Marcelo Arantes

Cristiano Araújo e a escola de Sonia Abrão

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Desde a quarta-feira (24), as emissoras de TV aberta brasileiras não falam de outra coisa: a morte do jovem cantor Cristiano Araújo e de sua namorada, Allana, num acidente de trânsito em Goiás.

Enquanto milhares se perguntavam perplexos nas redes sociais de quem se tratava e por que o destaque, já que tantos morrem em condições piores todos os dias, outros milhares lamentavam a tragédia.

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Até Fátima Bernardes confundiu o nome do falecido em seu programa "Encontro" de ontem, demonstrando pouca familiaridade com o cantor regional.

Nome em ascensão no cenário artístico, de cabelos alisados e espetados com gel, Cristiano Araújo pertence à geração que misturou os gêneros sertanejo romântico, brega, axé, forró e vanerão, e difundiu o "arrocha" do interior para as metrópoles do país.


Em refrões repetitivos com forte apelo popular, geralmente inserindo seu próprio nome no meio das rimas para imprimir uma marca d'água na música, os cantores de arrocha falam a linguagem simples e sentimental da nova classe média brasileira.

A comoção em Goiás chegou ao ponto do governador do Estado decretar luto de três dias pelo falecimento do jovem, como a Folha noticiou.

Hiperdimensionar o assunto parece compensar a primeira das fases do luto, a negação. O sertanejo foi elevado à categoria de supercelebridade, e suas memórias tiveram destaque em absolutamente todos os programas jornalísticos.

Esta coluna já discutiu aqui as razões que aumentam a audiência na cobertura de tragédias pela TV. No caso de Cristiano Araújo, o assunto atinge uma dimensão especial por se tratar de um jovem promissor cercado por uma legião de fãs, ávidos por acompanhar o velório e rever suas participações em programas antigos.

A segunda fase do luto, a raiva, projeta-se no ambiente externo, e o que se viram foram familiares questionando a existência de Deus e fãs produzindo textões nas redes sociais para reclamar da outra metade do país, que jamais ouviu falar no seu ídolo. Rogério Flausino, do grupo Jota Quest, foi vítima de ataques virtuais por dizer metaforicamente que Cristiano Araújo "tirou férias merecidas e antecipadas".

A jornalista Sonia Abrão, conhecida por reservar um bom tempo de sua programação para falar da morte de famosos na TV aberta, está com a concorrência apertada. Até o site G1 reservou destaque para o carro do cantor, divulgando valor de mercado, funcionalidades e itens de segurança.

Também explorando o tema à exaustão, Ana Maria Braga parece ter tirado nota dez na escola de Sonia. Durante todo o seu programa desta quinta-feira (25) lembrou o público sobre o acidente de Luciano Huck e Angélica. Aliás, a própria Angélica vai aproveitar o ocorrido e exibir uma entrevista inédita com o sertanejo no próximo sábado (27).

Lidar com a morte é um desafio de foro íntimo. Enquanto uns se entregam ao profundo sofrimento de perda e adoecem, uns compartilham fotos bizarras dos corpos das vítimas na internet e outros criticam. Mas todos querem assistir à Sonia Abrão.

Marcelo Arantes

Marcelo de Oliveira Arantes (@dr_marcelo_) é psiquiatra, mora em São Paulo e comenta o "BBB" há dez anos, desde que participou do "Big Brother Brasil 8". É autor de “A Antietiqueta dos Novos Famosos”.

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