Renato Kramer

'Teve gente que quis me tirar' das novelas, diz Osmar Prado

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O depoimento de Osmar Prado na série "Grandes Atores" (Viva) foi ao ar nesta sexta-feira (26).

Tudo começou quando, ainda pequeno, fez uma pergunta de improviso para a sua mãe: "O que é que tem que fazer para ser artista? Eu nem sabia direito o que era ser artista. E minha mãe me matou no nascedouro, ela me disse: 'Para ser artista, tem que ser bonito, tem que ser alto, dentes perfeitos'. O Parâmetro dela era o Rodolfo Valentino", relembrou.

Em 1957, depois de testes, o ator foi contratado pela TV Paulista para protagonizar "David Copperfield". Em 1958, participou de "A Princesinha", na mesma emissora. Na Globo, sua estreia foi em "Ilusões Perdidas" (1965), mas foi só em 1968 que assinou o seu primeiro contrato com o canal, para fazer "Verão Vermelho" (1969/1970).

"Alguns amigos meus me perguntaram o que eu ia fazer na Globo. Eu respondia: 'Atuar'. Mas nessa produção eu virei até motorista. Ia, pegava a Kombi, ajudava. Tanto que um dia o Mário Lago (1911-2002) me disse: 'Pensei que você fosse o motorista, pô! Você é ator?'", relembrou Prado, com humor.

A partir de uma cena em "Verão Vermelho" com o ator Jardel Filho (1927-1983), em que precisou improvisar, Osmar observou: "Aprendi desde cedo que o erro se incorpora e se transforma em acerto, mas eu fui muito reprimido por isso por alguns autores".

"Depois eu fui jogado para 'A Grande Família', em que eu seria o co-protagonista (Júnior). Quando terminou a série, eu voltei para as novelas e fiz 'Helena' (1975), uma adaptação do Gilberto Braga, que até então assinava a crítica de teatro do jornal 'O Globo' como Gilberto Tumscitz", contou.

"Aí veio 'Anjo Mau' (1976) e eu (Getúlio) com a Pepita Rodrigues (Stela Medeiros). A gente arrebentou, foi um 'sucessaço'", relatou o ator. "Eu sempre tive sorte com os personagens. Esse par com a Pepita foi muito legal".

E relembrou: "Me disseram lá atrás que eu tinha muito talento, que ou eu ia ser muito rico ou ia morrer na miséria. Mas ele não acertou nem uma coisa nem outra: rico eu não vou ser, mas morrer na miséria também não."

Então, Osmar Prado abriu o jogo sobre os motivos de ter ficado algum tempo longe das novelas: "Eu fui afastado das novelas por várias razões. Teve gente que quis me tirar. Eu me lembro que, quando eu fiz 'Roda de Fogo' (1986), o meu personagem, Tabaco, estourou. O autor [Lauro César Muniz] não me queria. Não porque ele não gostasse de mim, mas ele queria um ator com uma linguagem popular mas estilo 'come quieto'. Mas a Globo me impôs porque eu estava contratado", contou.

Em função do sucesso de "Tabaco", foi pedido ao autor que desenvolvesse ainda mais o personagem. "Aí eu marquei gol para c*", relembrou, com euforia.

Crédito: Zô Guimarães/Folhapress O ator Osmar Prado, 67, posa para foto no Jardim Botânico, no Rio
O ator Osmar Prado, 67, posa para foto no Jardim Botânico, no Rio

Sobre o seu processo de trabalho, o ator confessou: "Tem certas coisas que o diretor me pede e eu argumento: 'Mas, espera aí, eu acho que o meu personagem não faria isso'. Se ele conseguir me convencer de que ele faria, eu faço. Não tenho pudor". Em "Pedra Sobre Pedra" (1992), Prado viveu o complexo "Sérgio Cabeleira": "Ele vai embora para a lua, é uma visão poética da morte", comentou o ator.

"Eu acho que o ator tem que ter uma personalidade, tem que ter uma convicção. O ator não pode ser títere na mão do diretor. E um diretor generoso sabe que os atores não são peças de xadrez que ele move para onde ele quiser, absolutamente", afirmou Prado. "Eu sempre reagi a pessoas que queriam me cercear, a muitas que vinham me pedir para baixar o tom".

Em "Renascer" (1993), Prado viveu mais uma personagem marcante de sua carreira na telinha: Tião Galinha. "Durante a novela eu tive um embate com um executivo da Globo e pedi para sair. Pedi para antecipar a morte do personagem, e o Tião estava no auge", relembrou o ator. O autor Benedito Ruy Barbosa bota o personagem na cadeia e ele se suicida. Mas Prado acha que faltava um motivo mais forte para Tião se matar.

O ator lembrou então de um fato que ocorrera com Mário Lago, que ao levar um tapa na cara numa situação envolvendo questões políticas, ouvira do companheiro do agressor: "Nunca bata na cara de um homem digno, você mata ele". "Então eu pedi para me darem um tapa na cara. O cara que fazia o carcereiro não teve coragem, e quem me deu o tapa foi o cinegrafista, em close". Ao reviver a cena, Prado se emocionou ao ponto de não conseguir continuar. Travou e procurou conter o choro. Pediu perdão. "Quando eu volto a falar sobre esse assunto, mexe muito comigo", explicou.

Em 2014 o ator participou da série "Amores Roubados" como o traído Cavalcanti, e, como sempre, deu um show de interpretação. "Quando fui chamado para fazer a série, eu ainda estava com a gase no pescoço da cirurgia que fizera para tirar um primeiro tumor. Eu ainda avisei que talvez tivesse que fazer uma segunda cirurgia. Então fiquei sabendo que teria um intervalo de três meses entre as gravações locais em Petrolina (PE) e as do estúdio. E foi o que aconteceu. Voltei de lá, fiz a cirurgia, rádio e quimioterapia. E fui gravar o final da série com 53 kg. Eu nem me reconheço ali, eu estava muito magro", confessou.

Na sequência, já mais recuperado, Prado deu início às gravações de "Meu Pedacinho de Chão" (2014), com o seu enérgico Coronel Epa —brilhante! Até do seu depoimento Prado conseguiu fazer um grande espetáculo. Sem dúvida, um dos nossos grandes atores.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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