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O insolucionável mistério da física: por que os gatos caem sempre de pé?

Esse é um quebra-cabeças que deveria ser fácil de resolver, mas tem tomado muito tempo dos físicos

Grupo de gatos no parque da Aclimação, em São Paulo
Grupo de gatos no parque da Aclimação, em São Paulo - Lucas Seixas/UOL/Folhapress
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Gregory J. Gbur

​​Como os gatos conseguem cair sempre em pé? Esse é um quebra-cabeças que deveria ser fácil de resolver, mas tem tomado muito tempo dos físicos e ainda precisa ser extensivamente estudado.

As tentativas de dar uma explicação científica a essa habilidade, comumente conhecida como reflexo de endireitamento de um gato, são quase tão antigas quanto o próprio estudo da física.

O primeiro a publicar uma pesquisa sobre o assunto foi o cientista francês Antoine Parent no ano de 1700. Para contextualizar, Isaac Newton ainda estava vivo na época e o grande trabalho dele, "Princípios Matemáticos da Filosofia Natural", tinha sido publicado havia apenas 13 anos.

O interesse fi nal de Parent não era apenas entender a queda dos felinos, mas também pesquisar como objetos grandes e pesados ​​se movem e giram e, ao mesmo tempo, caem em uma posição de equilíbrio.

Quase como uma reflexão tardia, Parent sugeriu que, assim como um objeto pesado poderia tombar com o lado pesado para baixo na água devido ao choque de gravidade e a uma força flutuante para cima, um gato em queda livre poderia ajustar sua coluna para virar-se, movendo seu centro de gravidade sobre o centro de flutuabilidade.

Essa ideia está errada, uma vez que a flutuabilidade do ar é muito fraca para afetar um gato durante a queda.

Mesmo assim, essa explicação, e outras derivadas dela, permaneceram comuns em livros populares sobre gatos durante a metade do século 19.

A comunidade física, no entanto, já havia encontrado outras explicações. No início do século 19, havia um crescente reconhecimento de que certas propriedades fundamentais da natureza são preservadas em qualquer processo físico.

Muitas pessoas estão familiarizadas com o conceito de conservação de energia, a ideia de que a energia não é criada nem destruída, mas transformada.

Por exemplo, quando um carro se move, isso ocorre por conta da conversão da energia química do combustível no movimento mecânico das rodas. Quando o carro para devido à ação dos freios, o movimento se transforma em energia térmica devido ao atrito.

Está provado que esse fato é preservado em qualquer processo físico. Para um único objeto em movimento, o impulso é o produto da massa vezes a velocidade, e os objetos mais pesados ​​e mais rápidos têm mais impulso do que os leves e lentos.

Outra lei de conservação foi reconhecida em meados do século 19: o princípio de conservação do movimento angular. Uma consequência imediata dessa lei é a observação de que não é possível que um objeto comece a girar sem que outro objeto gire na direção oposta, com a mesma magnitude cinética.

Isso é muito fácil de perceber. Se você se senta em uma cadeira com rodas de escritório e vira o corpo para a esquerda, a cadeira gira para a direita.

Uma vez que a lei da conservação de energia foi reconhecida, os físicos logo determinaram que um gato simplesmente não poderia girar sobre si mesmo em queda livre assim que começa a cair.

O consenso foi de que um gato, no momento em que começa a cair, deve ser empurrado para fora de sua cavidade para criar uma rotação inicial que o faz aterrissar em pé.

Mas essa explicação foi derrubada no dia 22 de outubro de 1894, na Academia Francesa de Ciências, pelo fisiologista Etienne-Jules Marey. Ele apresentou uma sequência inédita de fotografias de um gato caindo, tiradas em alta velocidade, mostrando claramente que o gato começa a cair de cabeça para baixo, sem qualquer rotação, mas ainda assim consegue se virar e cair de pé.

A revelação das fotografias levou caos à sala. Um membro da Academia declarou que Marey "havia lhes apresentado um paradoxo científico em contradição direta com os princípios mecânicos mais elementares".

