Aviso
Este conteúdo é para maiores de 18 anos. Se tem menos de 18 anos, é inapropriado para você. Clique aqui para continuar.

Thiago Stivaletti

Merchan da Uber em 'Vale Tudo' foi provocação a Ricardo Nunes

Enquanto os apps seguem proibidos de oferecer serviço de moto para passageiros em São Paulo, Aldeíde e Consuelo ostentaram felicidade usando o serviço no Rio

A imagem mostra uma mulher com cabelo ruivo e ondulado, usando uma blusa rosa com um colarinho branco decorado. Ela está sorrindo e posando com as mãos juntas na frente do corpo. O fundo da imagem é de uma cor neutra, criando um contraste com a roupa da mulher.
Aldeíde é a personagem interpretada pela atriz Karine Teles - Joao Cotta/João Cotta - 25/Globo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Pelas vias tortas da propaganda no meio da ficção, o famoso "merchan", a briga dos aplicativos de transporte com a prefeitura de São Paulo foi parar em "Vale Tudo" (Globo). No capítulo da última quarta, para evitar os ônibus lotados, Aldeíde (Karine Telles) e Consuelo (Belize Pombal) decidiram voltar da TCA para a casa em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, chamando um Uber Moto.

Há mais de dois anos, o prefeito Ricardo Nunes suspendeu o serviço em São Paulo. O merchan funcionou como um misto de provocação e pressão sobre o prefeito paulistano, insuflando no espectador de São Paulo a vontade de ter aquilo que nunca foi proibido ao carioca.

Assim que o merchan começou a rolar na novela, a proibição em São Paulo me veio à cabeça. Mas não era nada difícil lembrar: naquela mesma quarta-feira, a Uber e a 99 pagaram um anúncio na primeira página da edição impressa da Folha publicando uma carta aberta a Nunes, pedindo a liberação do serviço.

Elas cutucavam o prefeito com um dado segundo o qual o número de acidentes na capital paulista teria crescido 20% no último ano. A intenção era clara: dar a entender que o serviço de moto por aplicativo não é o grande responsável pelos acidentes.

Este é mais um capítulo do braço de ferro entre os apps e a prefeitura de São Paulo. O decreto de Nunes proibindo o serviço é de janeiro de 2023. Em janeiro deste ano, a 99 lançou o 99 Moto em São Paulo, peitando a prefeitura, que ameaçou o aplicativo com multa de R$ 1 milhão por dia.

Em maio, a novela da vida real recomeçou. No dia 14, um juiz julgou improcedente a ação da prefeitura contra a 99, mas dois dias depois outro juiz voltou com a suspensão. Uber e 99, porém, continuaram oferecendo o serviço. No dia 26, o mesmo juiz reafirmou a proibição e determinou multa diária para os apps. Foi essa "brecha" aberta em maio que motivou os apps a irem para a mídia (e para a novela da ficção) para angariar apoio à causa deles.

A questão é realmente complicada, e dá para encontrar razões de ambas as partes. Sabemos que os aplicativos funcionam um pouco como as redes sociais, servindo de ponte entre prestador de serviço e usuário. Lavam as mãos de responsabilidades como oferecer um treinamento completo em conduta de trânsito, regras de segurança e outras questões importantes para seus motoristas.

Por outro lado, a proibição do serviço de moto penaliza os mais pobres, que não podem pagar mais de R$ 20 num trajeto longo de carro, e fariam mais rápido, por exemplo, o caminho do trabalho até a estação de metrô na hora do rush.

Só vantagens

O merchan em "Vale Tudo" foi agressivo em todas as frentes. Na cena da quarta-feira, Aldeíde mostra a tela do Uber em seu celular. O aplicativo propunha R$ 6,80 para o serviço de moto contra R$ 23,92 no Uber X de carro. (OK, não sabemos onde fica a TCA, e, portanto, não dá para estimar a distância da empresa até Vila Isabel.)

O merchan envolveu não só os diálogos de uma cena, mas um personagem inteiro fora dela. Ficamos sabendo que Daniela (Jessica Marques), filha de Consuelo, está trabalhando como Uber Moto para ajudar a pagar a faculdade de Direito. "Ai, se a Daniela vier me buscar, vai ser um sonho", comenta Consuelo.

"E ela tá gostando de ser motorista?", pergunta Aldeíde. "Tá adorando! Faz os horários dela, ainda vai para faculdade de moto, que ela tá pagando com as viagens que faz durante a semana, né?", responde a amiga. As duas chegam em casa ao mesmo tempo, em duas motos diferentes, tiram seus capacetes e dão cinco estrelas para seus respectivos motoristas.

E assim vai a novela das nove, entre merchans pesados que chegam do departamento de publicidade da Globo e as honestas campanhas sociais que os autores tentam conduzir. No momento, algumas estão em curso: a identificação de Poliana como assexual, a sigla A do LGBTQIA+; a busca de Lucimar pelos direitos de seu filho na Justiça; e, mais de leve, o vício do seu ex-marido, Vasco, em aplicativos de bets.

Mas, meu caro espectador, não se surpreenda se em breve um desses poderosos sites de bet bancar um merchan em que Vasco ganha um bolada de dinheiro do nada em uma de suas apostas. Como ensinam todos os dias Odete Roitman e Maria de Fátima, é o dinheiro que comanda o mundo.

Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Foi repórter na Folha de S.Paulo e colunista do UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow)

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem