Cinema e Séries

Criador de 'Avenue 5' diz que quis fazer série real que captasse 'o caos iminente e as nossas desgraças'

Comédia de ficção que se passa no espaço estreou em janeiro na HBO

Comédia Avenue 5, protagonizada por Hugh Laurie Divulgação

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São Paulo

"Avenue 5" é parte da nova safra de séries que integra o catálogo da HBO em 2020. No ar desde o dia 19 de janeiro, a comédia de ficção critica a comercialização do espaço e traz no elenco nomes como Hugh Laurie e Josh Gad.

A ideia da narrativa veio da mente de Armando Iannucci, que explica que sua pretensão era criar "algo real", que captasse "o caos iminente e as nossas desgraças de alguma forma". Em entrevista realizada em Los Angeles, ele afirmou que quis sair de sua zona de conforto não fazendo outra comédia política. 

Nikki Amuka-Bird, que interpreta Rav Mulcair, já havia trabalhado com Ianucci, e diz que o criador da série "sabe muito bem tirar as pessoas da zona de conforto". Além disso, ela conta que seus momentos favoritos da produção são os mais "íntimos", em que Rav sente que precisa de ajuda e perde a pose.

"Já interpretei muitas mulheres fortes, mas no fundo todas as pessoas fortes são algo a mais. Há um episódio em que ela está deitada em posição fetal e racionaliza que se trata apenas de uma manifestação física do que as pessoas sentem quando estão sob pressão. Ela diz para si mesma o tempo todo que entende tudo. É engraçado ver pessoas que não admitem a verdade para si mesmas. Se ela fizesse isso, teria que largar tudo e sair correndo", conta a atriz.

Confira trechos da entrevista com Armando Iannucci e Nikki Amuka-Bird:

De onde veio a ideia de um cruzeiro turístico pelo espaço no futuro?
Armando:
Eu queria fazer uma história de ficção científica, mas que não fosse nem uma paródia nem uma sátira. Eu queria fazer uma coisa real. Eu gosto de ficção científica que parece realidade, em que os personagens vão para o futuro e se vê uma representação precisa de onde poderíamos estar, ou onde eles pegam uma coisa e aumentam, mas o resto fica igual. Além disso, em termos de criação, eu fiquei fascinado com movimentos de massa e a loucura das multidões, com as coisas mais loucas acontecendo na política e no plano internacional atualmente. Queria captar o caos iminente e as nossas desgraças de alguma forma. Sabia que isso envolveria muita gente, pessoas que não são exatamente o que dizem ser, mas também existe essa contracorrente de outras 5.000 pessoas que poderiam se manifestar a qualquer momento. Uma panela de pressão.

Qual é a relação entre esta série e seus trabalhos anteriores?
Armando: Quando eu termino um trabalho, a única coisa que eu quero é que o próximo seja diferente. Tenho certeza de que algumas pessoas esperavam que esta série fosse como “Veep”, mas eu tinha decidido que não seria. Fui insultado. “Veep” era sobre pessoas que só queriam viver cada dia, viver suas vidas, ou os três anos seguintes. “Veep” era sobre animar todo mundo. Esta série é sobre uns tentando acalmar os outros. É sobre o que acontece lá dentro. Parte do público terá visto “Veep”, mas eu espero que a série também atraia pessoas que não viram “Veep” porque não estavam interessadas em comédia política. Na essência estamos falando de comportamento humano. Comportamento humano em crise.

Nikki, por que você quis trabalhar com o Armando?
Nikki Amuka-Bird: Eu tinha trabalhado com ele em “The Personal History of David Copperfield”, conheço o trabalho dele há muito tempo. Mas, como eu nunca fiz comédia, não imaginei que ele pudesse me chamar. Eu lembro que ele perguntou ao meu empresário se eu podia ser engraçada. Eu analisei tudo que já tinha feito e, quando achei uma coisa engraçada, pedi para o meu empresário mandar na hora para ele. Eu não me vejo fazendo muitas coisas engraçadas, mas é ótimo trabalhar com o Armando e ele não ia exigir isso de mim. Ele pede que você se comprometa com a situação e veja o que descobre, você pode ser livre e espontânea. Eu já tinha feito muita ficção científica e parecia que existia uma determinada maneira de trabalhar, então foi realmente libertador.

