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Artista paulistano radicado no Rio cria praias filtradas pela geometria

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Luiz Zerbini está em pé diante de uma mesa de vidro. Ele coloca pedaços de celofane de tons distintos sobre o tampo transparente, filtrando a luz e mudando a cor dos objetos embaixo dela -de areia de praia a pedaços de azulejos, folhas e gravetos.

Essa enorme instalação, de dez metros de comprimento, é o abre-alas de sua mostra individual agora na Casa Daros, no Rio. Também resume sua pintura, um híbrido entre figuração realista e matrizes geométricas coloridas.

"É uma pintura tridimensional, com várias camadas de abstração", diz Zerbini, olhando para a mesa. "Minha tendência sempre foi misturar tudo a partir da memória. Tenho o hábito de sair por aí arquivando todas as coisas."

No caso, das conchinhas que recolheu com a filha a cacos de vidro devolvidos à praia pelas ondas do mar.

Zerbini é um paulistano radicado no Rio que não se deixou seduzir pela exuberância tropical da cidade adotada. Suas paisagens, quase sempre marítimas, passam longe do idílio dos cartões postais.


Enquanto desenha com exatidão o contorno das ondas quebrando na orla, também não esconde a sujeira na areia, a erosão que revela os tubos de esgoto passando ali nem os tapumes de madeira barata dos canteiros de obras.

Mas toda essa realidade aparece nos quadros sempre filtrada por retículas geométricas ou padrões, que variam de linhas retas a onduladas a quadrados cheios de cor.

"É meio real", diz Zerbini. "As pedras são realistas, as plantas são realistas, tem a erosão que desenterra as tubulações, essa sujeira. Mas são só acontecimentos possíveis, que eu acho bonitos."

Ou meio bonitos. Sem a presença de suas matrizes geométricas, a obra de Zerbini poderia ser lida como paródia de paisagens ufanistas, ou visões vazias de uma cidade de beleza quase ostensiva.

ESQUIZOFRENIA FORMAL

Não é o caso. Zerbini só diz ser vítima de uma "formação esquizofrênica", misturando anseios figurativos que tem desde criança ao geometrismo que aprendeu na escola.

Desde então, quando não mistura tudo no mesmo quadro, o artista vem fazendo composições figurativas bastante exageradas e trabalhos geométricos que arrebatam o olhar pela contenção formal.

Uma das salas da mostra agora no Rio tem só abstrações em branco e preto, entre elas uma tela inspirada no avesso de uma carta de baralho, que não passa de quadradinhos brancos sobre uma superfície imensa toda negra.

"É algo desconcertante. Não aceita bem o olhar", diz Zerbini. "Estava interessado nesse efeito repulsivo."

Na mesma sala também está uma de suas várias telas de quadrados em sucessão, como se saltassem para fora do plano, com a diferença de que ali essas formas são feitas a lápis, em preto e branco.

Nas palavras de Zerbini, é um "descanso" para os olhos depois de uma longa sequência de paisagens berrantes. Mas é um alívio passageiro, já que na sala seguinte a cor volta com força total em mais uma avalanche geométrica.

"Tem lados muito diferentes a obra dele. É ao mesmo tempo algo supergeométrico e exuberante", diz Hans-Michael Herzog, curador da mostra. "Não há muitos artistas com duas almas como ele, cada uma com seu espaço."

O jornalista viajou a convite da Casa Daros.

LUIZ ZERBINI
QUANDO de qua. a sáb., das 11h às 19h; dom., 11h às 18h; até 25/5
ONDE Casa Daros, r. Gal. Severiano, 159, Rio, tel. (21) 2138-0850
QUANTO R$ 12

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