Aos 73, Al Pacino volta ao cinema e à bandidagem em "Amigos Inseparáveis"
Azar no cinema, sorte na TV e no teatro. Este poderia ser o lema dos últimos dez anos de Al Pacino, que registrou no período mais baixos do que altos nas grandes telas, ao mesmo que tempo em que transbordavam elogios a suas performances em filmes e minisséries para a TV e em peças na Broadway.
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"O teatro expande seu universo, abre sua imaginação, expõe você a ótima literatura, permite pensar diferente. E daí se você cair de cara uma noite? Você vai voltar."
E afirma que adoraria ver jovens atores que admira encarando o palco, como Joaquin Phoenix, que adorou em "O Mestre". "Fazer filmes é difícil, ficar lá 14 horas por dia na mesma coisa. Ouvi dizer que [Leonardo] DiCaprio está se aposentando. Dá para entender o porquê."
Hoje Pacino retorna aos cinemas brasileiros com "Amigos Inseparáveis", no qual vive um criminoso metido com gângsteres --um universo familiar que já lhe rendeu muito nas mais de quatro décadas de carreira.
Ele vive um bandido saudosista e frágil, que deixa a prisão depois de 28 anos e se reúne com seus dois antigos comparsas, Hirsch (Alan Arkin) e Doc (Christopher Walken). Este último tem a tarefa ingrata de dar cabo do amigo, pressionado por um chefão em busca de vingança (Mark Margolis).
"Achei o roteiro original, esses caras são incomuns e interessantes. Também queria muito trabalhar com Chris Walken, de quem gosto muito. E filmamos em Los Angeles, onde eu podia ficar perto de meus filhos pequenos", conta o pai do casal de gêmeos Anton James e Olivia Rose, nascidos em 2001, da relação que teve com a atriz Beverly D'Angelo até 2003.
Se no filme Pacino surge de cabelo pintado de preto e roupas antiquadas, andando meio curvado como um tiozinho tarado, ao vivo ele não poderia ser mais diferente.
GAROTÃO
Prestes a completar 73 anos, o nova-iorquino parece um garotão pessoalmente. Grisalho, mas despenteado, veste jaqueta de couro por cima de um moletom preto de capuz, com o zíper aberto até o meio do peito, deixando mostrar uma corrente de prata e parte de uma tatuagem do lado esquerdo.
"Tudo é para o cinema", ele fala enigmático sobre o desenho tribal, sem confirmar se é de verdade. "Não sei para qual filme ainda. Sou apenas um cara tatuado à procura de um filme."
Não que ele precise ir atrás, embora diga que passe seu tempo livre lendo roteiros e sinopses para decidir qual será seu próximo trabalho. Sua agenda anda cheia e bem diversificada. Ele acaba de fazer a voz do vilão do desenho "Meu Malvado Favorito 2", que estreia no Brasil em julho.
E, em dezembro, voltou à Broadway para uma temporada da peça premiada "Glengarry Glen Ross", do dramaturgo David Mamet.
Ele já havia feito parte do elenco do filme baseado na peça, de 1992, com Jack Lemmon, Alec Baldwin e Kevin Spacey, lançado no Brasil como "O Sucesso a Qualquer Preço". Na peça, entretanto, Pacino mudou de papel e interpretou o personagem que era de Jack Lemmon no filme.
Na Broadway, ele havia sido indicado ao Tony, em 2010, por "O Mercador de Veneza", de William Shakespeare, seu autor predileto, que ele cita três vezes em meia hora de entrevista. Seu próximo trabalho no cinema será em outra adaptação do inglês --"Rei Lear", de Michael Radford, que o dirigiu no filme "O Mercador de Veneza" (2004).
"O convite para fazer 'Rei Lear' me fez pensar na minha idade. Eu respondi: 'Como é que é? Espere aí, deixa eu checar no espelho'", diz, rindo. Na peça de Shakespeare, o idoso rei Lear é traído por suas filhas e enlouquece.
PRÊMIOS
Apesar da volta às origens em "Amigos Inseparáveis", o filme foi mal nas bilheterias e não empolgou a crítica nos EUA. Mas não foi tão desastroso como suas participações em "Cada um Tem a Gêmea que Merece" (2011) --em que fez par romântico com o personagem feminino de Adam Sandler-- e "Contato de Risco" (2003) --uma das maiores bombas de sua carreira.
Ambos os papéis lhe renderam indicações ao Framboesa de Ouro. Pacino foi indicado cinco vezes a esse prêmio de piores do ano, quatro delas na última década.
Quanto ao Oscar, foi indicado oito vezes, metade dessas por atuações dos anos 70, quando despontou como o mafioso Michael Corleone na trilogia "O Poderoso Chefão" (1972-1974-1990) e o assaltante a banco Sonny Wortzik em "Um Dia de Cão" (1975).
A última indicação foi há 20 anos, quando finalmente ganhou a estatueta dourada pelo papel do coronel cego de "Perfume de Mulher"(1992).
"Fiquei um pouco mais sofisticado. Quando era jovem, não entendia o que era imagem, não pensava em carreira. Achava que Corleone era uma imagem, mas não a minha, era apenas uma pintura que eu havia feito", conta. "Hoje as carreiras são muito mais calculadas."
TELEVISÃO
Na verdade, Pacino tem feito melhores escolhas fora do cinema, como no elogiadíssimo telefilme do canal pago HBO "You Don't Know Jack" (2010), sobre o médico americano defensor da eutanásia Jack Kevorkian (1928-2011), que lhe valeu seu segundo Emmy e seu segundo Globo de Ouro (o primeiro foi pela minissérie "Angels in America", de 2003).
No fim de março, ele retorna à TV paga dos EUA no telefilme "Phil Spector", dirigido por David Mamet. Spector, 73, é um produtor musical americano, responsável pelo álbum "Let It Be" (1970), dos Beatles, e famoso por usar perucas com penteados e cores sempre ousados e diferentes.
Em 2008, ele foi preso, acusado pelo assassinato da atriz Lana Clarkson (1962-2003), que morreu com um tiro, na casa do produtor. Cumpre pena de 19 anos. O filme vai contar o relacionamento do então acusado com sua advogada (Helen Mirren) durante o julgamento.
"Vai ser polêmico", avisa Pacino, que não visitou o produtor na cadeia. "Quando esses grandes autores, como Mamet, escrevem esses textos, usam os personagens como trampolins para sua própria expressão. São metáforas. Não é algo literal."
Mesmo com uma trajetória recente desequilibrada, Pacino comenta que se diverte muito mais hoje em dia. "É mais interessante porque eu tenho aprendido muito. Há mais variedade na minha vida agora que estou mais velho. Tenho mais clareza e percepções que não tinha antigamente", diz.
Trabalhar só pelo dinheiro, por exemplo, é coisa que não faz mais. "Hoje faço o que acho certo e, se for um fracasso, tudo bem."
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