Thiago Stivaletti

'O Dono do Mundo', a virgem deflorada e o machismo brasileiro

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Desde a última segunda-feira (27), "O Dono do Mundo" (1991) voltou pra nos divertir no Viva. Foi a segunda novela mais bem votada pelo povo no site do canal, depois de "Água Viva" (1980).

[Spoiler gigante para quem tem menos de 25 anos e pretende ver a novela como "inédita"]

A saga de Felipe Barreto (Fagundes) é provavelmente a história mais sórdida que a Globo já ousou colocar em horário nobre. Um cirurgião rico, bonito e garanhão que faz uma aposta com um colega: vai tirar a virgindade da noiva de seu humilde funcionário antes dele. E consegue. O noivo inconformado morre num acidente de carro, a moça ainda engravida dele e depois perde o bebê... E o pior: tudo acontece DUAS vezes.

Márcia (Malu Mader) decide se vingar, faz com que Felipe perca a sua licença para clinicar. Felipe, arrependido e sem ter onde cair morto, faz Márcia ver que ele mudou, que agora é um novo homem e está mesmo apaixonado. Márcia se deixa seduzir, só para descobrir... Que tudo não passava mais uma vez de uma aposta por uma caixa de champanhe.

O que pouca gente lembra é que a professorinha corrompida vivida por Malu Mader enfrentou a concorrência de outra professora que começou a roubar muita audiência da Globo. Era a linda e meiga professora Helena de "Carrossel", que estreava no SBT no mesmo 20 de maio de 1991. Lembro que a "Veja", quando ainda era uma boa revista, chegou a estampar essa capa: Malu Mader x Professora Helena.

Crédito: Divulgação Malu Mader e Antonio Fagundes em "O Dono do Mundo" (1991)
Malu Mader e Antonio Fagundes em "O Dono do Mundo" (1991)

Estimulado pelo sucesso de "Vale Tudo" três anos antes, Gilberto Braga queria ir mais longe na discussão da falta de ética da elite brasileira. Mas foi longe demais para os padrões Globo. As primeiras pesquisas com os espectadores da novela já indicaram: a ideia era que o público torcesse por Márcia contra o vilão Felipe. Mas brasileiro é machista: muitos diziam que Felipe estava apenas cumprindo seu papel de garanhão, enquanto Márcia "pecou", errou rude, ao "prevaricar" fora do casamento.

Em "O Dono do Mundo", Fernanda Montenegro brilha como Olga, a cafetina mais luxuosa do Rio - o primeiro capítulo já a introduz genialmente: há boatos de que, na véspera do golpe militar, ela ligou para inimigos mortais só para se garantir de que estaria ao lado do poder no dia seguinte.

Nathália Timberg ganhou uma bela vilã de presente, Constância Eugênia. Letícia Sabatella estreou como Taís, moça ambiciosa que se torna garota de programa para subir na vida. E Ângelo Antonio, vindo do sucesso de "Pantanal", inaugurou um novo tipo de galã: Beija-Flor, o macho delicado, mais sensível e frágil do que a namorada.

Voltaremos a "O Dono do Mundo" algumas vezes, com toda a certeza.

Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista, crítico de cinema e noveleiro alucinado. Trabalhou no "TV Folha", o extinto caderno de TV da Folha, e na página de Televisão do UOL. Viciou-se em novela aos sete anos de idade, quando sua mãe professora ia trabalhar à noite e o deixava na frente da TV assistindo a uma das melhores novelas de todos os tempos, "Roque Santeiro". Desde então, não parou mais. Mesmo quando não acompanha diariamente uma novela, sabe por osmose todo o elenco e tudo o que está se passando.

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