Onde os cientistas tinham errado? Eles sucumbiram ao ditado de que "um pouco de conhecimento é algo perigoso". Os físicos, tendo reconhecido recentemente a conservação do momento angular, concentraram sua atenção no estudo de corpos rígidos rotativos, como uma roda de bicicleta ou um planeta que gira.

Mas um gato, como muitos de seus parentes, está longe de ser um corpo rígido. Os gatos podem se dobrar, girar e geralmente mover várias partes de seu corpo para obter uma rotação completa, sem nenhum movimento angular.

Então, como fazem para cair de pé?

Para ser justo, os físicos rapidamente reconheceram seu erro e propuseram vários mecanismos pelos quais um gato pode se endireitar usando várias manipulações de partes seu corpo.

O mais importante desses mecanismos foi mostrado pelos fisiologistas holandeses G.G.J. Rademaker e J.W. Ter Braak alguns anos depois, em 1935.

Na época, a questão do endireitamento de um gato havia sido chegado a pesquisadores do cérebro. Eles queriam entender quais partes do sistema nervoso do gato controlavam esse reflexo.

Rademaker e Ter Braak ajudaram a responder a essas perguntas, mas, durante o processo, consideraram as explicações físicas insatisfatórias e decidiram construir suas próprias.

Eles imaginaram o gato como se fossem dois cilindros. Se o gato se dobrar pela cintura, ele pode torcer as duas metades do corpo em direções opostas, fazendo com que seus angulares opostos se cancelem em grande parte.

Quando se dobra, seu corpo é orientado em uma direção diferente, embora o gato não tenha um momento angular fixo quando começa a cair.

Esse movimento, agora conhecido como modelo "dobrar e girar" para endireitar um gato, é possivelmente a manobra mais importante que esse felino realiza durante o endireitamento.

Mas a pesquisa sobre a física por trás desse fenômeno não terminou aqui. Rademaker e Ter Braak apresentaram apenas o modelo mais simples de um gato em rotação. Eles capturaram a essência do movimento, mas não todos os detalhes.

O que podemos aprender com os gatos em queda?

No final dos anos 1960, o mistério voltou a gerar interesse porque a Nasa (agência espacial americana) queria ensinar seus astronautas a girar em ambientes flutuantes.

Desta vez, o desafio foi assumido pelos engenheiros da Universidade Stanford, que usavam simulações em computador para redefinir o modelo dos fisiologistas. No entanto, não está claro se alguma vez os astronautas tentaram executar o movimento "dobrar e girar" no espaço.

Hoje, as pesquisas sobre o movimento dos gatos continua em outro campo de estudo: a robótica.

Os engenheiros têm sido frequentemente inspirados pela natureza para projetar robôs melhores. E os gatos fornecem uma estratégia para fazer com que o robô caia de pé — minimizando os danos físicos provocados pela queda.

Vários protótipos de gatos robóticos foram criados, mas nenhum deles conseguiu adaptar sua queda para chegar ao chão em pé, independentemente de sua posição inicial.

Então, como o gato faz isso? Parece que a resposta é bastante complicada.

Embora o "dobrar e girar" seja a manobra mais importante, o gato usa claramente diferentes movimentos para girar da maneira mais rápida e eficiente.

Embora os físicos muitas vezes busquem a solução mais simples para um problema, a natureza busca o mais eficaz, independentemente de quão complicado seja.

O instinto dos físicos de procurar soluções simples ainda leva a discrepâncias.

Em resposta a um artigo científico recente que apresentei sobre a matemática do reflexo dos gatos durante sua queda, um crítico argumentou que o modelo "dobrar e girar" deve estar errado, porque ele viu um vídeo no YouTube de um gato caindo e o animal não parecia se mover dessa forma.

Os gatos são conhecidos por serem os guardiões dos segredos, e seu reflexo no endireitamento continua sendo um mistério para muitos cientistas até hoje.

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