O que você achou especialmente libertador em Avenue 5?
Nikki Amuka-Bird: Parece uma companhia de teatro. Entramos todos juntos em uma sala para ensaiar e trabalhar com as cenas. Havia pessoas de tipos diferentes, com trajetórias diferentes –de comédia de improviso ao drama puro. Íamos fazendo descobertas e o Armando sempre tinha um grupo de roteiristas presentes que iam fazendo ajustes. Eu nunca tinha tido essa experiência antes, em que o personagem vai se desenvolvendo com você, e você vai tendo apoio. É muito gratificante e você está sempre alerta porque precisa ser criativo.
Armando: Eu não sei por que não se faz mais esse tipo de coisa. Além de pagar para ter o elenco antes, basta ter uma sala. Os ensaios no set são de outra maneira e há 500 pessoas em volta, muitos equipamentos e todo mundo olhando para o relógio. Prefiro ensaiar em um salão de igreja ou em uma sala durante duas semanas. Tentamos fazer isso antes de cada episódio.

O que você pode falar sobre o seu personagem, Rav Mulcair?
Nikki Amuka-Bird: A Rav é a Chefe de Controle da Missão da Judd Space Enterprises. Eu a vejo como uma controladora que gosta de ter sempre razão e de estar pronta para qualquer eventualidade. Mas houve um acidente, a única coisa para a qual ela não estava pronta. Pressionada, ela não sabe lidar com a situação. É um estudo interessante do poder e do aspecto humano de ser alguém com autoridade.
Armando: Nunca se sabe como as pessoas vão reagir às crises. Até acontecer, eu não sei como reagiria em uma crise real. No fim da temporada, você vê que algumas pessoas que pareciam que iam se comportar de um jeito agiram de outro.

Quais são os momentos preferidos da Rav para vocês?
Nikki Amuka-Bird:  Para mim são os momentos íntimos, que mais ninguém pode ver, em que a Rav sente que precisa de ajuda e perde a pose. Já interpretei muitas mulheres fortes, mas no fundo todas as pessoas fortes são algo a mais. Há um episódio em que ela está deitada em posição fetal e racionaliza que se trata apenas de uma manifestação física do que as pessoas sentem quando estão sob pressão. Ela diz para si mesma o tempo todo que entende tudo. É engraçado ver pessoas que não admitem a verdade para si mesmas. Se ela fizesse isso, teria que largar tudo e sair correndo. À medida que a série evolui, tudo vai ficando mais absurdo porque ela foi a única que sobrou para responder às perguntas. Armando: Acabei de me lembrar de uma cena que terminamos cortando, por questões de tempo, em que a Rav vai para casa e nos primeiros dias não conta nada para a sua família, mas é claro que o que está acontecendo na nave acaba aparecendo nas notícias e eles ficam sabendo. É que ela não conseguia admitir que a nave estava com problemas.

Armando, como você criou esses personagens grandiosos e escolheu o elenco?
Armando:
Eu gosto de escolher o elenco bem no início. Quando já sabemos quem vai fazer cada papel, escrevemos para aquela pessoa. Prefiro assim a dizer que este personagem tem que ter isto ou aquilo. Haviam pessoas com as quais eu queria trabalhar de novo, como a Rebecca Front. Conversamos com cada um sobre seu personagem e o que tínhamos em mente. Eu me lembro, por exemplo, que o Zach Woods disse que não queria que o Matt fosse desagradável com todo mundo, queria que ele pensasse que estava ajudando as pessoas sendo sincero, embora em determinadas situações a sinceridade não ajude.

Por que o Hugh Laurie era perfeito para interpretar o capitão?
Armando: Nos Estados Unidos ele tem uma imagem autoritária e no Reino Unido nós o conhecemos como um fantástico ator de comédia, então juntamos tudo. O Hugh participou de tudo bem desde o início. Ele parece autoritário, mas no fundo é um inglês perplexo que se pergunta o que está fazendo, e isso lhe dá essa dimensão, essas duas facetas.

Qual foi a importância para os atores de serem retirados das suas zonas de conforto?
Armando: Todo mundo ou afunda ou nada um pouco. Eu também quis sair da minha zona de conforto não fazendo outra comédia política.
Nikki Amuka-Bird:  O Armando sabe muito bem tirar as pessoas da zona de conforto e levar para algo surpreendente, e você acaba descobrindo coisas sobre si mesmo. É ótimo para a criatividade não saber bem o que você vai fazer em seguida... E o Armando continua com a câmera ligada!
Armando: Quando há muita gente envolvida, eu nunca coloco as câmeras só nas pessoas que estão falando. Às vezes o mais engraçado é a cara de outra pessoa em função do que foi dito. Eu mantenho câmeras espalhadas para que os atores nunca saibam o que cada uma está fazendo. Com quatro câmeras em movimento eles nunca escapam de serem filmados!

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