ideia em realidade nas mãos dos "geeks". O presidente da Associação Queniana de Blockchain, Michael Kimani, é cético –ainda que diga entender o desejo de Akon de afastar o continente africano da dependência das moedas ocidentais. "É uma utopia", ele afirmou à BBC.
Especialmente, ele acrescenta, quando se trata do continente como um todo: para ser utilizada e funcionar na África, uma criptomoeda precisaria ser estável, além da amplamente aceita. "Eu enxergo esse tipo de possibilidade para as criptomoedas, mas em pequenas comunidades", explica. "Se há por aí uma comunidade formada apenas por pequenos negócios, ela poderia de fato se beneficiar se tivesse sua própria moeda."
A avaliação não leva em conta ainda que, à primeira vista, a Akoin precisa de um smartphone para funcionar. O Senegal está pronto para a economia dos aplicativos? A renda média do Senegal no fim do último ano fiscal era de 96.206 francos CFA (cerca de US$ 170, R$ 640), segundo a APA News.
Um plano mensal de dados de 2,5 GB com a Orange, uma das maiores operadoras de telefonia móvel do país, custa 5.000 CFA (US$9 ou R$ 34) –o que corresponde a aproximadamente 5% do rendimento médio.
Mesmo que os senegaleses conseguissem pagar pelo serviço, quanto da população poderia de fato fazer download de aplicativos?
Ainda que os telefones móveis sejam disseminados no país, os dados mais recentes levantados pela empresa americana de pesquisa Pew Research Centre indica que apenas 34% da população possui um smartphone. A curto prazo, portanto, não parece que o país inteiro vá passar a usar uma criptomoeda que funciona por meio de um aplicativo.
O que os senegaleses pensam sobre isso? Ainda não muito, diz a jornalista da BBC Alex Duval Smith, baseada em Dakar. O anúncio de Akon não chegou a ter grande repercussão no país, ela afirma, e os porta-vozes do presidente não retornaram os pedidos de entrevista. Em meio à febre da Copa do Mundo, as estatísticas de mídias sociais mostram que apenas algumas poucas dezenas de internautas estão usando a hashtag #Akoin.