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Beanie Feldstein

Beanie Feldstein Celeste Sloman/The New York Times

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Alexis Soloski
The New York Times

Beanie Feldstein, 28, é alérgica a quase tudo –gatos, laticínios, fragrâncias, poeira. "Basicamente, vivo em uma bolha", ela disse. Os sprays e adesivos que ajudam atores a chorar quando uma cena requer? Ela também é alérgica a eles. Por isso, alguns meses atrás, trabalhando 16 horas por dia na gravação de cenas em um set que reproduzia uma suíte no hotel Ritz-Carlton, ela teve de se fazer chorar, a cada tomada, sem a ajuda de lágrimas artificiais.

"Eu tinha de cavar, cavar, cavar, cavar, cavar, e me colocar naquele estado", disse Feldstein em uma conversa recente. "Não conseguiria conviver comigo mesma no final do dia se não fizesse o necessário para a cena".

Essas lágrimas foram ao ar há algumas semanas nos Estados Unidos, em "Man Handled", o sexto episódio de "Impeachment: American Crime Story", série estrelada por Feldstein no papel de Monica Lewinsky, estagiária da Casa Branca.

O episódio recria uma operação do FBI (Serviço Federal de Investigações) apelidada de "noite do baile", porque, como brinca um dos agentes, envolve passar horas com uma garota em um quarto de hotel. No episódio, uma equipe de agentes formada integralmente por homens embosca a Lewinsky de Feldstein, ainda vestindo suas roupas de ginástica suadas, e a confina em uma suíte, ameaçando-a de prisão caso ela não coopere com a investigação do promotor especial sobre o presidente Bill Clinton.

A personagem passa a maior parte do episódio chorando ou reagindo histericamente, o que representa um contraste descabelado e forte com as personagens efervescentes que Feldstein interpretou em "Lady Bird – A Hora de Voar" e "Fora de Série", e na Broadway em "Hello Dolly!". A Fanny Brice de "Funny Girl", um papel muito sonhado que ela interpretará em uma nova montagem do espetáculo na Broadway no ano que vem, é um papel típico para ela. Mas embora Feldstein e Lewinsky sejam morenas, judias, tenham raízes em Los Angeles e amem o teatro musical, uma personagem angustiada como Lewinsky não estava entre suas experiências.

"Ela é uma pessoa incrivelmente ensolarada", disse Sarah Paulson, que trabalha com Feldstein em "Impeachment". "Isso não quer dizer que não tenha seriedade, porque nada poderia ser menos verdade. Mas ela tem um lado reluzente."

No episódio, esse brilho é seriamente atenuado. Lewinsky tem alguns momentos de força, como quando ela sorrateiramente faz um telefonema para a secretária do presidente, mas em geral fica à mercê dos agentes, que a intimidam e iludem. Ao longo de toda a série, mas nunca mais do que nesse episódio, Feldstein se entrega completamente ao papel –coração, alma, canais lacrimais.

"Na verdade, não sei se um dia vou conseguir deixar o papel para trás", ela disse, com a absoluta sinceridade com que diz a maioria das coisas. "Foi uma empreitada muito difícil".

Nós nos encontramos em um café com mesas ao ar livre em uma pracinha isolada em Nova York, em um dia calorento de setembro. Feldstein, usando um vestido com estampa de oncinha e Reeboks brancos reluzentes, não quis comer ou beber qualquer coisa —aquelas alergias—, e ficou de máscara o tempo todo, mesmo ao ar livre. "Continuo a ter muito, muito, muito medo da Covid", ela disse.

Até "Impeachment", sua carreira –que também inclui o papel principal em "Como Se Tornar Influente", um filme sobre uma jovem que se torna crítica de rock, e uma passagem de uma temporada de duração pela série cômica sobre vampiros "What We Do in the Shadows"– abarcava apenas papéis cômicos. Mas dois anos atrás, Ryan Murphy, um dos produtores de TV mais poderosos dos Estados Unidos, telefonou para lhe oferecer o papel de Lewinsky.

Feldstein era criança na presidência de Clinton, e pouco se lembra do impeachment. Mas aceitou imediatamente, e mergulhou na pesquisa –primariamente, a biografia autorizada de Andrew Morton sobre Lewinsky e as gravações feitas ilegalmente por Linda Tripp, ainda que ouvi-las, ela diz, a tenha feito se sentir muito, muito enojada.

Por fim, a atriz decidiu que seu desempenho teria de se basear menos na imitação física ou vocal do que em algo mais efêmero. "Minha meta era ser emocionalmente fiel ao que ela estava sentindo naquele momento", disse.

A verdade dói, é claro, e doeu especialmente nas semanas passadas na gravação de "Man Handled", durante as quais ela chorava e gritava por horas a fio. O set claustrofóbico do hotel e o calendário apertado significavam que as pausas entre as cenas eram curtas. Feldstein disse que normalmente prefere fazer uma pausa e comer um cookie, entre as cenas. Mas na gravação não havia tempo para sair da personagem. E de qualquer forma ela não achava que aquilo fosse a coisa certa a fazer.

"O episódio me levou ao limite, emocionalmente, de maneiras que eu jamais teria imaginado ou compreendido", disse Feldstein. "Foi a experiência mais sacrificada e dolorosa que já tive como atriz".

Murphy, que dirigiu "Man Handled", perguntava constantemente à atriz se ela estava bem, se ela conseguia fazer mais uma tomada. Lewinsky é uma das produtoras da série, e Feldstein, que havia se encontrado com ela para um chá e trocava mensagens de texto com Lewinsky regularmente, sentia uma responsabilidade esmagadora por contar a história dela de forma tão completa e autêntica quanto pudesse. "Tudo em que eu pensava, a cada dia, era que precisava honrá-la", disse a atriz.

Por isso, quando Murphy lhe pedia mais uma tomada, Feldstein enxugava as lágrimas e voltava ao set. "E eu pensava que, se é para Monica, com certeza estou disposta a gravar mais uma", ela disse.

Colin Hanks, que contracena com Feldstein em "Man Handled", admirava a intensidade de seu trabalho, hora após hora, tomada após tomada.

"As pessoas acham que atuar é fácil, e muitas vezes é", disse Hanks, por telefone. "Mas as coisas que ela estava fazendo, cara, não sei quantas pessoas teriam a capacidade de resistir àquela agressão emocional".

Mira Sorvino, que interpreta a mãe de Lewinsky no episódio, elogiou a capacidade dela de se manter no momento, em "Man Handled", mesmo quando os momentos em questão eram apavorantes. "Ela estava sempre lá, emocionalmente", disse Sorvino, por telefone. "Era uma carga pesada para Beanie carregar, e ela a carregou de modo magnífico".

O entusiasmo natural de Feldstein garantia que ela não ficasse deprimida por tempo demais. Paulson, que interpreta Tripp, fala com inveja sobre a leveza de Feldstein quando as câmeras eram desligadas.

"Foi uma experiência de aprendizado louca, ver que você pode ser excelente no seu trabalho e não querer arrancar a própria pele a cada cinco minutos", disse Paulson. (Ela acrescentou que, embora tipicamente costume usar perfumes apropriados para os personagens que interpreta, não o fez na série. Não queria fazer com que Feldstein precisasse ir para o hospital.)

Mas, passados alguns meses, Feldstein ainda não deixou a experiência para trás. Não inteiramente. "Acho que essa continua a ser a mais imensa responsabilidade que já tive ou terei", ela disse. "Porque sei que vou interpretar pessoas reais de novo. Vou fazer Fanny Brice. Mas nada parecido com isso".

Traduzindo originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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